quarta-feira, 22 de março de 2017

ITER CRIMINIS: DO POLICIAMENTO OSTENSIVO AO DEVER DE INDENIZAR A VÍTIMA


Resumo: A presente pesquisa pretende analisar o instituto da reparação de danos e o dever de indenizar a vítima no sistema jurídico pátrio, sob o olhar de um mecanismo de controle e repressão a reincidência criminal, visando a efetivação da responsabilidade do acusado por seus atos delitivos. No intuito de verificar uma resposta a essa temática, formulou-se o seguinte problema de pesquisa: é possível o instituto processual civil, através da reparação pelos danos causados às vítimas dar efetividade para a repressão criminal e auxiliar na conscientização sobre a responsabilidade do sujeito ativo? Pretendendo responder ao problema proposto, o trabalho tem por objetivo geral discutir a inversão de valores ocorrida na esfera jurídica, momento em que os ativistas dos direitos humanos, tem dado maior enfoque a proteção do agente delitivo do que da vítima, possuindo apoio pelos pensadores jurídicos que permanecem omissos a estes casos. E por objetivos específicos: a) estudar o caminho do crime, desde o policiamento ostensivo até o dever de indenizar a vítima; b) analisar a reparação do dano e a proteção das vítimas no âmbito doutrinário e jurídico; c) estudar a responsabilização civil como forma de reprimir a reincidência criminal. Existem inúmeras formas de efetivação da segurança pública, no entanto, efetivar a lei é uma das mais basilares.
Palavras-chave: Reparação do dano; Dever de indenizar a vítima; Proteção da vítima; Responsabilização civil pelo ilícito penal.

1.      INTRODUÇÃO
Este estudo pretende abordar o iter criminis, ou seja, o caminho do crime desde a esfera do policiamento ostensivo, até o dever de indenizar o ofendido. O objetivo do artigo consiste em descortinar a sociedade e aos doutrinadores jurídicos quanto ao imperativo de efetivar os direitos das vítimas, que, comumente têm sido deixadas em segundo plano.
Constata-se a instalação de uma inversão de valores no solo pátrio, instante em que o acusado passa a ser mais beneficiado pelo sistema judicial do que o ofendido, afinal, não raras vezes se verifica a mídia enfocando na proteção de um delituoso, com mais ênfase do que focaliza o amparo de um cidadão trabalhador na área de segurança pública, como é o caso do policial militar que atua em linha de frente no combate a criminalidade, sendo alvo de todas as adversidades e, muitas vezes, morto em combate, deixando seus familiares desamparados, as margens da lei e das garantias fundamentais.
A ação dos ativistas dos direitos humanos tem apresentado um agir desfocado, pois, não evidenciam a cobertura dos cidadãos policiais militares, e demais agentes a serviço da lei, como o fazem com os demais cidadãos, transmitindo a impressão de que os policiais encontram-se descobertos do manto protetivo dos direitos humanos fundamentais.
Sendo contrário a este posicionamento e consciente de que todos são iguais perante a lei, foi que a autora efetuou uma entrevista com os policiais militares da Base de PM da Região Oeste do Município de Chapecó, pertencente ao 2° Batalhão de Polícia Militar/Fron, vinculado à 4ª Região de Polícia Militar de Santa Catarina, instante em que os agentes da lei concluíram que a maior problemática respectiva a efetivação da segurança pública compreende o alto índice da taxa de reincidência criminal, concluindo que o sujeito passivo (vítima) tem sido relegado em seus direitos e garantias, fato este que colabora para que os criminosos retornem a delinqüir, sendo imperativo que os agentes criminosos passem a reparar, também, na esfera cível por seus delitos, de modo a fortalecer os vínculos jurídicos de repressão criminal.
É notável que uma esfera complementa a outra (cível e a efetivação da segurança pública). Deste modo, no primeiro item será destacado acerca das peculiaridades da abordagem policial militar através do policiamento ostensivo, demarcando as experiências dos militares em serviço e suas abordagens no que tange a resoluções das ocorrências, principalmente no que se refere às vitimas, seguindo caminho para o trabalho policial civil e sua abordagem no que se reporta aos sujeitos ativos e passivos do núcleo delitivo.
E em terceiro ponto será abordado à questão da proteção da vítima no âmbito jurídico, com enfoque no aspecto doutrinário, encerrando através do item quatro, momento em que será destacado sobre a legitimidade no ordenamento jurídico pátrio para a reparação de danos na esfera cível, esmiuçando todo o arcabouço jurídico acerca da temática, com o objetivo de elucidar e abrir caminhos para a busca da efetivação da reparação do dano e consequentemente, da repressão criminal.

2.      ABORDAGEM POLICIAL MILITAR NO POLICIAMENTO OSTENSIVO
A atividade policial militar é indispensável para a promoção da segurança pública, tanto que a Carta Cidadã, a expressa desde o preâmbulo ao seu fim, implícita ou explicitamente, visto que não há organização social que subsista sem a atividade policial militar. Conforme a enciclopédia brasileira a polícia se define como sendo (1980, p. 1197):

A ordem ou segurança pública: o conjunto de leis e disposições que lhe servem de garantia; a parte da Força Pública ou Corporação incumbida de manter essas leis e disposições de boa ordem; civilização; cultura social; cortesia; nome comum a diversos departamentos especializados na defesa do regime político do Estado (polícia política, polícia militar), na fiscalização, inspeção ou profilaxia de certas doenças (polícia sanitária), etc.; s.m. indivíduo pertencente à corporação policial.

Estas definições exprimem a gama de ações que o Estado possui como meios de policiar a sociedade, protegendo, advertindo e corrigindo as ilicitudes e arbitrariedades, como afirma Assis (2002, p. 29). Ocorre que a atividade policial militar emergiu de mãos dadas com a humanidade, andando lado a lado para abrir caminhos que possibilitassem a existência da sociedade. Desde o momento em que o primeiro homem decidiu conviver com os demais, a atividade policial passou a ser edificada no solo pátrio, bem como, “a partir do momento em que o primeiro homem resolveu delimitar e cercar uma área, classificando-a como sua propriedade, iniciou-se aí os conflitos de toda ordem”, como leciona Assis (2002, p. 30).
Foi necessário mais que a lei natural, onde o mais forte imperava, para estabelecer uma convivência harmônica e pacífica, foi preciso o estabelecimento de uma ordem de valores, arquitetada com fundamentos na hierarquia e disciplina, atuante com base na lei e nos princípios humanitários, esculpida como braço forte do Estado, e detentora do mais aprofundado saber no que tange a segurança pública, corporificada na gloriosa instituição da Polícia Militar, como forma de preservar a ordem pública e a “incolumidade das pessoas e do patrimônio”, como desponta o caput do art. 144 da CF/88, munida, pelos mais puros discernimentos de justiça, lealdade, legalidade, proximidade e humanidade, atuante através do reforço da população e de outras instituições públicas e privadas.
Por meio do poder de polícia, o Estado labora através da Polícia Militar e da Polícia Civil, intervindo na conduta das pessoas, modelando a sociedade às regras de convivência estabelecidas na lei e possibilitando o convício social, fazendo erigir do solo nacional a ordem pública, a qual consiste na correção legal dos indivíduos (públicos ou privados) que pretendam ou tenham de alguma forma burlado a lei e prejudicado seus semelhantes, vislumbrando estabelecer a justiça e a ordem social e auxiliando dentro de suas atribuições na efetivação dos preceitos estabelecidos na Constituição Republicana, “exercendo uma função transformadora da sociedade” como ensina Jesus (2011, p. 55), corporificando os direitos e garantias fundamentais esculpidos na Carta.
Dentro deste campo de estudo, foi efetuada uma entrevista com policiais militares para extrair suas experiências e seus posicionamentos acerca do desenvolvimento da atividade policial militar, no que se refere ao policiamento ostensivo, desenvolvido através da PM, cujo qual se caracteriza por ser realizada por agentes identificados pela farda, equipamento ou viatura, instante em que a autora procurou os policiais militares da Base de Operações Militares Efapi, região Oeste do 2° Batalhão de Polícia Militar de Chapecó/Fron, pertencente à 4ª Região de Polícia Militar do Estado de Santa Catarina, sendo recebida cordialmente, o que possibilitou o manuscrito deste artigo.
A entrevista se realizou com soldados, cabos e sargentos, com tempo de atividade militar variante entre 10 a 29 anos, os quais informaram que, em geral, os policiais são designados, através da Central Regional de Emergência (CRE), a qual faz uma triagem nas ocorrências e empenha as viaturas conforme o recebimento da ligação e a gravidade da situação, coletando e transmitindo as informações aos agentes auxiliando-os em seu deslocamento. Os policiais informaram que recebem treinamento técnico de abordagem, o qual prepara os agentes da lei para desempenharem suas funções com especificidades conforme o ambiente de trabalho, munindo-os com técnicas de adaptações conforme as necessidades avistadas.
A guarnição chega ao local designado, efetua os primeiros contatos com as vítimas, avalia se as informações repassadas ao CRE estavam corretas e procede conforme a carência verificada no local, abordando os agentes, ativo e passivo, com proximidade e atenção visando estabelecer a ordem no local e efetivar a lei. Conforme o Soldado Kades, a abordagem pode ocorrer, também, através do policiamento preventivo, instante em que ainda não foi acionada a emergência (190), e que a viatura encontra-se fazendo rondas preventivas no local e depara-se com a necessidade de ação, salientando que a Polícia Militar não atua somente sobre os ilícitos (flagrantes delitivos), mas também, com o fim de prestar socorro.
A abordagem é baseada em fundadas suspeitas, denúncias ou casos de flagrante delito, realizando-se em conformidade com os trâmites descritos na legislação pátria e de acordo com os padrões estabelecidos pela própria corporação, que no caso da PMSC, possui o Estatuto dos Policiais Militares do Estado de Santa Catarina, que esculpe em letras douradas no art. 29 o dever de desempenhar a função militar com ética, impondo aos integrantes da corporação uma “conduta moral e profissional irrepreensível”, em observância aos preceitos éticos do cargo, compreendendo dever do policial militar agir com dignidade e respeitar os cidadãos, dar efetividade à lei com justiça e imparcialidade, respeitar as autoridades civis, observar as normas de convivência social e cumprir com seus deveres de cidadão:

Art. 29 (...) I – Amar a verdade e a responsabilidade com fundamento da dignidade pessoal; II – Exercer, com autoridade, eficiência e probidade às funções que lhe couberem em decorrência do cargo; III – Respeitar a dignidade da pessoa humana; IV Cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes; V – Ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados; VI – Zelar pelo preparo próprio, moral, intelectual e físico, bem como pelos dos subordinados, tendo em vista o cumprimento da missão comum; VII – Empregar as suas energias em beneficio do serviço; VIII – praticar a camaradagem e desenvolver, permanentemente, o espírito de cooperação; IX – Ser discreto em suas atitudes maneiras e em sua linguagem escrita e falada; X – abster-se de tratar, fora do âmbito apropriado, de matéria sigilosa de qualquer natureza; XI – Acatar as autoridades civis; XII – cumprir seus deveres de cidadão; XIII – Proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular; XIV – Observar as normas da boa educação; XV – Garantir assistência moral e material ao seu lar e conduzir-se como chefe de família modelar; XVI – Conduzir-se, mesmo fora do serviço ou na inatividade, de modo que não sejam prejudicados os princípios da disciplina, do respeito e o decoro policial-militar; XVII – Abster-se de fazer uso do posto ou da graduação para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros; XVIII – abster-se o policial-militar na inatividade do uso das designações hierárquicas quando: a) em atividades político-partidárias; b) em atividades comerciais; c) em atividades industriais; d) discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou policiais-militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnica, se devidamente autorizados; e) no exercício de cargo ou função de natureza civil mesmo que seja da Administração Pública. XIX – Zelar pelo bom nome da Polícia Militar e de cada um de seus integrantes, obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos de ética policial-militar.

