NOTAS INTRODUTÓRIAS
O presente trabalho trata acerca da possibilidade de restrições
aos direitos fundamentais em um Estado Democrático de Direito, primeiramente,
se efetuara uma diferenciação entre direitos e garantias, assim como, uma ampla
abordagem sobre a transmutação que os direitos fundamentais sofreram, passando
de simples recomendações éticas, para concretas normas constitucionais.
Por consequência, destacara-se também, a soberania dos direitos
fundamentais na Carta Maior, devido ao seu grau de abrangência e proteção aos cidadãos,
inclusive, passando pela diferenciação de tais normas, em relação as demais
garantias abordadas pelo constituinte. À vista disso, o texto trata ainda, a
respeito da jurisdição constitucional no sistema brasileiro, que garante a
jurisdição normativa da Constituição, a qual conclui, em assegurar o exercício
regular das funções estatais, através de, um órgão imparcial e independente.
Em concordância com a soberania dos direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988, a própria positiva a inconstitucionalidade e não
recepção de normas contrárias aos direitos fundamentais, como salienta
Marmelstein (2013), “a supremacia formal e material dos direitos fundamentais
acarreta a não recepção da legislação promulgada em data anterior à
Constituição que seja incompatível com os direitos fundamentais.”
Para tanto, a mesma traz em
seu núcleo formas de controle e de providências, tais como a ADPF, a ADI,
dentre outras formas, exercidas por meio do controle de constitucionalidade, os
quais se expressam de forma concentrada ou difusa, assim, no Brasil, conforme previsibilidade
da Carta Magna, as duas possibilidades de controle, é compatíveis e existentes.
Posteriormente a isso, serão abordadas, objetivamente, as
possibilidades de restrições ou limitações dos direitos fundamentais, as quais
se explanam por meio da teoria interna e a teoria externa, que serão amplamente
definidas. Bem como, as alternativas de restrições, as garantias que podem ser
restritas, como também, as limitações e legalidades para tal feito. Isto posto,
serão apresentadas jurisprudências do STF, acerca da respectiva prática.
Por sua vez, o método utilizado será o indutivo, como obtenção do
resultado geral, que culmina em, abordar a soberania dos direitos fundamentais
na ordem jurídica, utilizara-se também, o auxilio de pesquisas bibliográficas,
bem como de jurisprudências do STF, como meio de obtenção do objetivo
específico, que finda em averiguar as possibilidades de restrições de direitos,
na Constituição nacional. Consequentemente, apresentado o intróito, passar-se-á
para o texto em específico, o qual se segue através, do próximo item.
1. A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL NO BRASIL
Primeiramente será estabelecida a
diferenciação entre direitos e garantias, cujas quais de acordo com Pinho
(2011), “no ordenamento jurídico, pode ser feita uma distinção entre as normas
declaratórias, que estabelecem direitos, e as normas assecuratórias, isto é, as
garantias, que asseguram o exercício desses direitos”.
Neste sentido, na direção de Marmelstein
(2013), “de simples recomendações éticas, eles (os direitos fundamentais), se
tornaram verdadeiras normas constitucionais irrevogáveis e vinculantes, de
observância obrigatória, com aplicação direta e eficácia imediata, capazes de
se irradiar, por todos os ramos do direito.”
Nesta direção, Vasconcelos (1993)
enfatiza que, um sistema hierárquico de normas, seria composto por normas de
variados graus valorativos, formando então, um conjunto em harmonia, em
concordância, com Kelsen (2007), no que concerne, a teoria da pirâmide
normativa de normas, na direção de que, para um norma ter validade, a mesma
necessita “buscar fundamento de validade em uma norma superior, e assim por
diante, de tal forma que, todas as normas cuja validade, pode ser reconduzida a
uma mesma norma fundamental, formam um sistema de normas, uma ordem normativa.”
Consequentemente destaca Marmelstein
(obra citada), que a Constituição ocupa o patamar mais alto desta pirâmide, desta
forma, a própria, encontra-se no topo do ordenamento jurídico, de maneira que,
para uma norma ter validade, a mesma precisa estar em concordância com a
Constituição, devido ao fato de que tal, ocupa a Ordem Maior. Em continuação a
disposição do mencionado autor, o mesmo destaca:
O mesmo se pode dizer dos direitos fundamentais, já que também
possuem a natureza de norma constitucional. Eles correspondem aos valores mais
básicos e mais importantes, escolhidos pelo povo (poder constituinte), que
seriam dignos de uma proteção normativa privilegiada. Eles são fundamentais,
porque são tão necessários para a garantia da dignidade dos deres humanos, que
são inegociáveis no jogo político. Daí porque, esta concepção, pressupõe um
constitucionalismo rígido, no qual, a Constituição goza de uma supremacia
formal, sobre as demais normas jurídicas e, por isso, os mecanismos de mudança
do texto constitucional, impõe um processo legislativo mais complicado em relação
às demais leis.
Assim sendo, pode-se afirmar, que este seria o diferencial dos direitos
fundamentais em relação às demais normas jurídicas, por consequência de seus
privilégios, advindos da supremacia formal e material em proteção das
prerrogativas do legislador ordinário, ou seja, os mesmos encontram-se em
patamar superior ao das leis, pois que, constituem a base nuclear ética de todo
o sistema normativo.
Este reconhecimento de sua proeminência, Malmelstein (obra
citada), destaca três consequências relevantes, sendo elas, a
inconstitucionalidade de normas incompatíveis com as garantias destacadas,
consequentemente, a não receptividade de normas anteriores a promulgação da
Constituição de 1988, que estejam em discordância com os direitos fundamentais,
bem como, impõe a necessidade de reinterpretar as leis, aos parâmetros
axiológicos estabelecidos pela Constituição.
Dessa maneira, para Kelsen (obra citada), a jurisdição
constitucional, expressa “a garantia jurisdicional da Constituição”, que finda,
em assegurar o exercício regular das funções estatais, através de, um órgão
imparcial e independente, como complementa Marmelstein (obra citada),
salientando, tais doutrinadores, que tal medida de garantia, não deve ser
incumbida ao legislador, tampouco, ao governante, pois que, nos casos de
transgressão da Constituição, ambos podem estar presentes como partes
litigantes, além disso, conforme a explanação de Marmelstein (obra citada):
A constatação de que os parlamentares e os governantes, por
estarem mais vulneráveis a pressões políticas dos mais variados tipos,
inclusive financeiras, já que precisam de verbas para financiar suas
dispendiosas campanhas eleitorais, não estariam em uma posição de
imparcialidade para proteger os interesses dos grupos com pouca representação
eleitoral, ainda que, os interesses desses grupos fossem garantidos pela Constituição.
Logo, nem os membros do Executivo, nem os do Legislativo, possuiriam
legitimidade para realizar o controle da constitucionalidade dos atos públicos,
pois eles, sempre tenderão a escolher a opção política que gere mais votos, o
que nem sempre resultará em escolhas justas e compatíveis com a dignidade
humana.
No Brasil, a jurisdição constitucional surgiu com a criação da
Justiça Federal, em consequência da crise da monarquia, onde, o país sofreu um
golpe estado, proclamando-se republica, sob a égide de Marechal Deodoro da
Fonseca. Dessarte, devido a troca de regime político, uma nova Constituição
deveria ser escrita, tarefa à qual, recaiu para Rui Barbosa, que se baseou no
modelo norte-americano, para a criação da Constituição de 1891.
Acerca do qual, Gilmar Mendes (2010), destaca, “o regime
republicano inaugura uma nova concepção. A influência do direito
norte-americano sobre personalidades marcantes, como a de Rui Barbosa parece
ter sido decisiva para a consolidação do modelo difuso, consagrado já, na
chamada Constituição provisória de 1890 (art. 58, §1°, a e b).”
Deste modo, Rui Barbosa (1997), estabeleceu o controle de
constitucionalidade, com características concretas e exercidas por meio dos
juízes federais de forma difusa, o qual, na explanação de Marmelstein (obra
citada), possui a tarefa de efetuar a conferencia da “compatibilidade dos atos
infraconstitucionais com a Constituição, invalidando os que forem
incompatíveis,” destarte nas palavras de Barbosa (obra citada), acerca da
implementação de poder á justiça, o diferencial, “não foi a atribuição de
verificar a constitucionalidade nos atos do Poder Executivo: foi a de
pronunciar a inconstitucionalidade nos atos do Congresso Nacional”.
