É perceptível que a violência acompanha de forma intrínseca à evolução da sociedade, inclusive é verificável que a mesma faz parte do cotidiano, fazendo-se presente desde os tempos primórdios no contexto- social, estando por tanto, implantada na civilização, constituindo raízes na cultura, o que representa uma forte ameaça à humanidade. Neste contexto, daremos enfoque á violência familiar contra a criança e o adolescente, que segundo ao Art. 1° do ECA, se refere as pessoas menores de 18 anos e conforme Azevedo e Guerra[10], a violência doméstica se compreende como:
“É
todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra criança
e/ou adolescente que, sendo capaz de causar à vítima dor ou dano de natureza
física, sexual e/ou psicológica, implica de um lado, uma transgressão do poder/dever
de proteção do adulto. De outro lado, leva a coisificação da infância, isto é,
a uma negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como
sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento.”
Neste ponto, coloca-se em destaque a
diferenciação de abuso sexual intra e
extrafamiliar, sendo que o primeiro se trata de abuso sexual efetuado por
pessoas com vinculo de parentesco, ou responsabilidade sobre o vulnerável,
constituindo este no mais comum, representando 80% dos casos, e o segundo se
denota com o abuso sexual por pessoas sem vinculo afetivo ou de parentesco com
a vítima, normalmente estando relacionado com a exploração sexual comercial,
inclusive existem afirmações que equiparam estes dois sentidos, segundo
ABRAPIA,[11]. Este fenômeno bastante abstruso e multifacetado alcança todos os
níveis sociais ou socioeducativos, visto que aborda diversas formas, supracitadas,
sendo que dentre estas formas tendo especial relevância e gravidade, se destaca
o crime de violência sexual, que na concepção das autoras Azevedo e Guerra[12],
caracterizada por:
“[...]
todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou homossexual entre um ou mais adultos
com uma criança ou adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta
criança ou adolescente ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre
sua pessoa ou outra”.
Ou então em acordo com Guerra[13], é o envolvimento
das crianças e adolescentes em atividades sexuais, para as quais seu
desenvolvimento mental é incompleto ou reduzido, de forma que seja incapaz de
discernir sobre o consentimento e a respeito do sentido de tal atitude, ou que
violam as regras sociais e familiares, incluem-se neste rol o incesto, que é o
contato sexual entre parentes consanguíneos ou afins, a pedofilia e os abusos
sexuais violentos. Neste sentido, é verificável que o abuso sexual infantojuvenil intrafamiliar possui grandes proporções
de gravidade e risco social, visto que devido à durabilidade e a habitualidade
que costuma haver nesta pratica delituosa, causa danos não somente físicos como
também psicológicos, muitas vezes irreversíveis na vítima, indo de encontro à
Carta Magna que em seu Art. 5°, traz garantias aos direitos fundamentais, sendo
então o mesmo, devido ao seu relevante valor social, tipificado penalmente como
estupro de vulnerável, estando expresso no Art. 217-A do CP.
Na questão da tipificação legal deste delito, no
Brasil a primeira legislação a prever a presunção de violência foi o Código de
1890, no artigo 272, presumindo violência quando o ato sexual fosse praticado
contra menor de 16 anos [14]. No entendimento do mesmo autor, o Código de 1940,
manteve a redação anterior, porem reduziu a faixa etária para 14 anos, no art.
224, ainda acrescentou a hipótese em que a vitima tem por qualquer motivo
dificuldade de oferecer resistência, ou ainda sendo alienada ou débil mental.
Com o advento da Lei 12.015/2009, como mencionado, revoga-se todo o texto
anterior, definindo o crime como “estupro de vulnerável”, art. 217-A do CP.
Umas das principais preocupações do legislador com o advento desta lei foi à
proteção dos menores de 18 anos, contra os crimes sexuais[15], “e a
proliferação da prostituição infantil e de diversas outras formas de exploração
sexual. A repressão á exploração sexual do menor tem sido objeto de diversos
tradados e convenções internacionais, tanto em razão da relevância do bem
jurídico, como também em face da dimensão internacional que vem assumindo o
trafico de menores com fins sexuais”.
Nesta
lógica, verifica-se o confronto deste crime com os direitos humanos universais,
pois nota-se que este delito ultrapassa qualquer limite ou regra seja ela,
social, cultural, legal ou familiar, ferindo gravemente a moral e os bons
costumes de forma perversa, pois sobrepõe-se aos princípios orientadores
familiar, de forma condenável e degradante. As consequências deste crime são
diversas dependendo de cada vulnerável, porem podem ocorrer, de acordo com Mari
Lucrécia Zavaschi e Marceline Gabel[16], manifestações negativas tal como
distúrbio de personalidade, automutilação, tentativa de suicídio, depressão,
isolamento, pesadelos, medos, angustias, introdução de objetos nos órgãos
sexuais, masturbação excessiva, “conhecimentos de sexualidade inadaptada para
sua idade, comportamento de sedução”, dentre outros. Pode incidir que no
decorrer da violência aconteçam ferimentos na criança, tornando identificável o
crime, porem nem sempre isso é possível, tornando-se a palavra da criança de
fundamental valia.
Ainda citado pelo referido artigo, Carla Faiman[17],
afirma que a preferência dos agressores por crianças se deve a fragilidade na
obtenção de resistência por parte das vitimas e da vulnerabilidade em serem
iludidas e intimidadas, em conjunto com fatores como o respeito
culturalmente
inserido em relação a autoridade do adulto tornam a relação mais duradoura por
falta de capacidade de reação dos menores. Em semelhança as circunstancias das crianças
abusadas, a autora destaca a família como principal ponto de partida, visto que
a falta de atenção dispersada na criança, a falta de carinho, de amor, tornam-na
carente e vulneravel as investidas. Em conformidade [18], o geneticista Renato
Zamora Flores, em entrevista para o artigo “Inocência Violada” relata:
“[…] a frequência
das relações incestuosas entre a maioria das espécies de aves e mamíferos e da
genética do comportamento é de apenas 1% a 2% e a estimativa para o homem é de
20%. Em algumas famílias de bichos, as fêmeas deixam de ovular quando só há
parentes disponíveis para a procriação, movidas pelo instinto de que sexo entre
iguais enfraquece a espécie e reduz as chances de sobrevivência. O incesto é
essencialmente humano e isso é o que parece assustar as pessoas.”