É importante frisar o ponto descrito no inciso XII do art. 29 do estatuto, que acarreta ao policial militar a obrigação de cumprir com seus deveres de cidadão, no sentido de salientar que o agente da lei, em nenhum momento abstém-se de ser um ser humano, necessitando, por isto, ser respeitado por todos os indivíduos, tanto pelo desempenho de sua honrosa função, quanto por compreender uma pessoa embasada pelo manto protetor da Carta Constitucional que em seu art. 5°, descreve que todos são iguais perante a lei, visto que estas pessoas, diuturnamente deixam o aconchego de seus lares e a afeição de seus familiares para vestirem sua farda e arriscarem suas vidas na proteção de estranhos, munidos pelo espírito humanitário de efetivar a ordem pública, adentrando em locais perigosos, e muitas vezes perdendo suas vidas no desempenho de seu trabalho, afinal um cidadão policial militar não possui apenas deveres, mas direitos, também, e dentre eles, encontra-se o direito de ser respeitado.
Sabendo que os mesmos, trabalham mais pela honra da função que desempenham do que pelo reconhecimento da população ou do salário que recebem, os quais não alcançam o nível de riscos e tormentos psicológicos vivenciados por estes seres humanos, torna-se imperativo que a sociedade desperte para a valorização destas pessoas e de seu labor.
Denota o Soldado Kades que o sentimento demonstrado pelas vítimas de alívio e esperança ao avistá-los em serviço impulsiona-os a desempenharem seu trabalho com maior dedicação e firmeza, reavivando-lhes a satisfação de exercer suas atribuições ao verificar a adequação de seu trabalho às necessidades do caso em epígrafe, despertando-lhe um sentimento de honra sempre que sua guarnição consegue dar efetividade e eficácia às leis pátrias, procurando agir como um conciliador, de maneira a resolver as problemáticas sempre que possível no local dos fatos, dando celeridade as resoluções, e trabalhando de forma próxima da comunidade, com humanismo e legalidade.
As experiências dos policiais entrevistados demonstram a dificuldade no desempenho da atividade, pois, como regra geral, sempre que os mesmos resolvem uma ocorrência um lado ou outro fica descontente com a ação, visto que o próprio criminoso não gosta de ser pego em flagrante, e ocorrências como as relacionadas com a Lei Maria da Penha, por exemplo, são demasiadas desgastantes, pois, envolve situações de rupturas familiares, o que consome psicologicamente os policiais militares. Em resposta, o soldado Kades, informou que cada situação é única, carregada por experiências positivas e negativas, as quais proporcionam ao policial conhecimento social e humanitário que somente a atividade militar é capaz de fornecer.
A atividade policial militar estende-se até a condução dos envolvidos, quando necessário, à Delegacia ou ao Conselho Tutelar, instante em que os mesmos prestam depoimento e repassam as peculiaridades do caso para que sejam efetuados os procedimentos cabíveis, em conformidade com os padrões técnicos recebidos e com a legislação vigente.
A maior problemática avistada na atividade compreende o grande nível de reincidência criminal, sendo imperativo que seja materializado no solo nacional o dever jurídico e moral de indenizar a vítima que detém o delituoso, o qual a sociedade precisa solicitar frente aos órgãos públicos, agindo ativamente em prol da segurança pública, sob pena de auxiliar através da omissão a instalação da criminalidade e do caos social.

3.      NOS CORREDORES DA DELEGACIA DE POLÍCIA CIVIL
A atividade policial civil possui caráter investigatório, sendo reconhecida como polícia judiciária. A diferenciação entre o trabalho da Polícia Militar e do labor da Polícia Civil centraliza-se no fato de que a primeira atua, primordialmente, como meio de impedir ou paralisar atividades delituosas, enquanto a segunda age através da investigação e responsabilização dos agentes infratores, porém, a PM em algumas situações, também, pode desempenhar as mesmas funções que a PC.
Ademais, “o termo ‘polícia judiciária’ tem origem no Code d’Intruction Criminelle (França), quando a polícia judiciária abrangia tanto órgãos policiais, quanto o Ministério Público e o Juízo de Instrução”, como leciona Oliveira (2014, p. 9). Portanto, sua atividade, atualmente, consiste em auxiliar o Judiciário e o MP. Destaca o art. 144 da Carta Cidadã que as polícias militares desempenham a função de policiar ostensivamente e de preservar a ordem pública, enquanto a polícia civil incumbe “as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais”.
Neste contexto, conduzido os envolvidos para o âmbito da Delegacia de Polícia Civil, e prestado o depoimento pelos policiais militares responsáveis, estes encerram, por ora, suas atividades acerca do caso em temática, e são designados para outra ocorrência e assim sucessivamente até o fim de seu turno, enquanto os policiais civis coletam os depoimentos dos envolvidos e buscam solucionar os conflitos no núcleo da Delegacia, de maneira a dar celeridade e eficiência às leis nacionais e caso não seja possível efetuar a conciliação, dão andamento ao caso conforme os trâmites da lei, investigando e ofertando a denúncia ao Ministério Público, ou designando os agentes para as repartições dos Juizados Especiais, conforme a matéria a ser tratada.
Na visão dos policiais civis, também, é constatada a mesma problemática verificada pelos policiais militares que se encerra na reincidência dos agentes delituosos, sendo indiscutível a necessidade de conter estes indivíduos, deparando-se novamente com a necessidade de materialização do mecanismo de reparação do dano e o dever de indenizar a vítima, sobre o qual será tratado no próximo item.

4.      A PROTEÇÃO DA VÍTIMA NO ÂMBITO JURÍDICO
A vítima hodiernamente tem sido alvo de acirrados debates pelos doutrinadores jurídicos, devido ao fato de que, historicamente, a mesma tem tido papel secundário no livro da tramitação processual penal, suportando os prejuízos e danos, detendo poucos direitos efetivos, e descaso por parte do Estado, em razão de que, tem ocorrido uma inversão de valores e os direitos humanos passaram a proteger o sujeito ativo em primeiro lugar, abandonando ao descaso as vítimas dos delitos e os cidadãos policiais que vêem seu trabalho multiplicado e desvalorizado.
Este fato comumente tem sido demonstrado nas páginas vermelhas dos jornais, e dos noticiários, e pouco ou nenhum enfoque tem sido dado ao dever e a responsabilidade que o sujeito ativo tem de indenizar os danos causados, como leciona Gomes (2011, p. 34).
Normalmente, o sujeito ativo compreende uma pessoa de poucos recursos financeiros, desempregado e ocioso, e o Estado esconde-se atrás destas circunstâncias renegando o dever de indenização que este indivíduo possui, e respaldo nos direitos humanos não falta para que esta situação se consume. Finda no fato de que as decisões magistrais ocasionam mais benefícios ao réu do que a vítima, vitimizando ainda mais o sujeito passivo, e o silêncio e a inércia dos ativistas dos direitos humanos, consumam esta situação, deixando a vítima em desamparo e proporcionando para que o delituoso retorne a delinqüir.
É notável o fato de que um delinqüente, seja adolescente ou não, possui maior enfoque protetivo pelos ativistas dos direitos humanos, do que um cidadão policial militar, que se encontra diuturnamente arriscando suas vidas em locais perigosos, muitas vezes abandonados à criminalidade, protegidos somente por um colete balístico e uma arma, que a considerar pelo progresso criminal, encontra-se com o calibre e potencial inferior ao dos criminosos que irão “enfrentar” ao proteger a sociedade e a ordem pública.
Ao adentrarem nestes ambientes hostis, é comum a morte destes seres humanos, seja no exercício da função ou devido a ela, porém, não se verifica o clamor por justiça, seja por parte da sociedade ou dos operadores jurídicos em proteção destas vítimas e de suas famílias que tiveram suas vidas ceifadas ao protegerem a sociedade.
A inversão de valores na esfera judicial e social é indiscutível, como destaca Giacomolli (2006, p. 86), urge pelo momento em que a sociedade seja descortinada a respeito da essencialidade do exercício da função militar e do dever que possui o próprio Estado de indenizar as vítimas pelos danos sofridos, afinal, no instante em que o Estado chamou para si a solução das controvérsias, através da judicialização, o próprio tornou-se responsável pela solução dos conflitos sociais e pela efetivação da justiça.
Salienta-se que ao referir-se, com primazia a função militar, não há pretensão em desmerecer as outras funções atuantes na área da segurança, no entanto, devido às peculiaridades de suas atribuições, são estes os agentes que se encontram frente a frente com o perigo, ao efetivarem o policiamento ostensivo, característica desta forma de trabalho.
No entanto, tendências nacionais e internacionais[1] de proteção às vítimas estão surgindo no solo terrestre, objetivando suprimir as fragilidades decorrentes dos abalos sofridos através dos delitos, seja decorrente da vitimização por ser um sujeito passivo do delito, ou em função do trabalho exercido, como no caso dos policiais militares, com vistas a entregar uma solução célere e efetiva a esta inversão de valores vislumbrada constantemente nas páginas dos jornais e na tela da mídia televisiva, tendentes a promover alterações significativas na esfera do ofendido (vítima do delito) dentro do processo criminal pátrio, ou do ofendido em razão da função exercida (caso dos policiais militares) a fim de sopesar e dirimir a situação de fragilidade das vítimas em ambos os casos. Ademais, enfoca Giacomolli (2006, p. 84) que:

O descaso com a vítima, após ter sido atingida pela infração criminal, seu etiquetamento, a falta de apoio psicológico, as pressões a que se vê submetida, a necessidade de reviver o delito através do comparecimento em juízo, é uma realidade em nosso ordenamento jurídico. Isso se revela mais acentuado na violência doméstica e sexual, principalmente contra mulheres. Tradicionalmente, os sistemas jurídicos se preocupam com o destino dos acusados. As vítimas, como regra, ficam em um plano secundário, sem a proteção do aparato estatal, isto é, praticamente neutralizadas pelo sistema, tanto do ponto de vista do direito material quanto processual penal, tendo que recorrer a uma verdadeira via crucis dentro do processo penal.

Sabe-se que os delitos ocasionam danos que vão além do campo penal, prejudicando a capacidade psicológica das vítimas, e gerando, também, prejuízos de caráter financeiro, determinando o direito à indenização em favor do sujeito passivo (vítima). Destaca Santos (2013)[2] que:

Todo e qualquer cidadão detém um universo de direitos gravitando em torno de seu patrimônio, avultando de importância aquele que lhe confere proteção contra danos injustamente perpetrados aos seus bens materiais ou intangíveis. O ordenamento pátrio prevê em seu bojo mecanismos que viabilizem a restauração do bem tutelado, objeto de depreciação por ato ilícito, ao seu estado natural (status quo ante), à compleição que outrora lhe circunscrevia. Isso porque a ninguém é dado causar dano a outrem.

No entanto, a vítima tem tomado espaço no âmbito nacional, ocasionando em alterações no sistema jurídico pátrio em amparo das mesmas e em busca de efetuar a justiça. Exemplo recente desta modificação de pensamento é a Lei n° 13.142, de 06 de julho de 2015 que trouxe modificações aos arts. 121 e 129 do Código Penal e do art. 1° da Lei de Crimes Hediondos, acrescendo ao §2° do art. 121 a seguinte expressão:

VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: ...............................................................................” ..(NR). (Grifos do original).

Ou seja, qualifica o crime quando se tratar de assassinato de policiais militares, transmutando o tempo de condenação criminal para o mínimo de 12 anos, até 30 anos. Já o art. 129 do CP, recebe nova roupagem ao incluir o § 12 em se texto, delimitando que:

§ 12.  Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços. (NR). (Grifos do original).