Neste marco histórico, passou a ser oficialmente instituída a
premissa de que, não existem poderes (mesmo que executivo ou legislativo), a
não ser os que estejam expressos dentro das normas constitucionais, visto que,
a mesma possui caráter predominante, estando, para tanto, acima de todo o
restante do ordenamento jurídico.
Efetuada, esta ampla assertiva histórica, sobre a jurisdição
constitucional brasileira, poder-se-á, passar a abordar a questão da
inconstitucionalidade e da não recepção das normas contrárias aos direitos
fundamentais, com maior especificidade, em virtude de sua importância para a
harmonia do sistema jurídico, as quais serão tratadas com particularidade, nos
próximo item.
2. A INCONSTITUCIONALIDADE E A NÃO RECEPÇÃO DAS NORMAS CONTRÁRIAS AOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988
Conforme foi abordado, os direitos fundamentais são positivados na
Constituição, dessa forma, qualquer norma que se mostre incompatível com tais
garantias serão declaradas inconstitucionais, esta fiscalização das normas será
efetuada por meio da jurisdição constitucional, através da ADI, posto que, são
estes direitos, que, conforme a explanação de Marmelstein (obra citada),
“fornecem o substrato ético e a legitimidade material do controle de
constitucionalidade”.
Porém, para as normas que entraram em vigor antes da Constituição
Federal, em virtude do controle concentrado de constitucionalidade, o órgão
incumbido pela fiscalização é o Supremo Tribunal Federal, por meio da ADPF, com
referência no art. 1º, parágrafo único, inc. I, da Lei nº 9.882/98. No entanto,
no que concerne ao modelo difuso de constitucionalidade, o juiz, em confronto
com uma lei não recepcionada, fica encarregado de não aplicá-la, em
consequência, assegura Marmelstein (obra citada anteriormente).
A supremacia formal e material dos direitos fundamentais acarreta
a não recepção da legislação promulgada em data anterior à Constituição que
seja incompatível com os direitos fundamentais. Se um juiz deparar com uma
norma anterior a Constituição que seja incompatível com esses direitos, deverá
entende-la como revogada. Diz-se numa linguagem mais técnica, que essa norma não foi recepcionada, ou seja,
não foi recebida pelo novo ordenamento constitucional. Essa não recepção tem o
mesmo efeito prático da revogação, de modo que, o juiz não pode aplicar a norma
não recepcionada.
O Brasil adota o sistema misto de constitucionalidades, ou seja o
difuso e o concentrado, o qual reportar-se-á de forma especifica no item a
seguir. O modelo concentrado de constitucionalidade refere-se, ao controle de
constitucionalidade de norma pré-constitucional, por meio da Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental, expresso no art. 102, par. 1º da CF,
regulamentada através da lei nº 9.882/99, no art. 1º, parágrafo único, inc. I,
in verbis:
Art. 1º A arguição
prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o
Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito
fundamental, resultante de ato do Poder Público.
Parágrafo único. Caberá também arguição de descumprimento de
preceito fundamental: I - quando for relevante o fundamento da controvérsia
constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal,
incluídos os anteriores à Constituição;
No mesmo sentido, apresentar-se-á, jurisprudência pacífica do STF,
em decisão acerca do tema:
(...) A Ação Direta de Inconstitucionalidade não se revela
instrumento juridicamente idôneo ao exame da legitimidade constitucional de
atos normativos do poder público que tenham sido editados em momento anterior
ao da vigência da Constituição sob cuja égide foi instaurado o controle normativo
abstrato.
Assim, toda vez que configurar controvérsia relevante sobre a
legitimidade do direito federal, estadual ou municipal, anteriores à
Constituição, em face de preceito fundamental da Constituição, poderá qualquer
dos legitimados, para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade,
propor arguição de descumprimento. Também essa solução vem colmatar lacuna
importante no sistema constitucional brasileiro, permitindo que controvérsias
relevantes afetas ao direito pré-constitucional sejam solvidas pelo STF com
eficácia geral e efeito vinculante. (STF, ADI 7/DF, rel.
Min. Celso de Mello, J. 4/9/1992).
Como exemplo da primazia dos direitos fundamentais para a ordem
jurídica, cita-se a ADI: 4425 DF, Relator: Min. AYRES BRITTO, que envolvia um
conflito entre “o regime especial de pagamento de precatórios para Estados e
Municípios criado pela EC nº 62/09”, e direitos fundamentais como a Separação
de Poderes e o postulado de isonomia, nesse sentido:
“3. A expressão “na
data de expedição do precatório”, contida no art. 100, § 2º, da CF, com redação
dada pela EC nº 62/09, enquanto baliza temporal para a aplicação da preferência
no pagamento de idosos, ultraja a isonomia (CF, art. 5º, caput) entre os
cidadãos credores da Fazenda Pública, na medida em que discrimina, sem qualquer
fundamento, aqueles que venham a alcançar a idade de sessenta anos não na data
da expedição do precatório, mas sim posteriormente, enquanto pendente este e
ainda não ocorrido o pagamento.
4. O regime de
compensação dos débitos da Fazenda Pública inscritos em precatórios, previsto
nos §§ 9º e 10 do art. 100 da Constituição Federal, incluídos pela EC nº 62/09,
embaraça a efetividade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), desrespeita a coisa
julgada material (CF, art. 5º, XXXVI), vulnera a Separação dos Poderes (CF,
art. 2º) e ofende a isonomia entre o Poder Público e o particular (CF, art. 5º,
caput), cânone essencial do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, caput).
5. A atualização
monetária dos débitos fazendários inscritos em precatórios segundo o índice
oficial de remuneração da caderneta de poupança viola o direito fundamental de
propriedade (CF, art. 5º, XXII) (...).
6. A quantificação
dos juros moratórios relativos a débitos fazendários inscritos em precatórios
segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança vulnera o princípio
constitucional da isonomia (CF, art. 5º, caput) ao incidir sobre débitos
estatais de natureza tributária, pela discriminação em detrimento da parte
processual privada que, salvo expressa determinação em contrário, responde
pelos juros da mora tributária à taxa de 1% ao mês em favor do Estado (ex vi do
art. 161, § 1º, CTN). Declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução
da expressão “independentemente de sua natureza”, contida no art. 100, § 12, da
CF, incluído pela EC nº 62/09, para determinar que, quanto aos precatórios de
natureza tributária, sejam aplicados os mesmos juros de mora incidentes sobre
todo e qualquer crédito tributário. 7. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com
redação dada pela Lei nº 11.960/09, ao reproduzir as regras da EC nº 62/09
quanto à atualização monetária e à fixação de juros moratórios de créditos
inscritos em precatórios incorre nos mesmos vícios de juridicidade que inquinam
o art. 100, § 12, da CF, razão pela qual se revela inconstitucional por
arrastamento, na mesma extensão dos itens 5 e 6 supra.
8. O regime especial
de pagamento de precatórios para Estados e Municípios criado pela EC nº 62/09,
ao veicular nova moratória na quitação dos débitos judiciais da Fazenda Pública
e ao impor o contingenciamento de recursos para esse fim, viola a cláusula
constitucional do Estado de Direito (CF, art. 1º, caput), o princípio da
Separação de Poderes (CF, art. 2º), o postulado da isonomia (CF, art. 5º), a
garantia do acesso à justiça e a efetividade da tutela jurisdicional (CF, art.
5º, XXXV), o direito adquirido e à coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI). 9.
Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente em parte. (STF
- ADI: 4425 DF, Relator: Min. AYRES BRITTO, Data de Julgamento: 14/03/2013,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-251 DIVULG 18-12-2013 PUBLIC
19-12-2013).
Dessarte, a respeito da não receptividade de normas contrárias aos
direitos fundamentais, utilizar-se-á o exemplo de Marmelstein (obra citada),
referentes aos arts. 51 e 52 da Lei de Imprensa, que expressa o dano moral
tarifado, cujos quais, taxam limites rígidos à fixação da indenização por dano
moral, no que concerne à responsabilidade civil de jornalistas e empresas da
área de comunicação, cujos quais, eram acolhidos, anteriormente a Constituição
de 1988, no entanto, com o advento da mesma, instituiu-se o art. 5º da CF, para
o qual, “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou a imagem”, neste sentido, a atual
Constituição não estabeleceu limites ao dano moral, por tanto não recepcionando
tais artigos.
Em virtude, como consequência da proeminência dos direitos
fundamentais, todas as leis editadas anteriormente a vigência da atual
Constituição, deverão passar por um processo de interpretação, como forma de
adaptá-la ao sentido axiológico que os direitos fundamentais estabelecem como
salienta Barroso (1998), no sentido de que, apenas prevalecem as leis, quando
concordantes com as normas e princípios estabelecidos na Constituição atual.