Passando a embasar que a lesão corporal sofre aumento de pena se cometida contra policiais militares, e ainda, torna crime hediondo o homicídio comedido dentro destas características, conforme expressa a Lei n° 8.072/90, através do art. 1°, I e I-A, in verbis:

I – homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, incisos I, II, III, IV, V, VI e VII);
I-A – lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2o) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;
“...” (NR). (Grifos do original).

Cabe destaque o fato de que o legislador entregou o manto protetor não apenas para os trabalhadores destas funções, mas também para seus familiares até terceiro grau, o que denota uma abertura para o abrigo destes seres humanos, reavivando a legislação penal em conformidade com as necessidades sociais e com as diretrizes da Carta Magna. Porém, mais que a expressão destes direitos em lei, é necessário verificar sua efetividade no plano prático, visto que o papel compreende um sujeito sem vida que aceita tudo que lhe for escrito, no entanto, a máquina do judiciário precisa trabalhar para dar materialidade a estes escritos e torná-los eficazes no solo pátrio.
Posto que, até mesmos nos casos de estado de necessidade (excludente de ilicitude) é imposto ao agente causador do dano o dever de indenizar a vítima, sendo incabível que em casos de ilicitude a vítima não consiga em resposta do Estado, mais que a atribuição de uma sanção penal, mas também, a imposição de indenização cabível em cada caso, posto que, mais que dar aplicabilidade as leis brasileiras o Estado possui o dever de valorizar o trabalho dos agentes da lei (civis, militares e demais), e o labor do cidadão que teve seu bem extraído através de um furto, por exemplo, perdendo gratuitamente um bem que custou o suor de seu trabalho a um estranho, que nem ao menos se esforçou para consegui-lo de forma digna. Ensina Mougenot (2009, p. 56) que:

A ação civil ex delicto, portanto, em nada se distingue das demais ações cíveis indenizatórias. Com efeito, trata-se essencialmente de ação civil, cuja única vinculação com o juízo penal decorrerá da circunstância de que a causa de pedir de ambas as ações – penal e civil – será um mesmo fato, que, além de constituir ilícito civil, também constituirá delito penal.

Desta forma, consumado o crime no seio social, e, em decorrência, ocasionado dano de cunho patrimonial, não há meios para fugir da responsabilidade de indenizar a vítima, ademais a pretensão indenizatória poderá ser exercitada através da action civilis ex delicto na forma congnitiva ou executiva, por meio do título judicial que emerge da sentença penal condenatória, com fulcro no art. 65 do Código de Processo Penal.
A reforma ocorrida no sistema jurídico “ampliou os direitos e garantias das vítimas”, como afirma Souza (2010, p. 02), aperfeiçoando o direito em conformidade com as necessidades sociais, como exemplo destas renovações é possível citar a viabilidade do sujeito passivo ser comunicado acerca dos atos processuais referentes ao ingresso e saída do sujeito ativo (acusado) da prisão, bem como, acerca da sentença e dos acórdãos publicados, autorizando, também, à vítima a cumulação entre a ação penal e a ação indenizatória.
Cabe enfocar o fato de que a vítima apenas ascendeu no meio judiciário com o advento da Lei n° 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais, possibilitando ao ofendido seu aparecimento no cenário processual, saindo da inércia a qual se encontrou no transcorrer do tempo.
Desta maneira, irradia a necessidade de estudos aprofundados sobre a inserção da vítima no âmbito do processo criminal e a amplitude da proteção dos ofendidos para o núcleo dos trabalhadores efetivadores da segurança pública, a exemplo dos militares, com o fim de analisar a efetividade e a legitimidade inegável de suas participações no contexto da pretensão acusatória, em atenção ao fato de que o Direito deve acompanhar a evolução social de maneira a suprimir as necessidades de seus cidadãos, preocupando-se com a esfera das vítimas, sua valorização e com a reparação dos danos por elas sofridos, garantindo-lhes amplo apoio psicológico e jurídico, sem que com isso, abandone as proteção e garantias do acusado.
Uma das dificuldades enfrentadas pelo ofendido na busca pela reparação do dano sofrido consiste no fato de que a necessidade de celeridade que existe no processo penal, devido ao fato de tratar-se de medida relacionada à privação de liberdade, vai contra o tempo necessário para a discussão acerca de valores de indenização dentro da instrução criminal, que em conformidade com o art. 387, IV do CPP descaracterizaria o objetivo do processo penal, ao incluir números e valores, quando a primordialidade centralizar-se-ia na discussão sobre o direito de liberdade do indivíduo.
No entanto, a transferência das questões cíveis para o âmbito processual penal, com a intenção de conceder celeridade e atenção ao ofendido, não se reporta a uma renovação, visto que o legislador já vem utilizando este meio, como no caso da Lei Maria da Penha, ou mesmo nos delitos de competência do juizado especial criminal, ao legitimar a justiça consensual. Nestes âmbitos, as reparações dos danos estão sendo discutidas na própria ação penal, através de suas sentenças.
Passa a ser necessário, a introdução de uma instrução cível no âmbito da instrução criminal, objetivando ao acusado o exercício de seu direito de discutir os valores, para o caso de condenação. Neste enfoque, passa a ser obrigatória a produção de provas respectivas aos valores na esfera criminal e, em decorrência, o acesso a ampla defesa e ao contraditório.
No entanto, outra forma de reparação de danos compreende o uso da sentença penal condenatória como título judicial comprovante da materialidade e autoria delitiva na esfera cível, instante em que será discutido somente os valores referentes aos danos sofridos, recordando que a reparação pecuniária dos danos independe da sentença criminal condenatória, visto que um delito protegido por uma excludente de ilicitude possui legitimidade para ser questionado civilmente no que tange aos danos, no exemplo de um indivíduo que arromba a porta da casa de um cidadão, para salvá-lo de iminente perigo.

5.      LEGITIMIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO PARA A REPARAÇÃO DE DANOS
O artigo 63 do Código de Processo Penal legaliza o exercício da ação civil, definindo que ao transitar em julgado a sentença condenatória é possível ao ofendido a promoção de sua execução, através do juízo cível, com efeitos de reparar os danos sofridos. Desta feita, com o fim de facilitar a execução, o juiz terá a faculdade de “fixar o montante de indenização na própria sentença penal condenatória”, dando a ela valor como título executivo cível, instante em que a área processual criminal passa a influenciar no juízo cível, como expressa Ishida (2009, p. 07).
Coadunado ao art. 186 do Código Civil que define que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, já o ato ilícito vem definido na Súmula 37 do STJ como o ato praticado em desacordo com a ordem jurídica, que viole direito subjetivo individual. Neste percurso, de acordo com o art. 186 e 187 do novo estatuto civil, “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Em conformidade com o art. 91, I do Código Penal a sentença condenatória detém o efeito de “tornar certa a obrigação de indenizar o dano resultante do crime”. Leciona De Jesus (2012, p. 238) que a sentença penal condenatória produz efeitos meramente declaratórios no âmbito cível, visto não haver nela mandamento expresso quanto ao dever de o réu reparar o dano proveniente do crime. Ademais, a Lei n° 11.690/08 expressa a legitimidade para que o juízo criminal defina o valor mínimo da indenização, coadunado ao art. 91 e 387 do CPP. Porém, a complementação entre o art. 93 do CPP e 91, I do CP dão certeza à obrigação de reparar o dano, desta forma:

[...] transitada em julgado à sentença penal condenatória, tem o titular da indenização a possibilidade de executá-la diretamente pelo valor mínimo estipulado na sentença penal condenatória ou, caso pretenda satisfazer montante superior, deve preceder a execução da sentença penal da necessária liquidação. A execução no juízo cível pode ser promovida pelo ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. A condenação penal irrecorrível faz coisa julgada no cível para efeito da reparação do dano, não se podendo mais discutir a respeito do an debeatur, mas somente sobre o quantum debeatur. Significa que o causador do dano não poderá mais discutir no juízo cível se praticou o fato ou não, se houve relação de causalidade entre a conduta e o resultado ou não, se agiu ilicitamente ou não, se agiu culpavelmente ou não. Só pode discutir a respeito da importância da reparação, na hipótese de o titular do direito ingressar com prévia liquidação visando a obter valor superior ao mínimo estipulado na sentença condenatória. (De Jesus, 2012, p. 245).

O art. 64 do CPP faculta ao ofendido a proposta no juízo cível, contra o autor do crime e contra o responsável civil de ação de reparação de danos, instante em que, intentada a ação, o juiz da esfera cível poderá suspender o curso da mesma até que saia o julgamento definitivo da ação criminal. Adiante, o art. 65 do mesmo Caderno de Leis define que, “faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”. Ou seja, a extinção de punibilidade não impede a execução da sentença penal condenatória no que se refere ao efeito de reparação do dano, pois seu efeito secundário de obrigar o sujeito a reparar o dano não se exclui. Neste caminho:

Art. 67.  Não impedirão igualmente a propositura da ação civil: I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação; II - a decisão que julgar extinta a punibilidade; III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.

Destaca-se, o artigo 932 do CC que define a responsabilidade cível como independente da criminal, visto que via de regra, a responsabilidade em uma esfera não obriga a responsabilidade em outro âmbito, mesmo o despacho de arquivamento de inquérito policial ou de peças de informação prejudica a propositura da actio civilis ex delicto. Adiante, em conformidade com o art. 68 do CPP, em se tratando de titular de direito de ação de reparação de dano pobre, este, pode requerer ao Ministério Público que promova a execução da sentença condenatória.
Enfatiza a doutrina de De Jesus (2012, p. 243) que incide na ação os juros ordinários, contados a partir da data do fato típico e antijurídico e os juros compostos, em conformidade com os preceitos estabelecidos nas Súmulas do STJ n. 43: “incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo”, e n. 54: “os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual” e, ainda a n. 186: “nas indenizações por ato ilícito, os juros compostos somente são devidos por aquele que praticou o crime”.
Destaca-se que conforme o art. 188, I e II e 929 e s. do CC dispõe que a absolvição criminal baseada nas causas de exclusão de antijuridicidade, via de regra, exclui o direito de reparação de dano na esfera cível, a não ser nos casos em que a lei civil, mesmo reconhecendo a licitude do fato, determine a obrigação de ressarcimento do dano causado. Neste sentido:

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado. Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano.

No exemplo de De Jesus (2012, p. 245):

Suponha-se que o sujeito, em estado de necessidade, tenha praticado um fato típico, causando dano ao patrimônio de terceiro. É processado e absolvido com fundamento nos arts. 23, I, e 24 do CP (art. 386, V, do CPP). O terceiro pode intentar a ação civil de reparação do dano? Pode, nos termos dos arts. 929 e 930 do CC de 2002 (Vide RT 741/196). E se o perigo foi causado por terceiro? Neste caso, a ação civil deve ser proposta contra o causador do dano, i. e., contra o sujeito que foi absolvido no juízo criminal por força do estado de necessidade, ficando este com direito regressivo contra o autor do perigo (CC de 2002, art. 930).

Nada obstante, é defeso entrar com ação de reparação de dano “quando o fato é praticado em legítima defesa contra o autor da agressão”, se, no entanto, for atingido terceiro inocente, a ação, tonar-se então, legitima. Porém, a absolvição fundamentada em causa de excludente de culpabilidade (CP, arts. 21, 22, 26, caput, e 28, § 1º) não impede a ação, também não impede o exercício da ação os casos do réu absolvido por legitima defesa putativa (arts. 20, §1° e 21 do CP) e nos casos de absolvição por ausência de culpa (art. 66 do CPP), contanto que, o juízo criminal não tenha reconhecido a inexistência material do fato.
Sendo o fato atípico e havendo danos, também poderá ser proposta a ação civil, nem nos casos de absolvição por falta de prova suficiente para condenação ou nos casos de não existir prova suficientes para confirmar que o réu concorreu na pratica do fato delituoso.
A legislação protetiva é vasta, porém carece de efetividade e aplicabilidade, é necessário que as vítimas conscientizem-se de seus direitos e busquem a sua materialização, posto que, se o legislador julgou necessário expressá-los, significa que somente a sanção penal não foi considerada meio suficiente de coerção e de repressão em matéria criminal, e este fato é notável no dia-a-dia dos cidadãos, instante em que a reincidência criminal se engrandece, amedrontando os indivíduos e avultando o trabalho dos agentes efetivadores da segurança pública (policiais militares).
Quanto maior for à repressão no combate ao crime menores serão as taxas de reincidência criminal, como define o art. 144 da CF, designando que a segurança pública é dever do Estado, porém, direito e responsabilidade de todos, portanto, o cidadão não possui o mero direito de ação, mas o dever, auxiliando na promoção da segurança e da pública, concretizando o bem-estar social. Não basta a existência da lei protetiva é imperativo a sua efetividade no plano prático.

6.      CONCLUSÃO
Foi exposto neste estudo, o caminho percorrido no crime, desde o instante do deslocamento da viatura ao local dos fatos e suas peculiaridades, até o dever de indenizar a vítima, até então esquecido pelos doutrinadores e pelos operadores da lei.
Neste estudo, foi efetuada uma entrevista com os agentes da lei que executam o primeiro contato com as vítimas dos crimes, ou seja, os policiais militares e verificado suas formas de abordagem e suas experiências profissionais.
Posteriormente a isto, foi esmiuçado o entendimento doutrinário acerca da proteção conferida as vítimas dos agentes delituosos e por fim, discorreu-se acerca do tratamento legal direcionado a estes sujeitos fragilizados pelo cometimento dos crimes.
Instante em que se averiguou que a maior problemática enfrentada pelos agentes da lei compreende a reincidência criminal e que estas ocorrências poderiam ser amenizadas caso houvesse um redirecionamento da população para a efetivação da esfera cível no que tange ao cometimento de crimes, dando um maior respaldo aos lesados pelos fatos típicos e antijurídicos, e reforçando o cunho repressivo da criminalidade através de sanções, não apenas penal, mas cível também.
Conclui-se que a efetivação das leis indenizatórias de cunho pecuniário dariam vida aos regramentos referentes à matéria e reforçariam o aguçamento da responsabilidade do sujeito ativo (criminoso) por seus atos, impedindo-lhe que retorne a esta forma de viver, além de conferir o reembolso aos lesados pelos danos sofridos no iter criminis.

REFERÊNCIAS
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_____. Código de Processo Penal. Lei n° 3.689 de 03 de outro de 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm. Acesso em 20 de dez de 2015.
_____. Código Civil. Lei n° 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em 20 de dez de 2015.
_____. Lei dos Crimes Hediondos. Lei n° 8.012/90. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8072.htm. Acesso em 20 de dez de 2015.
_____. Lei n° 11.690, de 09 de junho de 2008. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11690.htm. Acesso em 20 de dez de 2015.
_____. Lei n° 13.142 de 06 de julho de 2015. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13142.htm. Acesso em 20 de dez de 2015.
ASSIS, Jorge César de. Lições de Direito para a Atividade Policial Militar. 5ª ed. - Curitiba: Juruá, 2002.
DE JESUS, Damásio. Código de Processo Penal Anotado. 25 ed. –São Paulo: Saraiva, 2012.
GIACOMOLLI, Nereu José. Legalidade, oportunidade e consenso no Processo Penal na perspectiva das garantias constitucionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
GOMES, Lauro Thaddeu. A reparação do dano ao ofendido na sentença penal condenatória. Congresso internacional de ciências criminais, II edição, 2011.
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JESUS, José Lauri Bueno de. Polícia Militar & Direitos Humanos: Segurança pública, Brigada Militar e os Direitos Humanos no Estado Democrático de Direito. 1ª ed. 4ª reimpr. – Curutiba: Juruá, 2011.
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SANTOS, Caio Daniel Giraldi dos. A reparação do dano à vítima no processo penal e o papel do Ministério Público. Disponível no sítio da OAB Santa Catarina. Disponível em http://www.oab-sc.org.br/artigos/reparacao-do-dano-vitima-no-processo-penal-e-papel-ministerio-publico/759. Acesso em 20 de dez de 2015.
SOUZA, Juana Giacobbo de. A vítima e a reparação do dano no processo criminal brasileiro. TCC apresentado para conclusão de curso de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela instituição Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2010.



[1] Cita-se como exemplo desta tendência a Resolução A/RES/40/34, do ano de 1985, editada pela Assembléia Geral das Nações Unidas: “Declaração dos princípios fundamentais de justiça relativos às vítimas de criminalidade e às vítimas do abuso do poder”.
[2] Disponível em http://www.oab-sc.org.br/artigos/reparacao-do-dano-vitima-no-processo-penal-e-papel-ministerio-publico/759.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Parte 3 - A promoção dos Direitos Humanos Fundamentais através da Polícia Militar (parte III)

CAPÍTULO III:
ADOLESCÊNCIA E CRIMINALIDADE: UM PROBLEMA DE IMPACTO SOCIAL

3.1  Da Carta Magna de 1988 ao Estatuto da Criança e do Adolescente
Apesar da ineficácia e do descaso do Estado e da sociedade com relação aos direitos infanto-juvenis, esta parcela da sociedade já se deparou com indiferença jurídica e exclusão social em volume mais intenso que o atual, tanto que as conquistas sociais de organizações de caráter internacional, voltadas a concretização da proteção aos direitos das crianças e adolescentes, coadunadas às contínuas denúncias de violência contra esta faixa etária, promoveram a origem Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Este documento legal trouxe amparo jurídico aos jovens, que, harmonizado com a Carta Política de 1988, irradiaram o reconhecimento de um tratamento igualitário entre os seres humanos (Art. 5, caput da CF/88) edificado na dignidade da pessoa humana (Art. 1°, III, CF/88).
Além de que, Machado (2003, p. 90) enfoca que a dignidade da pessoa humana compreende “valor supremo da democracia”, valor subordinante que não pode ser substituído, e que é destinado a todos os seres humanos, pelo seu caráter de ser humano, o que significa que mesmo a pessoa que aja ilicitamente não será destituída de sua dignidade, pois pagar por crime cometido não consiste em destituição da dignidade. Desta forma, cabe ao Estado proporcionar todas as formas para que um indivíduo possa usufruir de sua dignidade. Neste enfoque, do Art. 1°, inc. II da CF/88 define como objetivo fundamental do Estado, promover a cidadania, a qual aborda o direito e o dever de participar das decisões dos poderes públicos e de viver uma vida plena, na fruição de todos os direitos que a condição de ser humano provém, sendo possuidor do direito a um mínimo existencial que inclui a cobertura pelo manto constitucional e o abrigo de arbitrariedades e ilicitudes.
Ademais, o art. 5° da Carta Política expõe em seus 78 incisos, o mais amplo rol de direitos e garantias já existentes constitucionalmente, impedindo a imposição de tratamento desumano ou degradante (inc. III), a impossibilidade de responder por crime sem lei anterior que o defina (inc. XXXIX), a possibilidade de retroação da lei somente para os casos em que beneficiar o réu (inc. XL), a garantia de punição para qualquer discriminação que atente os direitos e liberdades fundamentais (inc. XLI) e etc., caracterizando cobertura legal suficiente para que todos os cidadãos possam viver uma vida satisfatória. Neste ínterim, conforme relatório expedido pela UNICEF (apud D’AGOSTINI, 2003, p. 66), “existem 140 milhões de crianças vivendo no mundo em condições subumanas. No Brasil, de uma população de 70 milhões de pessoas menores de 18 anos, cerca de 45 milhões estão atravessando a faixa de pobreza, (... ou na) miséria absoluta”, estes dados são antigos, porém, eficazes se comparados com a atualidade, onde as políticas públicas são superficiais e incapazes de promover a inclusão do jovem na sociedade em igualdade de condições.
Outro documento importante foi a Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças, de 20 de novembro de 1989, a qual apresentou ao mundo a teoria da proteção integral como base para as atitudes referentes aos jovens. O Brasil adotou o texto deste manuscrito em sua integralidade através do Decreto 99.710/1990, após ratificação do Congresso Nacional (Decreto Legislativo 28/1190). A doutrina da proteção integral torna exigível o direito às crianças e adolescentes de serem tratadas com dignidade e garante um mínimo existencial, assegurando a efetividade de todos os direitos fundamentais para esta faixa etária, atuando em concordância às diretrizes da Carta Política, sendo responsáveis pela materialização deste manuscrito os entes públicos, a sociedade e a família conjuntamente.
Acresce que o art. 6° da Carta Magna designa total amparo aos direitos sociais da maternidade e da infância, bem como, da educação, da saúde, do trabalho, da moradia, do lazer, da segurança, da previdência social, além de prestar total subsídio aos desamparados. Expressa o art. 14 a possibilidade do maior de 16 anos sufragar e obrigação do maior de 18 anos de exercitar este direito. Brinda ao cidadão um capítulo próprio destinado à educação (Capítulo III), disponibilizando-a como direito de todos, responsabilidade e dever do Estado e da família, matéria esta que será analisada com mais profundidade no próximo conteúdo em virtude de sua função fundamental na construção de um Estado Democrático Constitucional, compreendendo a base de qualquer coletividade, visto atuar como uma moldura, sobre a pessoa, preparando-a para a vida social nos trâmites da lei e das necessidades sociais.
Como alicerce dos direitos infanto-juvenis a Constituição Federal transcreveu o Capítulo VII (Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso), destinando a promover a instituição familiar como base da sociedade, trazendo no art. 226, a criança como titular de proteção estatal, instante em que o § 7° do dispositivo em comento, coloca o planejamento familiar sobre a base da dignidade humana e da paternidade responsável, deixando esta decisão como livre deliberação do casal, incumbindo ao Estado à promoção de recursos educacionais e científicos para a prática deste direito, que coadunado ao § 8° impõem ao Estado a criação de mecanismos que coíbam a violência no âmbito familiar.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos: I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII; (...); IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica; V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade; (...) § 8º A lei estabelecerá: I - o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens;  II - o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas. (Grifos da autora).