Nesta acepção, qualquer ato que esteja em incompatibilidade com os
direitos fundamentais poderá ser declarados inconstitucionais, e por tanto, serem
anulados, por meio do órgão incumbido pela jurisdição constitucional, e sendo
anteriores a Constituição os mesmos não serão recepcionados pela jurisdição,
como dito. Por tanto, toda a legislação deve ser interpretada em favor da
Constituição, de forma que se apresente adequada a realidade imposta
democraticamente. Isto esclarecido abordar-se-á o controle as peculiaridades do
sistema misto de constitucionalidade, expressos no item a seguir.
3. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE: CONTROLE CONCENTRADO E CONTROLE
DIFUSO
Para Ferreira Filho (2012), “a distinção entre Constituição rígida
e Constituição flexível, entre Poder Constituinte originário e Poder
Constituinte derivado, implica a existência de um controle de
constitucionalidade”. Devido ao
fato de que, onde não há previsão deste controle, não se faz possível a
existência de uma rigidez constitucional ou mesmo diferenciação entre Poder
Constituinte derivado ou originário, verificável no fato de que, em todo o
Estado onde não exista controle de constitucionalidade, a Constituição, por
mais que almeje ser rígida, será flexível, isso não significa que esta forma de
controle deva estar expressa em seu conteúdo, basta, porém que de seu sistema,
possa-se extrair tal modelo.
Deste modo, o controle difuso de constitucionalidade, surgiu em 1803 nos
Estados Unidos da América, de forma implícita (sem previsão constitucional), no
caso do julgamento de William Marbury e James Madison, cujo qual, o juiz John
Marshall, expos a supremacia dos direitos fundamentais no sistema jurídico,
afirmando a necessidade da conformidade entre os atos normativos em geral e a
Lei Magna.
Decidindo por tanto, a capacidade de o poder judiciário decidir o
momento e o grau de violação de determinado ato, contrário à Constituição, ou
seja, trata-se de controle repressivo de constitucionalidade, nas palavras da autora
Schueller (2013), o mesmo exerce a garantia da “proeminência da Constituição,
assegurando a proteção e a efetivação dos direitos e garantias fundamentais ao
indivíduo e a sociedade”.
Neste instante, convém salientar, que existem duas formas de
controle de constitucionalidade, sendo elas, o controle preventivo e o
repressivo, de acordo com Ferreira Filho (obra citada), “distingue-se então o controle
preventivo do controle repressivo. Aquele opera antes que o ato,
particularmente a lei, se aperfeiçoe; este depois de perfeito o ato, de
promulgada a lei. Aquele é controle a priori. Este, a posteriori”.
Desta forma, conforme Barroso (2006), a fundamentação do controle
da constitucionalidade, está em, proteger os direitos fundamentais, sobretudo o
das minorias, devido ao fato de que, pressupõe a existência de valores
intrínsecos da sociedade, que necessitam de preservação, ‘das injunções
estritamente políticas’.
Nesta acepção, preleciona Alexandrino (2009), para quem, “ocorre o controle difuso (ou aberto) quando a
competência para fiscalizar a validade das leis é outorgada a todos os
componentes do Poder Judiciário, vale dizer, qualquer órgão do Poder
Judiciário, juiz ou tribunal, poderá declarar a inconstitucionalidade das
leis.” Em conformidade com tal modelo, a
interpretação dos direitos fundamentais é voltada para o caso em especifico,
isto é, o juiz analisará os argumentos propostos e decidirá quem tem direito
diante da casuística em espécie, processo, este, denominado, interpretação
tópica, que segundo Bonavides, é composta por:
(...) uma técnica de investigação das premissas, uma teoria da
natureza de tais premissas, bem como, de seu emprego na fundamentação do
Direito e, enfim, uma teoria da argumentação jurídica volvida primariamente
para o problema, para o caso concreto, para o conceito de ‘compreensão prévia’,
(Vorverstandnis), único apto a fundamentar um sistema material do direito, em
contraste com o sistema formal do dedutivismo lógico, carente de semelhante
fundamentação.
Na direção de Marmelstein (obra citada),
esta forma de interpretação é compatível com o sistema difuso de
constitucionalidade, para o qual, reporta a responsabilidade do juiz de efetuar
uma “análise sob a ótica de compatibilidade dos atos infraconstitucionais com a
Constituição, invalidando, os que forem incompatíveis, com efeitos apenas para
aquele caso especifico.”
Em consequência, afirmar-se-á que “o
controle difuso é concreto ou incidental ou indireto”, posto que, a análise da
constitucionalidade possui importância acessória dentro do caso específico.
Assim sendo, além deste modelo, no Brasil, aplica-se também, o controle
concentrado de constitucionalidade, por via direta em decisão do STF, ou seja,
o sistema de controle brasileiro é misto.
Em conformidade, Ferreira Filho (obra
citada), define o controle de constitucionalidade como, “a verificação da
adequação de um ato jurídico (particularmente da lei) à Constituição”. Isto é,
engloba a verificação dos requisitos formais subjetivos (como a competência do
órgão que o editou) e objetivos (como a forma, os ritos, os prazos observados
em sua edição), que se coadunam aos requisitos substanciais de
constitucionalidade do ato jurídico, e consequentemente, no respeito aos
direitos e garantias consagrados na Constituição.
Da mesma maneira, no que reporta a
natureza do órgão responsável acerca das questões de constitucionalidade, o
controle pode ocorrer, por meio do controle
político, que ocorre sempre que a verificação da constitucionalidade é
efetuada por órgão que não pertença ao Poder Judiciário, de forma, que a
segunda forma de controle de constitucionalidade, denominada controle judiciário, ocorre sempre, que
este controle seja exercido através de órgão do próprio Poder Judiciário.
Como
salienta o referido autor, o mesmo (controle judiciário) se verifica nos casos
em que haja, “um caso particular de verificação de legalidade, ou seja, da
verificação da concordância de um ato qualquer, como de um regulamento, à lei,
tarefa que rotineiramente é desempenhada pelo Judiciário”.
Em outra diretriz, com relação ao sistema concentrado (fechado),
tal operação ocorre de maneira que, apenas o STF se encarrega de fiscalizar e
efetivar tal controle, de forma abstrata, visto que, não possuem qualquer
vinculação a um caso em especifico, através da ADI ou da ADC, expressas na Lei
9.868/99, ou por meio da ADPF, instituída pela Lei 9.882/99. Como regra geral, tal
decisões produzem efeitos ex tunc, erga
omnes e vinculante. Em
consequência, enfatiza Alexandrino (obra citada), para o qual, o sistema
concentrado ou reservado, são reservados, para os casos em que:
“(...)a competência para realizar o controle de
constitucionalidade é outorgada somente a um órgão de natureza jurisdicional
(ou, excepcionalmente, a um número limitado de órgãos). Esse órgão poderá
exercer, simultaneamente, as atribuições de jurisdição e de controle de
constitucionalidade das leis, ou, então, exclusivamente esta última tarefa.”
Para Marmelstein (obra citada), a importância do controle difuso
reside no fato de que, uma norma pode ser “abstratamente
constitucional/proporcional/válida, mas na casuística, pode gerar efeitos
indesejados, cabendo ao juiz, através do controle difuso, corrigir essas
situações de injustiças pontuais na aplicação da norma.”
Exemplificativamente pode-se citar o art. 20, § 3º, da Lei
8.742/93, que refere-se, a pessoa portadora de deficiência ou idosa, que receba
renda mensal inferior a ¼ do salário mínimo por pessoa, considerando-a incapaz
de prover-se, nestas circunstâncias, ocorre, porém, que em decisões proferidas
por Ministros do STF, como Cármen Lúcia (STF, Rcl nº 3.805/SP,rel. Min. Cármen
Lúcia, DJ 18/10/2006), bem como, Gilmar Mendes (STF, Rcl nº 4.374/PE, rel. Min.
Gilmar Mendes, 01/02/2007), ensejam um novo sentido para tal lei, evidenciado
na direção de que, tais circunstâncias devem ser aferidas não apenas diante dos
fatos expressos pela norma (lei em específico), mas também, por características
concretas demonstradas no decorrer do processo, de igual intensidade jurídica
para a decisão.