Desta análise extrai-se a cobertura legal das principais ilicitudes relacionadas aos direitos da criança e do adolescente, anteriormente omissos, garantindo direito ao trabalho aos maiores de 14 anos ressalvados as peculiaridades de sua condição, bem como, resguardando os direitos provenientes desta relação (previdenciário e trabalhista), garantindo o direito a frequentar escola, direito à defesa, à igualdade de direitos, respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento, estímulo do Poder Público no que tange a destinação de abrigo aos menores abandonados, políticas públicas de ensino ao jovem dependente de drogas e entorpecentes, punição severa de abusos, violência e exploração sexual contra menores de 18 anos e a legalização de legislação própria regulando a proteção destes jovens (ECA).
O art. 227 precisa que os direitos infanto-juvenis urgem por asseguramento prioritário, obrigando ao Estado, a família e a sociedade à promoção destes direitos. Já o art. 228 da Expressão Maior, reporta-se a responsabilidade penal diferenciada entre os menores de 18 anos e os adultos, ecoando a letra e ordem do art. 27 do CP ao definir que “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. Estes artigos compreendem manifestações próprias da dignidade da pessoa humana, em uma junção de três elementos essenciais: infância, lei e democracia, conforme afirma Oliveira (2011, p. 653), desta forma, os problemas relacionados à infância são impasses também da democracia.
Coadunado ao art. 229, constata-se o dever dos pais em “assistir, criar e educar os filhos menores” evidencia-se que o manto protetivo que a Constituição promulgou é vasto, cabendo ao Estado, à família e a sociedade fazerem uso destas diretrizes. A Carta Cidadã destinou este sistema protetivo aos direitos infanto-juvenis, devido ao reconhecimento dos mesmos como seres humanos em desenvolvimento físico, psíquico e emocional, encontrando-se então “em situação especial e de maior vulnerabilidade, ensejadora da outorga de um regime especial de salvaguardas, que lhes permitam construir suas potencialidades humanas em sua plenitude”, nas palavras de Machado (2003, p. 109).
Consciente da plena proteção que a Constituição conferiu às crianças e aos adolescentes, é que estas diretrizes foram documentadas e agregadas a outros direitos e garantias destinados a esta faixa etária, formalizando-se com base na doutrina da proteção integral, através da Lei 8.069/90 (ECA), revolucionando a área do direito infanto-juvenil, tanto com relação à formulação de políticas públicas, quanto à estrutura e funcionamento dos organismos atuantes neste âmbito, conforme destaca D’Agostini (2003, p. 69), de acordo com esta lei a responsabilidade pela materialização da lei e da proteção necessária a estes jovens provem de todos os âmbitos públicos, privados, sociais e familiares.
Conforme o art. 103 do ECA o crime ou contravenção penal praticado por menor de 18 anos é considerado ato infracional, deste modo, até os 12 anos a pessoa é considerada como criança (art. 2° do ECA), assim, conforme Liberati (apud ASSIS, 2000, p. 13) “por mais hediondo que seja o ato infracional praticado pela criança, ela não pode ser conduzida à Delegacia de Polícia”, pois, a competência para investigar estes “atos” é do Conselho Tutelar, ela também está impedida de ser apreendida, e, pode somente ser conduzida pela autoridade policial. As medidas possíveis de serem aplicadas pelo Conselho Tutelar encontram-se expressas no art. 101 do Estatuto.
Convém destacar que o ato infracional, possui natureza pública incondicionada, fato este que obriga o agente policial a lavrar o boletim de ocorrência circunstanciado, quando não for caso de prisão em flagrante, e dirigir o meliante ao Conselho Tutelar ou à Delegacia de Polícia nos casos de maiores de 12 anos, posto que, estes são isentos de responsabilidade penal, cabendo-lhes apenas medidas protetivas, indiferente do delito que tenham cometido. Acrescenta-se o fato de que o art. 178 do ECA proíbe o transporte de criança ou adolescente em camburão, devendo ser transportadas nas viaturas policiais da espécie de carro de passeio. O art. 112 traz as medidas que podem ser aplicadas aos adolescentes infratores:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições. (Grifos da Autora).

No Título V, Capítulo I deste Manuscrito de Leis se expressa às atribuições do Conselho Tutelar, que conforme o art. 131 compreende um “órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei”, envolve uma atividade sui generis, onde seus membros são escolhidos facultativamente no município, que exercem o mandato por 03 anos, e, conforme o art. 137, suas decisões somente poderão ser revistas pelo judiciário, este órgão é mantido pelo Município (art. 134 do ECA), os conselheiros são dotados de autoridade municipal (art. 136 do ECA), conforme comentários efetuados por Assis (2000, p. 72/79).
Conforme visto, o sistema jurídico designou a responsabilização do menor de 18 anos à Lei especial (ECA), a qual propõe a sujeição do menor às medidas de assistência, proteção e vigilância, diante disso, constata-se que, no instante em que um adulto (maior de 18 anos) comete um crime, o mesmo será responsabilizado nos termos da lei penal vigente, já o menor de 18 anos é sancionado através do ECA, fora do sistema penal, por serem considerados inimputáveis penalmente e por isto, não são considerados reincidentes ao completar os 18 anos, visto que, não cometem crimes, mas, atos infracionais, não importando a natureza delitiva, ou a quantidade de delitos que tenham cometido antes dos 18 anos, aqui está à maior problemática enfrentada na atualidade, no que tange ao assunto.

3.2  O Adolescente Infrator e sua Comoção Social
O Capitalismo exacerbado e o consumismo imoderado estão levando a maioria da população à miséria, urgindo a necessidade de elaborar ações de combate à pobreza, posto que a mesma não compreende algo natural e nato, mas algo que foi criado devido à procura de riqueza a qualquer custo, em virtude do aproveitamento que os grandes empresários tiveram sobre a classe operária, destituindo-os de todo o direito que puderam, abandonando-os a morte iminente pela fome. Destaca Telles (apud D’AGOSTINI, 2003, p. 47) que a maior problemática não é a falta de recursos financeiros, mas a falta de ética, de espírito de solidariedade e de humanidade, afinal, “a desigualdade é o resultado da aplicação do neoliberalismo nos países, que vem aumentando o desemprego, pobreza/miserabilidade, instabilidade social, econômica e política”. A indústria sofreu um grande avanço no que concerne aos meios de produção e tecnológicos, porém, a melhoria da qualidade de vida não acompanhou esta evolução, caindo em exclusão social, pois, “entre avanços e retrocessos” o que impera é a exploração, sendo urgente a reformulação de políticas públicas inclusivas.
De todo o exposto, surge o problema da violência. Quanto a isso, Adorno (apud D’AGOSTINI, 2003, p. 48), divide a população em dois conjuntos, o primeiro compõe aqueles que acreditam que a sociedade é dividida entre criminosos e homens de bem, momento em que reclamam por uma profilaxia moral, legalizam punições exemplares, inclusive a eliminação física de criminosos, aceitando o uso da violência por meio da polícia, o uso de torturas, pena de morte, e etc. O segundo pressupõe a desorganização social, visto que procura demonstrar os delituosos como vítimas da sociedade, devido as suas carências sociais que relacionam ao modelo econômico vigente, produtor de desequilíbrios e injustiças. Ocorre que “este conjunto supõe que os agentes da criminalidade advêm das classes populares”, constroem um “padrão, um tipo social como negros e pobres. Esses já seriam tipos suspeitos, alvo de olhares desconfiados e medrosos, de um olhar mais atento da sociedade, da polícia e da justiça” como destaca D’Agostini (2003, p. 49).
Alguns estudiosos acreditam que a solução da criminalidade consiste em endurecer a polícia, ideia errônea, pois a sociedade precisa, simplesmente, de justiça social, sendo mister, buscar a efetivação da justiça através da ação policial humanitária e democrática, onde o policial tenha consciência de seu trabalho e passe a relacionar-se de maneira diferenciada com o cidadão.  Além de que, não é possível afirmar que a injustiça, a pobreza ou a desigualdade sejam estopins da criminalidade, visto que esta se encontra no Judiciário, no Congresso Nacional, no Ministério Público Federal, no mercado financeiro, nas grandes empresas e etc., nestas entidades existem os crimes econômicos, que por sua extensão depreendem-se como maior originador da pobreza e miserabilidade de todo o país.
Assim, Koerner (apud D’AGOSTINI, 2003, p. 50) destaca que, “não se pode separar o menino desolado e agredido do burocrata ou ministro que sustentam favores, traficam influências ou cultivam a incompetência”, neste enfoque, a criminalidade não possui um padrão, apenas ocorre maior número de denúncias em famílias de classes humildes, o que passa a ideia de maior incidência de criminalidade neste âmbito, mas, nem sempre esta ideia condiz com a realidade, o problema, centra-se no fato de que “estamos com nossas penitenciárias lotadas de pobres e vazias de ricos, quando deveriam estar lotadas de culpados, sejam pobres ou ricos”, como enfatiza D’Agostini (2003, p. 60). Enfatiza Foucault (2015, p. 67) que, “seria hipocrisia ou ingenuidade acreditar que a Lei é feita para todo mundo e em nome de todos. É mais prudente reconhecer que ela é feita para alguns e se aplica a outros; que, em princípio, ela obriga a todos os cidadãos, mas se dirige principalmente às classes” mais pobres.
Logo, o critério de pobreza, isolado, não compreende fator padrão para a prática de atos delituosos. No entanto, conforme Beatto (apud D’AGOSTINI, 2003, p. 50), o tráfico de drogas compreende um fator motivador de outros tipos delitivos, não importando o nível econômico do autor, encontrando-se em maior grau na faixa etária da adolescência, é por isto que as políticas públicas devem voltar-se para a juventude, extirpando a raiz do problema que é o tráfico de drogas e armas, visto que é o principal meio de recrutamento de jovens a criminalidade.
Existem, também, os viciados que entram no crime para promover o sustento do vício, iniciando os delitos no seio familiar, partindo para o vizinho, findando no assalto a mão armada, pondo em risco toda a sociedade. Coadunado a isto, há o efeito midiático aplicado ao consumidor, que transmite a ideia de necessidade por compras compulsivas, fazendo com que a pessoa gaste além de seus ganhos, até mesmo través de financiamentos ou parcelas, ocasionando uma ideia de miserabilidade aos que não podem acompanhar os avanços tecnológicos existentes, deteriorando a imagem positiva de si mesmo, depreciando-o, através de uma sensação de impotência e menosprezo.
Em conjunto das condições desumanas que muitas famílias se encontram, este sentimento se transforma, deteriorando as relações familiares e sociais, distorcendo a imagem de si mesmo e dos valores sociais, como por exemplo, de respeito à lei ou ao próximo, fazendo com que a vontade de consumir seja maior que a necessidade. Posto que, a criança desenvolve sua personalidade até entorno dos 03 anos de vida, e nascendo em uma família distorcida, e desregrada da Lei ela encerra por compreender “um objeto de descarrego das frustrações e humilhações dos pais através de vários tipos de maus-tratos (como negligência, abandono, abusos físicos, sexuais ou psicológicos), que imagem de si e dos outros ela vai registrar em sua cabeça”? Como será a personalidade desta criança? Que valores assimilará?
Um indivíduo que tenha vivenciado este tipo de prática e internalizado estas vivencias e sentimentos, será detentor de impulsos negativos através das mais variadas demonstrações de violência, e conforme estudo efetuado, dificilmente, será possível resgatar esta criança deste ambiente que pulsa dentro dela, envenenando-a contra o restante do mundo, como ensina D’Agostini (2003, p. 55).  Desta forma, as sociedades, através da família, fabricam o delinquente em escala industrial, ou seja, de vítimas passam a vitimadores, ademais, não é apenas a carência material que motiva o cometimento do ato ilícito, mas, também, as carências de sentimentos e humanismo, portanto, de que maneira o Estado ou a Polícia Militar poderá atuar para suprir esta demanda? O mundo produz tecnologia em escala inumerável, porém, carece de humanismo e solidariedade.
No que reporta a lei, não falta respaldo protetivo, porém, quanto à materialidade, nada do que se lê se vê em prática, visto que, quando existem programas benéficos, faltam técnicos para desempenhar o trabalho e quando há técnicos, não há especialização na diversidade de problemas verificados, além do que, as políticas públicas são fragmentadas e isoladas, portanto, incapazes de suprir com a demanda existente. Igualmente, um dado alarmante com relação ao consumo de drogas e substâncias entorpecentes é que o Brasil, conforme relatório da ONU se tornou o maior distribuidor de cocaína no mundo, destacando a existência de aproximadamente 3,3 milhões de usuários em todo o país.
Outro problema assustador é que o número de Novas Substâncias Psicoativas (NSP), vendidas legalmente como ‘euforizantes’, nos últimos dois anos aumentou em 50%, compreendendo em torno de 234 substâncias e conforme a ONU estes conteúdos podem ser mais perigosos que as drogas usuais. Segundo o que foi dito, o avanço humanístico não alcança o progresso tecnológico, instante em que as políticas públicas tornam-se ineficazes, devido sua lentidão na prevenção e contenção. Constata-se que o sistema penal brasileiro é arcaico e incapaz de ressocializar o adolescente infrator, ou de impedir que o mesmo adentre no mundo criminal, ficando este encargo para a Polícia Militar através dos programas educacionais e de outras medidas públicas. Porém, em outros países, como os EUA, existem os denominados, Tribunais de Menores, cujos quais, são especializados nos direitos e deveres das crianças e adolescentes, que conforme Del Neto (2011, p. 603):

Há, nos Tribunais, assistentes técnicos, trabalhadores sociais (‘social workers’) especialistas no assunto e que são formados em cursos especiais, onde se estudam principalmente ciências sociais e psicologia, do ponto de vista prático. Esses trabalhadores sociais, visitam os menores, transgressores da lei, estudando-lhes a situação social, econômica e familiar. Após determinado prazo, apresentando um relatório, que é lido numa audiência especial do Juiz dos Menores, a que comparece alguém da família do menor. Este é ouvido pelo Juiz, que com os elementos agrupados, toma as medidas aconselháveis ao caso, para o bem do menor. Conforme a gravidade do caso, o menor é posto sob os cuidados dos pais ou noutro lar onde um casal se encarrega da educação dele, mediante uma remuneração do governo. Em outros casos, poderá o Juiz entregar o menor a uma organização mantida pelas igrejas, a qual se encarrega da orientação e fiscalização do menor, ou de colocá-lo em lugar apropriado à sua educação. Para esse encargo, recebem essas instituições religiosas remuneração do governo.

Labutam nestes tribunais, médicos e psiquiatras, que auxiliam o Juiz, diagnosticando as mazelas dos menores e o adequado tratamento, conforme o grau e necessidade de intervenção, contando com o apoio da sociedade, que, ajuda efetuando conferências sobre os problemas dos adolescentes e crianças, promovendo elaboração de leis e divulgando princípios orientadores protetivos que venham a sustentar a prevenção da criminalidade nesta faixa etária, como denota Del Neto (2011, p. 604), apenas em última instância o jovem é enviado a um reformatório, cujo qual, é confortável e oferece educação para orientação dos jovens, muitas vezes, até mesmo curso universitário. Somente no crime de homicídio o jovem é julgado da mesma forma que os adultos, pelo júri popular, instante em que pode ser submetido à pena da cadeira elétrica. Na busca da ressocialização destes adolescentes os Tribunais de Menores investem em recursos com assistentes técnicos, médicos, psiquiatras, recebendo auxílio econômico de outras instituições como as religiosas, as escolas e a polícia. 
Estes Tribunais compreendem instituições de defesa dos direitos infanto-juvenis, verdadeiras clínicas psicológicas, que buscam não apenas o diagnóstico, mas a cura das deformidades mentais do público juvenil. Conforme dito, o Brasil encontra-se desatualizado no que tange ao sistema criminal, a título de exemplo, a autora analisou o caso do Estado de Santa Catarina, onde existe o CASEP (Centro de Atendimento Socioeducativo Provisório), que compreende um centro de internação provisória subordinado pelo Governo Estadual, no caso do município de Chapecó, um dos maiores da região, o CASEP possui 10 vagas masculinas, (pessoas do sexo feminino são transferidas para Florianópolis), no entanto, atualmente detém 19 jovens, ou seja, quase o dobro de sua capacidade, ademais neste ambiente, este grupo de adolescentes não possui fornecimento de educação, e, conta somente com o atendimento de psicólogo e de assistente social.
O CASEP compreende um ambiente pequeno e insalubre, onde o jovem deveria passar 45 dias até que saísse sua sentença e fosse transferido para o CASE (Centro de Atendimento Socioeducativo) que compreende medida privativa de liberdade, “sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”, sem prazo determinado, onde o jovem é reavaliado a cada seis meses, para verificar sua capacidade de reinserção social, porém o período de internação não excede três anos, conforme diretrizes do ECA, atingindo este limite temporal o menor será colocado em semiliberdade ou liberdade assistida, “as unidades CERs são constituídas de Gerência, Equipe Técnica, Equipe de Monitores e Equipe de Apoio Administrativo e operacional”.
Porém, a nova unidade de internação do Município de Chapecó está em construção, enquanto a antiga foi demolida, e visava abrigar o CASEP no mesmo prédio, onde o CASE teria 30 vagas e o CASEP 10, no entanto, devido à demanda, verificou-se que as 40 vagas que estão em construção serão apenas para o CASE, posto que a taxa de reincidência é muito alta, e o judiciário está tendo que aplicar outras medidas sancionais por falta de espaço para abrigar os menores, segundo a psicóloga e a assistente social, a capacidade de recuperação é praticamente nula, “são jovens que sabem o que fazem”, tanto que suas infrações são estratégicas. A lei que antes pecava pela falta de proteção, atualmente, peca pelo excesso, o que evidencia o entendimento de De Souza (2011, p. 678/679) de que, “não se muda a sociedade por decreto”, ademais, entre o que a lei pretende e o que materializa, “existe um fosso, uma vala tão profunda quanto aquela que separa a Lei das Execuções Penais da realidade mortificante do sistema carcerário brasileiro”, pois vários dos dispositivos legais brasileiros “não passam de um compromisso de boas intenções”, é palpável o confronto que paira entre a norma e a realidade, ademais é certo que a realidade possui luz própria e que os fatos nem sempre se ordenam de acordo com a norma.

3.3  (Im)possibilidade de redução da Maioridade Penal?
Diante deste resultado criminalístico, principalmente, por parte dos adolescentes é que a proposta da redução da maioridade penal tomou forma e força no Plenário da Câmara dos Deputados, tencionando reduzir a maioridade dos 18 para os 16 anos no que reporta aos crimes hediondos, homicídio e roubo qualificado. Conforme a PEC 171/93, o jovem também poderá responder penalmente nos crimes de lesão corporal grave ou lesão corporal grave seguida de morte, porém, a pena será cumprida em estabelecimento diverso do adulto, em similaridade ao Tribunal dos Menores existente nos EUA.
O resultado da votação da comissão especial foi de 21 votos a favor e 06 contra a redução, porém, a população brasileira a nível nacional contempla o percentual de 87% de votos a favor da redução, conforme pesquisa efetuada pela Câmara de Justiça, todavia, ao percorrer as ruas de Chapecó/SC, um programa de TV local, Cidadão no Comando[1] (apresentado por Jhota Biavatti) evidenciou que 99,9% das pessoas são adeptas à redução, ou seja, estes números formados por cidadãos exigem modificações contundentes e clamam por transformação social, pois se encontram cansados de serem vítimas dos adolescentes infratores, que devido à benevolência da Lei, acham-se sem limites. Por seguimento, em um Estado onde a soberania[2] se assenta na força e na vontade popular é imperativo que a opinião popular tenha validade e efeito sobre os parlamentares, pois são estes os maiores prejudicados com as ilicitudes.
Nada obstante, a opinião dos estudiosos se diverge, devido à ineficácia do sistema carcerário que não possui capacidade de ressocialização, no entanto, é inconcebível que a sociedade pague pela incapacidade do Estado. A aptidão de ressociabilização dos presídios compreende um seguimento diverso da redução da maioridade penal, posto que o jovem até completar os dezoito anos seria colocado em departamento diferenciado do adulto. Esta falta de competência socializadora presidiária precisa de medidas urgentes, necessita buscar resultados de melhorias, sob pena de retroagir, posto que o crime apenas tem avançado,  sobrecarregando o trabalho policial, enquanto o sistema penal parece ter parado no tempo e com ele ficou o sistema carcerário, inerte e incapaz. Corrobora a isto o fato de que se o sistema prisional não ressocializa, os dados claramente demonstram que as instituições que acolhem os menores infratores também não.
Consoante a isto, verifica-se o fato de que um jovem de 16 anos possui completa capacidade e discernimento de eleger seus governantes através do voto, conforme os preceitos da Carta Política (Art. 14, § 1°, alínea c), o que denota um contrassenso que este mesmo jovem não possa responder plenamente pelos seus atos ilicitamente praticados. O direito infanto-juvenil, conforme coloca Sposato (2011, p. 662/663), se sobrecarregou de princípios protetivos abraçado na doutrina da proteção integral, no entanto, convém ressaltar que o sistema jurídico é uno, isto é, engloba um sistema de regras que para sua completa fruição precisa ser visto em sua completude e não somente sob o olhar protetivo, pois não há direito que não contemple um dever.
Consoante a isto, reza o art. 5°, caput da Carta Magna que “todos são iguais perante a lei”, portanto, havendo esta diferenciação quanto à imputabilidade, o legislador está pondo uma exceção à soberania constitucional, e este artigo trata-se de cláusula pétrea (art. 60 da CF), portanto, não pode ser afrontado, além de que, a busca que se faz é por justiça, objetivo fundamental da República Federativa do Brasil (Art. 3º, inc. I), e esta justiça somente se efetiva se a sanção imposta ao criminoso for compatível com a gravidade do crime que tenha cometido. É sabido que pelas normas do ECA, um menor nunca será considerado reincidente, até completar os 18 anos, e é esta salvaguarda que o impulsiona a cometer os mais atrozes crimes, cobertos pelo véu da impunidade, não há como desejar que um jovem reincidente em diversos tipos delitivos, venha a ressocializar-se, simplesmente, por atingir os 18 anos. Além de que, um grande problema enfrentado pela segurança pública é que os adolescentes estão assumindo toda a culpa delitiva dos tipos penais em que são pegos em flagrante como meio de proteger o adulto que esteja compactuando no crime, aumentando a impunidade da lei.
Conforme destaca Dowdney (2002, p. 94), os adolescentes, devido à condição que a lei lhes condiciona, estão sendo usados para o cometimento de toda espécie de crimes, principalmente os de maior gravidade, como o exemplo do tráfico de drogas, no qual seu envolvimento se caracteriza como um emprego, pois estabelecem hierarquias no desempenho de suas funções e recebem valores pecuniários em troca do labor desempenhado, que compreende a atividade de olheiro, posição mais baixa, que trabalha avisando sobre a chegada da polícia, depois tem o vapor, que trabalha vendendo drogas, após tem o gerente da boca, que gerencia o local, e tem, também, o soldado que atuam fortemente armado na proteção da boca, por fim há o fiel que labuta armado, protegendo diretamente o gerente geral.
Nestas facções, as crianças não possuem idade para iniciar o “trabalho” de traficar, e seu “emprego” é dado conforme o grau de discernimento individual, “labutam” com armas dos mais diferenciados calibres, glorificam os traficantes, considerando-os como ídolos por desafiar o mundo e a polícia, demonstrando poder, a idade média para entrar no tráfico é de 13 anos, e dura até entorno dos 23 anos, momento em que são mortos pelos inimigos ou pela polícia, porém, apesar dos riscos é considerada uma atividade lucrativa.

O recrutamento para o trabalho com as facções é voluntário que começa muito cedo entre as crianças acostumadas há passar o tempo junto de traficantes em suas comunidades, que pretendem ficar em sua companhia e solicitam, em seguida, permissão para ingressar na boca do fumo. Assim, aprendem a profissão durante o serviço, através do processo chamado “formação” (Dowdney, 2003, p. 100/101).