Ainda, nesta acepção, o autor Ferreira Filho (obra citada),
complementa a definição do controle de Constitucionalidade efetuado pelo poder
judiciário, como sendo difuso, ou concentrado, desta forma:
“O controle
judiciário pode ser difuso ou concentrado. Há controle difuso
quando a qualquer juiz é dado apreciar a alegação de inconstitucionalidade. É o
que se dá nos Estados Unidos. Este sistema se coaduna com a ideia, difundida
por Marshall, de que o juiz resolve a questão de constitucionalidade como se se
tratasse de um mero caso de conflito de leis, ou seja, de determinação de qual
a lei aplicável a um caso concreto. Entretanto, enseja por muito tempo a dúvida
sobre a constitucionalidade, visto que, como diversos juízes são chamados a
apreciar a mesma questão constitucional e podem ter opinião divergente, o que
acarretará decisões que se contradizem entre si. De qualquer forma, apenas após,
a manifestação do mais alto Tribunal ficará definida a questão de
constitucionalidade.
É concentrado o
controle toda vez que a competência para julgar a questão de
constitucionalidade é reservada a um único órgão. Certas Constituições (Chile,
1925, Venezuela, 1936, Japão, 1946 etc.) reservam ao mais alto Tribunal o
julgamento das impugnações de um ato do Poder Público sob a alegação de
contradizerem a Lei Magna. Outras (Alemanha, 1949) reservam esse julgamento a
um Tribunal especializado (Corte Constitucional).
Esta concentração num
só órgão da apreciação dos problemas de constitucionalidade tem a inegável
vantagem de dar uma só e última palavra, sobre a validade do ato, o que não
ocorre quando a sua invalidade é declarada por órgão sujeito ao controle, por
via de recurso, por parte do Tribunal mais alto.”
Salienta-se, porém, que todo o juiz na casuística específica, deve
priorizar pelos direitos fundamentais, com base na justiça, e nos valores
constitucionais. Destarte, por mais que haja decisão declarada por meio do STF,
através do controle concentrado (com efeito vinculante, erga omnes e ex nunc),
sobre a constitucionalidade de determinada norma, cabe ao juiz, na aplicação ao
caso concreto, analisar a procedência de tal decisão ou não, posto que, diante
de uma flagrante injustiça, incompatível com os valores constitucionais, o
mesmo deve afastar a aplicação de tal normativa ao caso, apresentando
justificativas concretas para o afastamento de tal prerrogativa.
Deste modo, o mesmo raciocínio cabe as súmulas vinculantes, em
virtude de que, as mesmas devem ser afastadas nos casos de comprometerem o caso
em pauta, por inconstitucionalidade ainda pior que a evidenciada, no entanto,
carece de justificativa detalhada acerca da decisão.
Assim sendo, no que concerne a esta forma de controle de
constitucionalidade, o próprio, pode ser exercido por qualquer membro do Poder
Judiciário, inclusive, sobre esta questão a Constituição Federal de 1988, exige
a cláusula da reserva do Plenário, expressa no art. 97, que preleciona a
maioria absoluta dos membros que compõe o Tribunal pleno ou órgão especial,
como meio de declarar a inconstitucionalidade de leis ou atos normativos do
Poder Público. Em direção Schuller (obra citada), delimita:
“Suscitada a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo
perante um dos órgãos fracionários do Tribunal, cabe a este, caso entenda
procedente a arguição, encaminhá-la ao plenário ou órgão especial, para que
este, aprecie a constitucionalidade em tese do ato ou lei em confronto. Caso a
maioria absoluta entenda pela desconformidade de ato ou lei com a Constituição,
será emitida declaração neste sentido e esta declaração vinculará ao órgão
fracionário (Turma ou Câmara) na resolução daquele caso específico.”
Neste sentido, em continuação a explanação da referida autora:
“A semelhança com o controle concentrado reside no fato de que o
exame realizado pelo plenário ou órgão especial, em nada se diferencia do exame
procedido em sede de ação direta de inconstitucionalidade, ou ação declaratória
de constitucionalidade, em que o controle é de caráter objetivo, sem se
importar com o caso em concreto.”
Vem à baila neste instante, conforme
Araújo (2011), em citação de Ishikawa (2011), que outra diferença entre os dois modelos refere-se ao
procedimento a ser adotado na realização da averiguação da constitucionalidade
da norma ao caso concreto, posto que, a inconstitucionalidade de uma norma deve
ser arguida de forma incidental, no decurso do litígio em juízo, através do
Poder Judiciário.
No entanto, ao que refere-se ao modelo
concentrado, sua aplicação reside em especial, com base na supremacia da lei,
bem como, na separação dos poderes, a qual exclui aos juízes a capacidade de
avaliar a validade da lei, pois que, conforme afirmação de Lamy (2005), também
citada pela referida autora, preleciona no sentido de que, os juízes devem ter como prerrogativas, a premissa de
que, as leis existentes são benéficas, no entanto, “perante a dúvida devem
suspender o processo para arguir a questão constitucional perante o Tribunal
Constitucional.”
Em conformidade com os
referidos autores, agrega-se o posicionamento de Lenza (2010), no sentido de
que, no que refere-se ao aspecto funcional, a diferença encontra-se, no
fato de que, conforme o modelo difuso, a decisão possui caráter declaratório de
situação pré-existente, com efeitos retroativos, ou seja, ex tunc.
Já, no que refere-se ao sistema
concentrado, a decisão possui caráter constitutivo-negativo, com efeitos
prospectivos, ou seja, ex nunc. Em consequência, a análise da
constitucionalidade do ato normativo é questão prejudicial que deve ser
apreciada pelo Poder Judiciário para o desfecho do caso em específico, ou seja,
é considerada como causa de pedir, nunca como razão principal.
No entanto,
Ferreira Filho (obra citada), em contrapartida deste posicionamento, dispõe
que, “durante muito tempo só se admitiu que a questão de constitucionalidade
de uma lei viesse a ser examinada por um juiz como exceção”, ou seja em
alegação de defesa, denominada controle incidental, que tal como o controle
difuso, apresenta o inconveniente de possibilitarem aos juízes diferentes
posicionamentos de validade de uma norma, em razão de que, suas decisões
possuem efeitos particulares ou inter
partes, ou seja, apenas para as partes litigantes, ocasionando uma
incerteza quanto ao direito, até que ocorra uma decisão por meio de um Tribunal
Superior, desta forma:
“(...)exigida a satisfação de obrigação imposta por lei suspeita
de inconstitucionalidade, o devedor dessa obrigação, ao se defender em Juízo,
alega a inexistência da obrigação, por não ser válida a lei que a fundamenta.
Tal exceção é apreciada como preliminar, ou incidente da ação, pelo juiz que,
após resolvê-la, julga o pedido (aplicando a lei se a entender constitucional
ou aplicando a Constituição se considerar inconstitucional a lei). Essa
modalidade de controle é chamada de incidental, pois, embora o reconhecimento
da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei decorra da decisão
judicial, esta não tem por objeto senão a existência ou não de uma obrigação.
Tal sutileza preserva a suscetibilidade do legislador e não fere, nem na
aparência, a separação de poderes, como ocorreria se o juiz julgasse a lei.”
Como solução deste conflito, surgiu nos Estados Unidos o denominado
controle principal, cujo qual, da mesma forma que o controle concentrado,
efetua-se por ação direta, que objetiva a verificação da inconstitucionalidade
de uma lei, apresentada ao Tribunal Superior ou ao Tribunal Especializado, onde
a incerteza da questão será decidida, com efeito geral e erga omnes.
Disso deflui que, no que reporta a natureza do ato, o referido
autor o classifica de acordo com a doutrina clássica, que provém de Marshall, na
direção de que, sendo considerado nulo o ato inconstitucional, a decisão decorrente
será declaratória. Já no
sentido da “doutrina kelseniana, sendo anulável, ex tunc, o ato inconstitucional,
a decisão caracterizante, o desconstitui, ou seja, desfaz. Tem caráter desconstitutivo,
ou, como alguns preferem, constitutivo-negativo.”
Em conclusão no modelo brasileiro, tanto se estabelece o controle
de constitucionalidade preventivo, quanto o repressivo, (confiado ao
judiciário) deste modo:
“O primeiro é
atribuído ao Presidente da República, que o exerce por intermédio do veto. Com
efeito, o art. 66, § 1º, autoriza o Presidente a vetar o projeto de lei que lhe
parecer inconstitucional. Esse veto, contudo, pode ser superado pelo Congresso
Nacional (art. 66, § 4º). Esta deliberação do Congresso não exclui a
possibilidade de a questão ser examinada pelo Judiciário e por este ser
reconhecida a inconstitucionalidade”.