Para estes adolescentes o crime é um processo sem volta, denota Manso (2003, p. 64) e o assassinato é para estes jovens, motivo de orgulho, contam com vaidade terem assassinado uma média de 50 pessoas, as consequências provenientes do cometimento do crime apenas encerram-se com sua morte, pois um delito desencadeia outro, e por fim, nem sabem mais o motivo de estarem matando. O crime evoluiu e o sistema penal ficou para trás. A ordem pública é o fundamento da sociedade, e para a mesma ser efetivada é imprescindível que a lei seja concretizada. Convém salientar que não se pretende abolir a proteção dos adolescentes, mas somente diminuir a maioridade penal e aplicar políticas públicas de cunho ressocializador aos mesmos, porém, com justiça, pois frente a crimes tão grotescos, não há como abandoná-los à impunidade de uma simples medida socioeducativa é preciso julgar em conformidade com a gravidade do delito cometido, não é compreensível que um assassino complete 18 anos e seja considerado réu primário, sendo considerado na mesma medida que os demais cidadãos que nunca delinquiram.
Conforme Vieira Neto (2011, p. 697) “a criança não é propriedade dos pais. Nem de ninguém”, portanto, não é impossível que a mesma, podendo escolher o representante de seu País, venha a ser considerada com discernimento suficiente para responder por seus atos penais. Ademais, um conjunto de leis não possuirá força coercitiva suficiente, se suas expressões não encontrarem-se “previamente moldadas no espírito dos cidadãos. Sem esse suporte moral a própria força de um Estado torna-se seu perigo inerente”, nas palavras de Garcia (2011, p. 723), ou seja, toda lei precisa estar consoante com a vontade do povo, para o qual ela é dirigida. Emerge do ordenamento jurídico, um estado de anomia, que, de acordo com Garcia (2011, p. 731) consiste em “uma condição social em que as normas reguladoras do comportamento das pessoas perderam a validade”, neste sentido, segundo Robles (apud GARCIA, 2011, p. 732), “o homem é a sociedade”, assim, “o sentimento do dever é o sentimento básico dentro do grupo. A vida deste depende da fortaleza daquele”.
A sociedade para existir precisa equilibrar “o sentimento de dever e o sentimento de direitos”. Nota-se a falta de correspondência entre a gravidade do crime e a pena efetivamente cumprida. Consoante com o autor (2011, p. 735) é múltipla as causas apontadas pelos especialistas para a extensão da criminalidade infanto-juvenil (pessoal, familiar, social, política), mas o autor enfatiza a necessidade de um sistema coercitivo eficaz, para ele, a complacência e a impunidade andam de mãos dadas, a primeira trás a sociedade em seu conjunto e a segunda trás o Estado, sustentando a passividade e a omissão frente à ausência de um sistema coercitivo efetivo. É preciso que a pesquisa científica e a ação policial andem pelo mesmo caminho, construindo uma aliança. Para Alba Zaluar (apud GARCIA, 2011, p. 736):

[...] A taxa de impunidade atinge níveis inaceitáveis. A desova de corpos, as testemunhas que não falam com medo dos grupos de traficantes ou de exterminadores, a precariedade do material técnico que dispõe a polícia e a parca determinação em descobrir os autores (até as vítimas) conspiram para que a taxa de impunidade nos municípios continue altíssima.

Os adolescentes encontram-se “sem regras e sem valores”, pois, em todos os níveis sociais o grau de violência é idêntico, desta maneira, através da opressão e da corrupção o Estado está sucumbindo, rendendo-se à criminalidade, soltando seu último suspiro ao socorrer-se com a polícia, porém, falta dar efetividade ao sistema penal e carcerário, falta o Estado municiar, letalmente, suas armas de combate ao crime, aniquilando a violência em sua raiz, por meio da educação e do resgate de valores, por exemplo.
Sob a alegação da dignidade da pessoa humana (Art. 1, III da CF/88) alguns estudiosos defendem a impossibilidade de reduzir a maioridade penal, aliançados no discurso dos direitos humanos, porém, uma criança que sobrevive do crime possui que espécie de dignidade? Um adolescente que mata um pai de família por dinheiro possui qual dignidade? São questões que suscitam o raciocínio e que demandam reflexões sociais. O que se percebe, como destaca Ascher (apud GARCIA, 2011, p. 739), é que “negar o direito e a capacidade de assumirem a consequência do que façam, desumaniza inclusive os criminosos”. Portanto, através do discurso de proteção, o Estado, a sociedade e o núcleo familiar estão perdendo seus jovens para o apaixonável mundo do crime, onde tudo é fácil, menos desvincular-se dele.
Para Alexy (2015, p. 46) para uma norma ter aplicação ela precisa de fundamento e conveniência, no fundamento encontra-se a validade da norma e na aplicação verifica-se a conveniência, assim, como o mundo se transforma, o Direito não pode ficar inerte e necessita acompanhar as mudanças sociais para suprir suas indigências, desta maneira, destaca o autor (2015, p. 53) que novas situações fáticas de aplicação da norma, levam à necessidade de ‘alteração, modificação e revisão’ de seu conteúdo semântico, o que significa dizer que a lei não é estática. Na proporção de Alexy (2009, p. 4) o Direito não coincide com a totalidade das leis escritas, pois ele é feito de princípios, também, e, nem sempre o que está escrito possui validade, muitas vezes não passa de letra morta, assim Direito é o que está de acordo com o ordenamento jurídico pátrio, possui eficácia social e é capaz de produzir correção material (2009, p. 15).
Para isto uma norma deve ser respeitada em seus dois aspectos, no que se refere ao seu aspecto externo (2009, p. 18/19) ela precisa ser observada pela sociedade através da sanção, atuando por meio da coação, forçando o seu respeito pelo sujeito. Quanto ao aspecto interno ela precisa possuir motivação, ou seja, deve ser respeitada pelo povo por ser norma e não pela sanção que possui, isto é, precisa ser reconhecida como norma pela sociedade. Na medida em que a criminalidade está aumentando, é fácil constatar que as normas não estão sendo eficazes, mister se faz destacar que não é somente através da lei que a sociedade irá se transformar, porém é um caminho, além de que, é preciso políticas públicas, ações de todos os envolvidos (sociedade, Estado, família) objetivando o resgate destes jovens do crime e sua reinserção na sociedade e no respeito pelo que é legitimo. No passo de Costa (apud GARCIA, 2011, p. 740):

Em sua essência a pena é retributiva. Puniturquia peccatum. Pune-se porque se pecou, porque se delinquiu. A grande função da pena é a função intimidativa. Como intimidar, entretanto, aqueles que não são atingidos pela ameaça, como os menores de 18 anos? Acham-se eles, alheios ao comando legal. Por isso, quando em um grupo de delinquentes dele faz parte um menor, atribuem indefectivelmente a ele o delito, já que sua pena não irá superar três anos de duração.
Para que a pena exerça sua verdadeira função de intimidar, necessário que o agente do crime fosse por ela atingido, pela ameaça psicológica da norma.

Para Garcia (2011, p. 741), quando o legislador peca no direito penal, é possível utilizar a cláusula da ‘proibição da proteção deficiente’, isto ocorre no instante em que o legislador atribui penalidades e meios de cumprimento de penas “insuficientes para a satisfação da dignidade das vítimas e do respeito aos seus direitos humanos”, compreende um critério basilar na determinação dos direitos fundamentais, que cuja aplicação ocasionará, através do Estado, uma omissão ou antonomásia, violando um direito de proteção. Este excesso de proteção propicia, na legislação vigente, uma quantidade imensurável de facínoras impuníveis, que mesmo possuindo pleno discernimento não respondem por seus atos.
Ocorre que o direito penal compreende a ultima ratio, não podendo atuar se houver outros meios, porém, o descrédito da sociedade com relação ao sistema criminal, urge pela busca de “reconhecimento dos indivíduos como pertencentes a uma comunidade de direito. O direito penal também tem esta função de, mediante a proteção de determinados bens jurídicos, gerar esse sentimento de reconhecimento”. O direito de um adolescente que assassina, por exemplo, não é maior que o direito do adolescente que foi assassinado, ou perdeu um ente familiar, nas mãos deste jovem.
Por defluência, a autora efetuou uma entrevista aos trabalhadores do CASEP de Chapecó/SC, como antes expresso, e aos jovens que estavam ali cerceados, instante em que todos os labutadores que convivem diariamente com estes jovens colocaram-se a favor da redução da maioridade penal, alegando que os mesmos possuem completo discernimento e capacidade de premeditação admirável, o que demonstra que adotar, simplesmente, o critério biológico (de idade) para avaliar suas condições de imputabilidade, é uma forma de permissão e omissão ao crime, posto que, estes detentos agem como seres humanos detentores de direitos, no entanto, não compreendem que devem oferecer uma contraprestação por este direito, que inclui o cumprimento de seus deveres cívicos, isto é, agem com egoísmo como se as leis existissem apenas para os outros.
Os funcionários deste estabelecimento sentem a necessidade de reconhecimento por seu trabalho, pois se sentem inseguros em desempenhá-los, já que estes jovens não compreendem e não reagem bem com relação à palavra “não”, que constantemente, os agentes e demais trabalhadores precisam proferir a eles, sendo, então, alvos de coações psicológicas, e como os demais agentes ligados a área da segurança pública, clamam por reconhecimento. Estes adolescentes não se encontram apenas em conflito com a lei, mas com as regras sociais e consigo mesmo, poucos realmente demonstram vontade de mudar, mas devido à falta de ações implantadas pelo Estado, encontram dificuldade em materializar esta mudança, falta o sentimento de valor neste adolescente e com isso a atitude de limitar-se. Para os trabalhadores do CASEP falta estrutura para auxiliar estes jovens na ressocialização, falta um local para eles desenvolverem atividades trabalhistas, faltam cursos profissionalizantes, enfim, carece de engajamento do Estado em todos os sentidos.
Esta ausência de limites e valores ficou nítida através da entrevista feita aos adolescentes que responderam as perguntas, inicialmente, falando de sonhos e da vontade de mudar, mas terminam destacando o desejo de “matar policiais”, exclamaram possuir aversão pela polícia, muitos imotivadamente e outros alegaram truculência por parte da polícia e uso desnecessário da força física. De forma geral, eles reivindicaram atividades de educação e mais tempo para visitas, se colocaram contra a redução da maioridade penal, reclamaram da dificuldade de encontrar trabalho depois que saem dali, demonstraram revolta e alegaram que devido aos julgamentos sociais eles sofrem exclusão.
Um cerceado alegou que adentrou no crime por falta de dinheiro, e por encontrar uma forma fácil de auferir ganhos, continuou reiteradamente, até estar ali pela segunda vez. Outra pessoa alegou que o crime não iria ter fim, pois é cometido como meio de sobrevivência, porém relatou que, como ele sairia do estabelecimento por completar a maioridade, não pretendia mais cometer crime para não ir para o presídio. É notável que falta educação para estes jovens, políticas públicas de inclusão social, um meio de ampliar a visão dos mesmos quanto ao meio em que vivem e ao seu futuro, oportunidade de trabalho, e carecem de capacidade de inserção social e legal, pois pelas respostas obtidas, eles aparentaram alienação quanto à necessidade de legitimar suas ações e de respeitar ao próximo. É devido as respostas auferidas na entrevista que remete a autora a acreditar que a redução da maioridade penal, ao menos traria justiça social, afinal, pelo que foi possível perceber para eles matar um policial, ou um pai de família consiste em algo simples, em outro viés, imagine como um policial é visto caso ceife a vida de um jovem deliquente. Não foram utilizados nomes na entrevista, pois ninguém quis se identificar.