Acentuada esta questão, passar-se-á ao tópico principal do
respectivo trabalho, ou seja, ao objetivo específico de efetuar a análise da
possibilidade de relatividade ou mesmo de restrições aos direitos fundamentais.
4. POSSIBILIDADE DE RELATIVIDADE E/OU RESTRIÇÕES AOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
Conforme Moraes (2013), os direitos fundamentais não podem ser
utilizados como um escudo protetivo
da prática de atividades ilícitas, como também, afirma o Supremo Tribunal
Federal (RT, 709/418), que os mesmos, não podem ser aplicados como argumento
para afastar ou diminuir a responsabilidade civil ou penal por atos criminosos,
sob pena de estarem desrespeitando o Estado de Direito, assim sendo, os
direitos fundamentados na Constituição possuem limitações dentro das próprias
garantias constitucionais, conforme o princípio
da relatividade ou convivência das liberdades públicas.
Nesta acepção, para os casos de conflitos entre direitos ou
garantias fundamentais, o intérprete deverá fazer uso do princípio da concordância prática ou da harmonização, com a
intenção de coordenar e harmonizar os bens jurídicos conflitantes, evitando o
sacrifício total de uns, em virtude de outros, realizando, então, uma redução
proporcional no âmbito de alcance de cada qual.
Neste sentido, Quiroga Lavié (1993), citado por Moraes (obra
citada) acentua que, os direitos fundamentais tiveram origem com a intenção de
reduzir, a ação do Estado aos limites definidos constitucionalmente,
respeitando porém, a subordinação natural do indivíduo ao Estado, como meio de
que, os mesmos, se harmonizem aos limites impostos por um Estado de Direito.
Neste sentido enfatiza o Superior Tribunal de Justiça que:
“(...)está muito em voga, hodiernamente, a utilização ad argumentandum tantum, por aqueles
que perpetram delitos bárbaros e hediondos, dos indigitados direitos humanos.
Pasmem, ceifam vidas, estupram, sequestram, destroem lares e trazem a dor a
quem quer que seja, por nada, mas depois, buscam guarida nos direitos humanos
fundamentais. É verdade que esses direitos devem ser observados, mas por todos,
principalmente, por aqueles que impensadamente, cometem os censurados delitos
trazendo a dor aos familiares das vítimas.” (6ª T.- RHC nº 2.777-0/RJ-rel. Min.
Pedro Acioli- Emantário STJ, 08/721).
Salienta-se, no entanto, que não basta a
existência de uma lei, para tornar legítima uma ação de interferência no âmbito
de direitos e liberdades individuais, necessita-se, primeiramente, que tal ação,
seja adequada a situação, isto é, proporcional e justificada, através, do
interesse público, assim como, que atenda ao critério de razoabilidade.
Consequentemente, por via da observância
da proporcionalidade, convém analisar a legitimidade dos objetivos procurados
pelo legislador, como também, a necessidade de sua utilização, deste modo, “a
ponderação entre a restrição a ser imposta aos cidadãos e aos objetivos
pretendidos”, como expressa Moraes (obra citada).
Nesta diretriz, Mendes e Branco (2012),
dispõem que, “o exercício dos direitos individuais podem dar ensejo, muitas
vezes, a uma série de conflitos com outros direitos constitucionalmente
protegidos. Daí fazer-se mister a definição do âmbito ou núcleo de
proteção e, se for o caso, a fixação precisa das restrições ou das
limitações a esses direitos.”
Deste jeito, por meio do âmbito de proteção dos direitos
fundamentais, abordam-se diferentes pressupostos fáticos e jurídicos concebidos
na norma jurídica, que concluem na proteção fundamental, logo, determinam os
bens ou objetos protegidos e garantidos por meio dos direitos fundamentais.
Conforme a concepção de Bodo Pieroth e
Bernhard Schlink (2012), o âmbito de proteção nada mais é do que, “aquela
fração da vida protegida por uma garantia fundamental”, ou mesmo, o “uso do direito fundamental ou ainda o exercício do direito fundamental”, no
sentido mais amplo possível, devido ao fato de que os próprios, referem-se não
apenas à atuação, mas também, à omissão e em certas ocasiões, ao “simples
encontrar-se” dos direitos fundamentais. Neste sentido, dispõe os referidos
autores:
“Este é o domínio da
vida protegido pelos direitos fundamentais, o âmbito de proteção dos
direitos fundamentais. Por vezes, também se lhe chama âmbito normativo do
direito fundamental, isto é, o domínio que a norma jurídico-fundamental recorta
da realidade da vida como objeto de proteção. Quando falamos de âmbito de
regulação, tem-se em vista não o âmbito de proteção, mas o domínio da vida
a que se aplica o direito fundamental e em que só ele vem determinar o âmbito
de proteção.”
Nesta direção, em
conformidade com Mendes e Branco (obra citada), no que reporta a certos
direitos individuais, “como o direito de propriedade e o direito à proteção
judiciária”, por exemplo, os próprios, “são dotados de âmbito de proteção estritamente
normativo”, o que ignifica dizer, que cabe apenas ao legislador definir a
amplitude e a conformação de tais direitos, ainda nesta questão, acerca do
âmbito de proteção de determinado direito individual, faz-se necessário haver
uma identificação “não apenas do objeto de proteção, como também, contra que
tipo de agressão ou restrição se outorga esta proteção.”
Isso consiste em dizer que “o âmbito
de proteção não se confunde com proteção efetiva e definitiva,
garantindo-se, a possibilidade de que determinada situação tenha a sua
legitimidade aferida em face de dado parâmetro constitucional”. Em sua acepção:
“Quanto mais amplo
for o âmbito de proteção de um direito fundamental, tanto mais se
afigura possível qualificar qualquer ato do Estado como restrição. Ao
revés, quanto mais restrito for o âmbito de proteção, menor
possibilidade existe para a configuração de um conflito entre o Estado e o
indivíduo”.
Neste curso, Bodo Pieroth e Bernhard
Schlink (obra citada), reforçam, na direção de que, esta proteção efetuada por
meio dos direitos fundamentais ao indivíduo produz efeitos, primeiramente, subjetivos, da mesma forma, ao lado do
significado jurídico-subjetivo, como meio de reforçar, ou seja, ampliar seu
âmbito de proteção, emerge o efeito jurídico-objetivo. Isto evidencia, que:
“Verifica-se uma
ingerência, um limite, uma limitação ou restrição, uma afetação, uma redução ou
uma delimitação por parte do Estado, sempre que o particular é por este
impedido de ter uma conduta abrangida pelo âmbito de proteção de um direito
fundamental. A ingerência pode ocorrer individualmente (ato
administrativo, sentença judicial) ou em geral (lei, regulamento
jurídico, regulamento autônomo). Também pode ser, simplesmente, proporcionada
por uma lei; se a lei autoriza, por exemplo, a Administração a impedir ao
particular esta ou aquela conduta, então a própria lei, já decide que
ingerências podem afetar o particular, embora as, não efetue, ainda”.
De acordo com
Mendes e Branco (obra citada), a definição do âmbito de proteção de determinado
direito fundamental, prenuncia um renovado e constante esforço hermenêutico, destarte,
esse processo não possui aferição por regras gerais, exigindo então, para cada
direito em especifico, um determinado procedimento, não obstante, como meio de
sistematizar tal definição, demanda uma análise da norma constitucional tendo
como base:
“a) a identificação
dos bens jurídicos protegidos e a amplitude dessa proteção (âmbito de
proteção da norma);
b) a verificação das possíveis restrições contempladas,
expressamente, na Constituição (expressa restrição constitucional) e
identificação das reservas legais de índole restritiva”.
Dessa forma, Bodo Pieroth e Bernhard
Schlink (obra citada), salientam que, a definição de âmbito de proteção e
ingerência, coadunam-se, em virtude de que, “quanto mais amplo for o
entendimento dos âmbitos de proteção dos direitos fundamentais, tanto mais a
atuação do Estado se apresenta como ingerência;” isto enseja que, quanto mais
restrito for o âmbito de proteção, menos o Estado conflitará acerca dos direitos
fundamentais. Desta maneira, nenhuma
ideologia vem a favor do alargamento do âmbito de proteção dos direitos
fundamentais, assim como, do contrário, também não ocorre.
No entanto, na disposição de Mendes e
Branco (obra citada), a possibilidade de restrições aos direitos fundamentais
vem expressamente prevista em seu núcleo, por meio do princípio da reserva
legal, no art. 5º inc. II, bem como, nos incs. XII e XV, por exemplo. Salienta-se,
porém, que uma norma restritiva de direitos contempla em seu âmago, os
seguintes itens, “(a) uma norma de garantia, que reconhece e garante
determinado âmbito de proteção e (b) uma norma de autorização de restrições,
que permite ao legislador estabelecer limites ao âmbito de proteção
constitucionalmente assegurado.” Nesta percepção, analisando os diferentes
sistemas jurídicos, Ferreira Filho (2012), destaca:
“(...) dois sistemas
principais são consagrados nas Constituições atuais para enfrentar os períodos
de crise política. Um, o que prepondera na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos,
que seguem de perto as tradições de seu Direito: é o da ‘lei marcial’; outro, o
que se prefere nos países de direito escrito, o ‘estado de sítio’. Além desses
sistemas, há um terceiro, menos praticado, o das ‘ditaduras constitucionais’,
de que a romana foi o exemplo clássico, mas que tem seu equivalente na prática,
já moderna, da suspensão da Constituição”.
Nesta razão, Moraes (obra citada) dispõe
que, nos demais ordenamentos jurídicos ocorreram uma adaptação das normas
constitucionais para os casos de situações emergenciais, bem como, a inserção
de emendas nas Constituições, como forma de disciplinar a temática, dado que,
na diretriz de Cicero (2000), “é preferível um remédio que cure as partes
defeituosas da democracia, do que um que as ampute”.
Conforme esta orientação evidencia-se
que as limitações ao poder estatal, expressas no rol das liberdades públicas,
apenas se concretizam em tempos de normalidade, já que, nos momentos de crises,
as mesmas impossibilitariam qualquer reação de manutenção da soberania estatal.
De acordo com esta lógica, Moraes (obra citada), salienta acerca da
preeminência do Poder Executivo em tempos de crise.
Em vista de o próprio possuir todos os
elementos necessários a avaliação da situação em concreto, e depois, por ser o
órgão responsável por assegurar a ação do Estado, do mesmo modo que, o mesmo
detém a Chefia das forças Armadas, como resultado disso, detém maior
independência nos exercícios das atividades presidencialistas, em tempos de
crises, “de poderes extraordinários mais ou menos extensos em matéria de edição
de normas jurídicas”, no nexo do referido autor.
Dessa forma encontra-se no ordenamento
jurídico brasileiro duas medidas excepcionais para a restauração da ordem em
momentos de dificuldades, o estado de
defesa e o estado de sítio, garantindo até mesmo a suspensão pelo
Presidente da República de determinadas garantias constitucionais, ampliando o
poder repressivo do Estado, em justificativa da gravidade da perturbação da
ordem pública.
Assim, no sentido de Lavié (1993),
suspender não importa em extinguir, ou seja, os direitos individuais permanecem
como princípio da liberdade humana, ao invés de, ser concessão do Estado. Então,
a excepcionalidade da suspensão ou restrição de direitos fundamentais é
autorizada por diversos textos constitucionais, em situações anormais e
temporárias, como medida protetiva ao Estado Democrático de Direito, frente a
ameaças à ordem democrática (isto é, quando, apresente os requisitos
específicos), ou seja, sua maior finalidade concerne na própria defesa dos
direitos fundamentais, postos em riscos, de acordo com Moraes (obra citada), em
citação à Combotchecra, é o que se denomina sistema
constitucional das crises.
Nesta medida, no regime presidencialista
brasileiro, desde 1891, isto é, na primeira Constituição Republicana, já
continha expressão da possibilidade, por parte do Presidente da República, de
decretar o estado de sítio. Tradição esta, que foi mantida na Constituição de
1934, na Constituição de 1937, na Constituição de 1946, onde sofreu alteração
da denominação para estado de emergência ou
estado de guerra, na Constituição de
1967, que retornou a nomenclatura original e por fim por meio da EC nº 01/69,
que expressava estado de sítio ou estado
de emergência.
Por conseguinte, na direção do referido
autor, a Constituição de 1988, prevê em seu texto, em situações excepcionais de
gravidade, a possibilidade de supressão ou restrição temporária de direitos e
garantias fundamentais, garantido, no entanto, a responsabilização do agente
público em caso de utilização de tal medida de maneira injustificada ou
arbitrária, acerca disso, Bueno (1958), enfatiza, que tal forma é de tal
importância que nem ao menos deveria ser aceita, posto que é um ato anormal. Em
distinção ao estado de defesa e estado de sítio, Moraes (obra citada),
apresenta:
“O estado de defesa é uma modalidade mais
branda de Estado de sítio e corresponde as antigas medidas de emergência do direito constitucional anterior e não
exige, para sua decretação por parte do Presidente da República, autorização do
Congresso Nacional. O decreto presidencial deverá determinar o prazo de sua
duração; especificar as áreas abrangidas e indicar as medidas coercitivas, nos
termos e limites constitucionais e legais.”
Nessa hipótese poderão ser restringidos
o art. 5º inc. XII, ou seja, o sigilo da correspondência e de comunicações
telegráficas e telefônicas, bem como, o direito a reunião (XVI), e ainda,
(LXI), a exigibilidade de prisão somente em flagrante delito ou por ordem de
autoridade judicial competente. Já no que concerne ao estado de sítio, o mencionado autor o define como sendo:
“(...)
a suspensão temporária e localizada de garantias constitucionais, apresentando
maior gravidade do que o Estado de defesa e, obrigatoriamente, o Presidente da República deverá solicitar
autorização da maioria absoluta dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal para decretá-lo.”
Para os casos de decretação de estado de
sítio, os direitos e garantias individuais que poderão ser restringidos, são a
inviolabilidade domiciliar (art. 5º, inc.XI), sigilo de correspondência e de
comunicações telegráficas e de telefone (inc. XII), direito de reunião (XVI),
direito de propriedade (XXV), exigibilidade de prisão somente em flagrante
delito ou por ordem de autoridade judicial competente (LXI), e ainda, a liberdade
de manifestação do pensamento, também, a criação, a expressão e a informação
(art. 220).
No entanto, caso o estado de sítio seja
declarado em consequência de declaração de guerra ou resposta à agressão armada
estrangeira (art. 137, inc. II), torna-se possível a restrição de todos os
direitos e garantias constitucionais, apresentando três requisitos indispensáveis
para tal resultado, sendo eles, que a necessidade para “à efetivação da medida,
tenham sido objeto de deliberação por parte do Congresso Nacional no momento da
autorização da medida; devem estar expressamente previstos no decreto
presidencial nacional.”
Salienta-se, no entanto, acerca da
impossibilidade de supressão ou restrição de todos os direitos e garantias
fundamentais, devido ao fato de que, o Estado estaria incorrendo em arbitrariedade
e anarquia, verificável no fato de que, direitos como a vida são indiscutíveis.
Assim Barbosa (obra citada), ressalta
sobre o estado de sítio, como sendo, uma situação arbitrária parcial e
relativa, encontrando limites na legalidade, devendo estar em harmonia com o
sistema normativo vigente, bem como, com os tribunais e o sistema legislativo.
Ocorre que, mesmo decretado estado de
sítio ou de defesa, a Constituição continua exercendo o poder soberano sobre o Estado,
situação a qual, direciona ao controle de constitucionalidade sobre o Poder
Público, efetuados por meio do Poder Judiciário, em prevenção a abusos e
ilegalidades, posto que, a excepcionalidade da medida, nunca resultará no total
extermínio dos direitos e garantias individuais, como salienta Mello (1986).
Em decorrência, conforme observação de
Moraes (obra citada), os Poderes Legislativos e Executivo, encontram-se
impedidos de ocultar a previsão constitucional de acesso ao Poder Judiciário,
para as casuísticas de lesão ou mesmo ameaça de lesão a direito, em atenção ao
fato de que, entraria em desrespeito a separação dos poderes, expressos
constitucionalmente e impedidos de inexistirem mesmo em situações de crises.
De acordo com Teixeira (1991), as situações
emergenciais legalizam regimes de exceção, entretanto, não autorizam à
inconstitucionalidade, a ilegalidade, a arbitrariedade e a anarquia, os mesmos,
se caracterizam, apenas, em um “regime jurídico especial para situações
excepcionais, em que alguns bens ou esferas de liberdade são provisoriamente
sacrificados no interesse superior da ordem e da segurança do Estado e, em
última análise, da liberdade e da segurança dos próprios cidadãos.”
Da mesma forma, se posiciona Ferreira
Filho (obra citada), para o qual, mesmo nos casos de suspensão das garantias
constitucionais, o Executivo, ainda assim, encontra-se limitado por meio das
normas e fronteiras relacionadas aos momentos de crise, assim sendo, caso o
mesmo incida em abuso, o Poder Judiciário encontrar-se-á, legitimado para
intervir.
Por via do âmbito internacional, também
encontra-se expressão de limitações ou suspensões à direitos e garantias
fundamentais, é o que expressa, por exemplo, por meio do Pacto de São José da
Costa Rica, o qual prevê, tal direção para os casos de guerra, de perigo
público ou mesmo de outra emergência que venha a ameaçar a independência ou a
segurança do Estado -parte.
Expresso em seu texto encontra-se a
possibilidade de supressão de direitos como os de reconhecimento da personalidade
jurídica, direito à vida, à integridade pessoal, como também, a restrição da
proibição da escravidão e da servidão; assim como, a possibilidade de limitação
dos princípios da legalidade e da retroatividade, a retenção da liberdade de
consciência e de religião, a circunscrição dos direitos ao nome, da criança, de
nacionalidade, e até mesmo a contenção da proteção à família e dos direitos
políticos.
Igualmente, determina que, qualquer
Estado-parte, que venha a fazer uso do direito de suspensão, necessita
comunicar aos outros Estados -partes, por meio do Secretário Geral da
Organização dos Estados Americanos, e também, informar as disposições que tenha
suspendido seus efeitos e os motivos que determinaram tal atitude, assim como,
a data em que tenha dado para a conclusão de tal medida excepcional.
Nesta questão, a Constituição de 1988
admite possibilidades de restrições aos direitos fundamentais, como já exposto,
sejam estas restrições diretas ou indiretas, como no exemplo citado por Branco
e Mendes (obra citada), “a liberdade de associação para fins lícitos”
(art. 5º, XVII), ocorre também, situações em que, o próprio texto
constitucional na definição da garantia ou em disposição autônoma, impõe
limites ou restrições ao direito fundamental assegurado.
Nesta direção, conforme exemplo dos
referidos autores, tem-se o caso do direito de reunião, em locais públicos, cujo
qual, “é assegurado, desde que realizada pacificamente e sem armas” (art.
5º, XVI). Diante disso, passar-se-á a apresentar as duas teorias acerca das
restrições do direitos fundamentais, como meio lógico para o estabelecimento de
tais restrições.
6. TEORIA INTERNA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
De acordo com a teoria interna, a delimitação das restrições aos
direitos fundamentais ocorre em processo interno, isto é, os aspectos externos
não interferem em seu conteúdo, impossibilitando por tanto a existência de
colisão entre os mesmos, esta acepção se insere na questão de que, o direito
cessaria aonde começaria o abuso. Sbrissia (2013) afirma no sentido de que,
“estes direitos terão sempre a estrutura de regras. A norma será sempre
aplicada quando a hipótese prevista por ela ocorrer, e, diante disso, terá
validade estrita.”
Vem à baila, no entanto, a forma de como será demonstrada a
delimitação destes direitos, a partir de seu próprio núcleo, assim sendo, para
tal objetivo, far-se-á uso da teoria institucional, ou por meio dos limites
imanentes, que cujos quais, se expressam através dos limites decorridos da
própria constituição, visto que na verdade, não se trata de restrições, mas sim,
de limites expressos por meio do constituinte originário.
Em consonância com a Teoria Institucional, abordar-se-á a atenção
com o conteúdo essencial, associado aos limites dos direitos fundamentais. Para
obtenção de tal resultado, Silva (2009) utiliza-se, da teoria de Haberle, para
qual, os direitos fundamentais de liberdade abandonam seu caráter de
individualidade, para tornarem-se sociais, para o mesmo, a liberdade não seria
algo inato do ser humano, e sim algo positivado por meio do direito, neste
sentido, a atividade estatal não a restringiria, apenas imporia limites em seu
conteúdo e abrangência.
Fica exposto, por tanto que, na concepção da teoria interna, não
existem fatores externos que viessem a influenciar nas restrições de tais
direitos, devido ao fato de que, para a mesma não haveria o sopesamento de
princípios.
Neste sentido, Branco e Mendes (obra
citada), enfatizam, que para a própria, não existiriam “conceitos de direito
individual e de restrição como categorias autônomas, mas sim a ideia
de direito individual com determinado conteúdo.” Ou seja, “a ideia de
restrição passa a ser substituída pela de limite”.
Em citação a Alexy, os mesmos enfatizam
que, “eventual dúvida sobre o limite do direito não se confunde com a
dúvida sobre a amplitude das restrições que lhe devem ser impostas, mas
diz respeito, ao próprio conteúdo do direito.” Isso exposto, passar-se-á
a abordar a contraposição desta teoria, ou seja, a teoria externa.
7. TEORIA EXTERNA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A teoria externa possui relação direta
com a teoria dos princípios, proposta por Ronald Dworkin, cuja qual, possui
como adeptos, doutrinadores como Alexy (2008), cuja mesma, finda no o objetivo
de estabelecer a distinção entre as regras a e aferição de normatividade aos
princípios, que para o autor, os princípios consistem em “algo que seja
realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e
fáticas existentes, neste sentido, eles não contém um mandamento definitivo,
mas apenas prima facie”, o que resulta dizer, que na verificação de um caso em
concreto, um princípio poderá ser afastado devido a antagonismos.
Para Mendes e Branco (obra citada), tal
teoria, admitiria “que entre a ideia de direito individual e a ideia de restrição,
existe uma relação necessária. Essa relação seria estabelecida pela necessidade
de compatibilização entre os direitos individuais e os bens coletivos.”
Consequentemente, Alexy estabelece que,
entre a teoria interna e a teoria externa existe mais diversidades
do que a terminológica ou mesmo a conceitual, por conseguinte, uma corrente que
possua uma concepção individualista da sociedade, penderia para o entendimento
da teoria externa, neste sentido, aquele que compreender o ser humano, no
gênero social, defenderá a teoria interna, ou seja, a adoção de uma ou de outra
teoria dependerá do posicionamento que o indivíduo possa ter, acerca dos
direitos individuais.
Nesta diretriz, ao agregar-se a ideia de
que os direitos individuais expressam posições definitivas, então caberá a
aplicação da teoria interna, no entanto, caso se faça o entendimento de que os
direitos fundamentais apenas criam posicionamentos “prima facie”, então, será
adaptável a teoria externa.
Bem como, tem-se também a consideração,
ainda elencada por Alexy (obra citada), a partir da pressuposição de que as
normas de direitos fundamentais se dividem em princípios ou regras,
considerando-as como princípios, assenta-se a teoria externa, de outro modo,
consideradas como regras agrega-se a teoria interna. Dito isso, abordar-se-á
neste momento as jurisprudências do STF acerca da temática.
8. JURISPRUDÊNCIAS DO STF
Acerca das limitações constitucionais, cita-se, o caso em que a
CPI ordenou com sua própria conivência, a quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico,
voto proferido pelo Rel. Min. Celso de Mello, no sentido de que, foi legitima a
ação da CPI, bem como acentua sobre a soberania da Constituição frente a todos
os poderes, bem como, a possibilidade de limitação de direitos fundamentais
individuais em proteção ao bem comum do povo, assim sendo:
O CONTROLE JURISDICIONAL DE ABUSOS PRATICADOS POR COMISSÃO
PARLAMENTAR DE INQUÉRITO NÃO OFENDE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. - A
essência do postulado da divisão funcional do poder, além de derivar da
necessidade de conter os excessos dos órgãos que compõem o aparelho de Estado,
representa o princípio conservador das liberdades do cidadão e constitui o meio
mais adequado para tornar efetivos e reais os direitos e garantias proclamados
pela Constituição. Esse princípio, que tem assento no art. 2º da Carta
Política, não pode constituir e nem qualificar-se como um inaceitável manto
protetor de comportamentos abusivos e arbitrários, por parte de qualquer agente
do Poder Público ou de qualquer instituição estatal. - O Poder Judiciário,
quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a
integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente
legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da Republica. O
regular exercício da função jurisdicional, por isso mesmo, desde que pautado
pelo respeito à Constituição, não transgride o princípio da separação de
poderes. Desse modo, não se revela lícito afirmar, na hipótese de desvios
jurídico-constitucionais nas quais incida uma Comissão Parlamentar de
Inquérito, que o exercício da atividade de controle jurisdicional possa
traduzir situação de ilegítima interferência na esfera de outro Poder da
República. O CONTROLE DO PODER CONSTITUI UMA EXIGÊNCIA DE ORDEM POLÍTICO-JURÍDICA
ESSENCIAL AO REGIME DEMOCRÁTICO. - O sistema constitucional brasileiro, ao
consagrar o princípio da limitação de poderes, teve por objetivo instituir
modelo destinado a impedir a formação de instâncias hegemônicas de poder no
âmbito do Estado, em ordem a neutralizar, no plano político-jurídico, a
possibilidade de dominação institucional de qualquer dos Poderes da República
sobre os demais órgãos da soberania nacional. Com a finalidade de obstar que o
exercício abusivo das prerrogativas estatais possa conduzir a práticas que
transgridam o regime das liberdades públicas e que sufoquem, pela opressão do
poder, os direitos e garantias individuais, atribuiu-se, ao Poder Judiciário, a
função eminente de controlar os excessos cometidos por qualquer das esferas
governamentais, inclusive aqueles praticados por Comissão Parlamentar de
Inquérito, quando incidir em abuso de poder ou em desvios inconstitucionais, no
desempenho de sua competência investigatória. OS PODERES DAS COMISSÕES
PARLAMENTARES DE INQUÉRITO, EMBORA AMPLOS, NÃO SÃO ILIMITADOS E NEM ABSOLUTOS.
- Nenhum dos Poderes da República está
acima da Constituição. No regime político que consagra o Estado democrático
de direito, os atos emanados de qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito,
quando praticados com desrespeito à Lei Fundamental, submetem-se ao controle
jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV). (RDA 196/195, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RDA
199/205, Rel. Min. PAULO BROSSARD). OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM
CARÁTER ABSOLUTO. Não há, no sistema
constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter
absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências
derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que
excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas
restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados
os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime
jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as
informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica,
destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de
outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum
direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com
desrespeito aos direitos e garantias de terceiros. A QUESTÃO DA DIVULGAÇÃO
DOS DADOS RESERVADOS E O DEVER DE PRESERVAÇÃO DOS REGISTROS SIGILOSOS. - A
Comissão Parlamentar de Inquérito, embora disponha, ex propria auctoritate, de
competência para ter acesso a dados reservados, não pode, agindo
arbitrariamente, conferir indevida publicidade a registros sobre os quais
incide a cláusula de reserva derivada do sigilo bancário, do sigilo fiscal e do
sigilo telefônico. (...)Constitui conduta altamente censurável - com todas as
conseqüências jurídicas (inclusive aquelas de ordem penal) que dela possam
resultar - a transgressão, por qualquer membro de uma Comissão Parlamentar de
Inquérito, do dever jurídico de respeitar e de preservar o sigilo concernente
aos dados a ela transmitidos. Havendo justa causa - e achando-se configurada a
necessidade de revelar os dados sigilosos, seja no relatório final dos trabalhos
da Comissão Parlamentar de Inquérito (como razão justificadora da adoção de
medidas a serem implementadas pelo Poder Público), seja para efeito das
comunicações destinadas ao Ministério Público ou a outros órgãos do Poder
Público, para os fins a que se refere o art. 58, § 3º, da Constituição, seja,
ainda, por razões imperiosas ditadas pelo interesse social - a divulgação do
segredo, precisamente porque legitimada pelos fins que a motivaram, não
configurará situação de ilicitude, muito embora traduza providência revestida
de absoluto grau de excepcionalidade. POSTULADO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE
JURISDIÇÃO: UM TEMA AINDA PENDENTE DE DEFINIÇÃO PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL.(...)
A cláusula constitucional da reserva de jurisdição - que incide
sobre determinadas matérias, como a busca domiciliar (CF, art. 5º, XI), a
interceptação telefônica (CF, art. 5º, XII) e a decretação da prisão de
qualquer pessoa, ressalvada a hipótese de flagrância (CF, art. 5º, LXI)- traduz
a noção de que, nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não
apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa
de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo-se, desse modo, por força e
autoridade do que dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício
de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do
Estado. Doutrina . - O princípio constitucional da reserva de jurisdição,
embora reconhecido por cinco (5) Juízes do Supremo Tribunal Federal - Min.
CELSO DE MELLO (Relator), Min. MARÇO AURÉLIO, Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Min.
NÉRI DA SILVEIRA e Min. CARLOS VELLOSO (Presidente) - não foi objeto de
consideração por parte dos demais eminentes Ministros do Supremo Tribunal
Federal, que entenderam suficiente, para efeito de concessão do writ
mandamental, a falta de motivação do ato impugnado. (STF - MS: 23452 RJ ,
Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 16/09/1999, Tribunal Pleno,
Data de Publicação: DJ 12-05-2000 PP-00020 EMENT VOL-01990-01 PP-00086).
De outra forma, citar-se-á, a ementa do habeas corpus, na qual o
Rel. Min. Luiz Fux deferiu como legal a medida emergencial de transferência de
preso para presidio federal de segurança máxima, sem a observância das
formalidades legais, posto que, o mesmo preencheu os requisitos para obtenção da
limitação de seu direito individual, ou seja:
Ementa: Execução penal. Transferência de preso para presídio
federal de segurança máxima sem observância de formalidades legais. Afronta ao
devido processo legal, à ampla defesa, à individualização da pena e à dignidade
humana: Inocorrência: Medida emergencial caracterizada por: a) histórico de
rebeliões que provocaram 40 mortes em Rondônia, a partir de 2003; b) julgamento
do Brasil e do Estado de Rondônia pela Corte Interamericana de Direitos
Humanos; c) interdição de presídio; d) periculosidade do paciente, condenado a
49 anos de reclusão; e e) liderança subversiva exercida pelo agente e
consequente desestabilização do sistema prisional. Oitiva do recluso:
postergação em caso de emergência – art. 5º, § 6º, da Lei n. 11.671/2008. 1. O
§ 6º do art. 5º da Lei n. 11.671/2008 estabelece que “Havendo extrema
necessidade, o juiz federal poderá autorizar a imediata transferência do preso
e, após a instrução dos autos, na forma do § 2º deste artigo, decidir pela
manutenção ou revogação da medida adotada”.
(...) 2. In casu, os fatos caracterizadores da situação de
emergência restaram demonstrados: (i) rebeliões ocorridas a partir de 2003, com
42 (quarenta e duas) mortes; (iii) julgamento do Brasil e do Estado de Rondônia
pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, interdição de presídio, etc.,
tudo isso aliado à particular periculosidade do recluso, devidamente
demonstrada nas execuções penais as quais responde, por isso é mister que se
acolha a justificativa judicial no sentido de “A prévia oitiva do agente, nesta
altura, é insusceptível de efetivação. (...)4. O quadro delineado revela -
diversamente do sustentado nas razões da impetração – inexistência de violação
dos direitos fundamentais atinentes ao devido processo legal, ao contraditório,
à ampla defesa e à dignidade humana. 5. Ordem denegada. (STF - HC: 115539 RO,
Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 03/09/2013, Primeira Turma, Data de
Publicação: DJe-182 DIVULG 16-09-2013 PUBLIC 17-09-2013).
10. DEFINIÇÕES CONCLUSIVAS
Em conclusão é verificável que mesmo os direitos fundamentais
sendo soberanos dentro da constituição, os próprios podem sofrer restrições ou
até limitações, as quais podem vir descritas no próprio texto constitucional,
bem como, podem ser verificável na casuística em concreto, desde que em
observância a requisitos como a legalidade e a necessidade de tais
prerrogativas, dentre as medidas, elencam-se o estado de sítio e o estado de
emergência, ocorre porém, que apenas poderá ocorrer limitações de direitos, em
virtude da segurança da país e dos próprios cidadãos.
Assim, convém destacar, que mesmo o país estando em alguns destes
estados de emergências, a Constituição Federal continuará exercendo poder
soberano, porém de forma mais singela, no entanto, o indivíduo em hipótese
alguma se encontrará totalmente desassistido de seus direitos.
Também, importa conferir, que o Poder Judiciário, terá
legitimidade de ação, mesmo nestes estados de calamidade, exercendo por tanto,
o controle da arbitrariedade, ou ilegalidades efetuadas neste regime, que terão
formalidades a serem respeitadas para seu estabelecimento, as quais incluem, as
espécies de direitos que poderão ser limitados, bem como, a data para a
finitude de tal estado, e também as localidades e profundidade, que tal medida
atingirá a sociedade.
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