3.4  A Violência no Contexto da Atividade Policial Militar
Inserida dentro do contexto da segurança pública, a Polícia Militar exerce uma função extremamente importante no combate à criminalidade em todos os matizes. Convém salientar que a atividade militar atua frente a frente com a criminalidade, trabalha exposta a todo o tipo de agressão, tanto física quanto psicológica, e padece de ser considerada como uma atividade desenvolvida por seres humanos, pois seus trabalhadores são vistos como meros agentes da Lei, uniformizados com as vestes da corporação, um colete balístico e municiados como braço forte do Estado, como se fossem destituídos de face e coração.
Ao contrário do que realmente ocorre, visto que estas pessoas, diuturnamente abandonam o aconchego de seus lares e a segurança de suas famílias para desempenharem suas funções, tendo que adentrar nos lugares mais assustadores e perigosos, padecendo e perdendo suas vidas em serviço, vendo seus amigos morrerem no exercício de suas funções, e colocando em risco a vida de seus familiares devido ao teor de suas atividades profissionais, tendo que, muitas vezes, ceifarem vidas criminosas para defenderem as suas, expostos a todo o tipo de agressão, em um trabalho de risco iminente e de desvalorização social.
Nada mais importante que efetuar uma entrevista a estes labutadores, como meio de extrair suas experiências e sentimentos com relação ao trabalho, assim, a autora procedeu com uma entrevista aos policiais pertencentes à 4ª Cia de PM do Município de Xanxerê/SC, comandada pelo Capitão de PM Ademir Barcarrolo, pertencente ao 2° BPM/Chapecó/Fron, que por sua vez faz parte da 4ª Região de Polícia Militar de Santa Catarina (a qual abrange os Batalhões de Chapecó e Concórdia), aos comandos do Coronel Edivar Antonio Bedin.

Fonte: 2° BPM/Chapecó/Fron. Coronel Paulo Henrique Hemm saudando o Coronel da 4ª RPM Edivar Antonio Bedin.

Por meio da entrevista, foi possível extrair um sentimento de crescente desvalorização e descrédito principalmente por parte da sociedade, mas acima de tudo, um sentimento de honra e amor pelo desempenho deste serviço essencial a vida em sociedade.
Ao indagar-lhes sobre algo que lhes fosse memorável, a maioria citou situações de óbitos (roubos onde os criminosos matavam pais e filhos), trocas de tiros entre a viatura e os delinquentes, enfim, situações extremas, o que denota a urgência por valorização tanto por parte da instituição, quanto por parte da população, devido ao impacto que a atividade ocasiona aos policiais, que mesmo no uso da farda, não deixam de serem seres humanos, carecedores de apoio e incentivo e merecedores de aplausos por todo o esforço que sua atividade demanda.

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Fonte: Sítio do 2° BPM/Chapecó/Fron/SC. Imagem da 4ª Cia de PM de Xanxerê. Comandante Capitão Ademir Barcarollo.

No entanto, todas as respostas consideraram a atividade como gratificante devido à importância crucial de seus serviços para o bem de todos, destacando que se sentem felizes ao desempenhá-la, recordaram atividades heróicas como o caso de um policial que auxiliou no parto de uma cidadã dentro da viatura, ou no caso de salvamento de vítimas. Destacaram também, a necessidade de o Estado atuar mais através de políticas públicas auxiliares no combate a violência e salientaram a falta de estrutura e preparo do policial no que reporta ao seu agir com o público, ou seja, priorizaram pela valorização e incentivo profissional, pois, uma linha de necessidade complementa a outra. Ademais no que cabe ao 2° Batalhão de Polícia Militar de Chapecó/Fron/SC, convém destacar que o mesmo abrange uma área de 41 municípios, conforme demonstra o quadro a seguir:

LEGENDA DOS 41 MUNICÍPIOS DA 4ª REGIÃO DE POLÍCIA MILITAR SC.
Amarelo 3ª Cia/2° BPM de Chapecó/Fron/SC, compreende 18 municípios; Vermelho 4ª Cia/2º BPM de Xanxerê/SC, compreende 14 municípios; Verde 5ª Cia/2º BPM de S. L. D’Oeste/SC, compreende 09 municípios. Fonte: AI/2° BPM/Fron/Business Inteligence.

Por conseguinte, a população atendida por esta instituição compreende o número de 484.240 habitantes, distribuído em um efetivo de 619 Policiais Militares, ou seja, são aproximadamente 783 cidadãos aos cuidados de cada agente Militar. O Município de sede do 2° Batalhão de PM/Chapecó/Fron compreende a região de Chapecó, que possui uma população de 183.561 habitantes, para um efetivo de 279 PMs, isto é, são aproximadamente 658 habitantes ao desvelo de cada agente da lei. Convém salientar que esta falta de valorização (desvalor social, baixa remuneração, falta de equipamentos adequados e etc.), sofrida pelo profissional militar, está fazendo com que o efetivo decaia, e que a procura por esta área de ação sofra uma significativa baixa, fato problemático, pois a população habitacional apenas aumenta, enquanto o efetivo decai, como se verifica no quadro abaixo:

Fonte: AI/2° BPM/Fron/Business Inteligence.

No entanto, nem mesmo as dificuldades de baixa remuneração, do desvalor social vivenciado pela função militar, da falta de treinamento adequado e principalmente de material de trabalho, como viaturas, armamento e etc., desmotivam os agentes da lei, pois demonstram através dos números que compreendem em efetivo suficiente para conter a criminalidade, esforçando-se ao máximo no desempenho de sua função, porém, o que assusta estes seres humanos, é o número de adolescentes infratores, posto que a cada mês cresce um pouco mais.
De certa forma, este crescimento auxilia na desmotivação dos agentes, pois demonstra que sua ação preventiva não está sendo suficientemente assimilada pela população estudantil, denotando, a necessidade de aprimoramento técnico nesta área, desencadeando em novos planos de ação, posto que, ao efetuar-se uma analise ao quadro abaixo, que se reporta ao ano de 2013, será possível verificar que as infrações cometidas através dos adolescentes se aproximam ao número cometido pelos adultos, fato este inconcebível, frente as mais diversas ações que a corporação militar tem efetivado, bem como pelo fato de que os mesmos serão considerados simplesmente como agentes infratores e ao chegarem na maior idade serão considerados sem antecedentes criminais e estarão limpos para o cometimento dos crimes (que já vinham praticando).

CONDUZIDOS PARA DP-2013
MÊS
MAIORES
MENORES
TOTAL
Janeiro
158
44
202
Fevereiro
140
31
171
Março
159
39
198
Abril
131
51
182
Maio
130
66
196
Junho
92
44
136
Julho
88
44
132
Agosto
88
23
111
Setembro
109
52
161
Outubro
102
50
152
Novembro
113
50
163
Dezembro
119
45
164
Fonte: AI/2° BPM/Fron/Business Inteligence

Estes números desencadeiam na necessidade de criação de novas formas de abordagem e de uma atuação educacional fortificada, e focada na prevenção e recuperação destes jovens, pois ao considerar-se que cada um destes elementos, mais tarde irá constituir família, será possível notar a amplitude da ação, visto que na atualidade estes adolescentes destroem seus lares e a sociedade e posteriormente, ao constituir família irão transmitir seus entendimentos para outras pessoas, originando famílias pretensiosas ao crime e despreparadas para o convívio social. Veja que nos meses de junho, julho, e setembro até dezembro, os números de crimes cometidos pelos adolescentes alcançaram a metade dos cometidos pelos adultos, este índice é inaceitável, frente a todos os programas que a PM tem implantado.
Cabe considerar que o jovem encontra-se em transformação, no ápice da adolescência, que compreende a fase mais impulsiva vivenciada pelo ser humano, instante em que ele sente vontade de provar tudo e de expor-se ao máximo e é neste instante que ele precisa ser contido através da educação, chamando-o ao raciocínio e ao bom convívio. Com relação às ocorrências policiais, convém salientar que as mesmas encontram-se controladas, e tendentes a diminuir ao que se percebe no quadro de ocorrências a seguir expresso:

Quadro de Ocorrências Militares
ANO
2010
2011
2012
2013
2014
2015
FURTO

3174
2941
2284
1686
517
ROUBO

588
500
418
469
468
HOMICÍDIOS EM GERAL
21
47
37
47
57
17
TRÁFICO DE DROGAS
49
95
138
228
295
69
ESTUPRO
-
4
07
16
25
09
APREENSÃO ARMA DE FOGO
-
201
213
184
147
21
LATROCÍNIOS
02
03
03
04
03
01
PORTE DE DROGAS
84
149
198
198
229
94
ENCONTRO DE CADÁVER
-
05
04
17
12
02
PRISÃO DE ADULTO*
-
809
589
997
950
200
PRISÃO DE ADOLESCENTE*
-
34
25
125
52
26
POP. CARCERÁRIA/
PEN AGRÍCOLA (MASC.)
-
3025
2976
-
-
-
POLÍCIAL MORTO (M) /FERIDO (F) EM SERVIÇO
-
08 (F)
01 (M)
0 (F)
0 (M)
01 (F)
0 (M)
0
0
Fonte: Sítio da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Santa Catarina. *Ocorrências da Polícia Civil.

O quadro enfaticamente denota a efetividade da Polícia Militar na contenção criminal, ademais, ao considerarem-se os inúmeros entraves que a instituição enfrenta no seu dia-a-dia, bem como, o desvalor que a população lhe denota, não resta dúvida do quanto à corporação trabalha na busca pela materialização da lei. Nota-se que no ano de 2014 decaiu o registro de furto e roubo e aumentou a apreensão de drogas, ou seja, a PM está agindo e está mostrando efetividade. Ademais, impulsionada por estes números e na procura de contê-los é que o 2° BPM/Chapecó/Fron criou o programa de Prevenção à Violência Escolar, o qual trabalha levando informação e educação para os jovens em idade escolar, visando prevenir os ilícitos. Sobre este programa, a autora irá detalhá-lo com mais nitidez no próximo item.
Igualmente, no que reporta ao 2° Batalhão de Polícia Militar de Chapecó/Fron, constata-se que o mesmo compreende apenas um exemplo da efetividade da ação Militar, cujo trabalho vai além, pois através de suas repartições, se irradia em todos os âmbitos da sociedade e adentra em todas as necessidades dos cidadãos, tanto que a PM compreende a instituição de segurança mais antiga em que se tem conhecimento, sendo considerada fundamental e indissociável do corpo social, por deter a força que edifica e mantém este corpo, dando vida ao mesmo, tanto que a existência da sociedade e a existência da Polícia Militar andam de braços dados.
marcelo.jpg
Fonte: 2° BPM/Chapecó/Fron/SC. Ação aproximativa da PM: Cabo Marcelo Wundervald.
Neste aporte as ações do 2° BPM/Chapecó/Fron não cessam no que concerne à prevenção e repressão criminal, sendo robustecida através do Comandante TC Cosme Manique Barreto, que assumiu a direção deste Batalhão de PM em março de 2015, alicerçando-se através de um espírito conciliador, edificando a harmonia no âmbito da corporação e desenvolvendo o espírito de confiança entre os agentes efetivadores da lei, que somado à implantação do programa “Rede de Segurança”, produziu no município bons frutos, traduzindo-se em excelentes resultados para a sociedade.
Fato este constatável nos índices criminais acima expressos, que demonstraram uma redução significativa, em diversos âmbitos, inclusive os roubos que reduziram 8.2%, se comparados ao ano anterior (2014), já no que tange aos homicídios ou crimes mais marcantes, sofreram uma queda de 59%, isto considerando o resultado de somente seis meses de implantação do programa, conforme segue o gráfico:
ART_928955_2015_08_27_150958_2bpm_15082.jpgFonte: 2° BPM/Chapecó/Fron/SC.
No que tange à apreensão de drogas os resultados também foram expressivos, devido à dedicação de todos os policiais, que contando com o apoio da Agência de Inteligência e do Canil do 2° BPM/Chapecó/Fron, demonstraram no desempenho do trabalho efetividade e eficiência, posto que, em todas as espécies de drogas, a atuação militar aferiu resultados que expressam mais que o dobro das ações antes vistas, como exemplo, foi apreendido 27,1 Kg de maconha no ano de 2015, isto significa mais que o triplo do ano de 2014 (4,7 Kg), salienta-se que a implantação deste programa é recente, o que sugere resultados ainda maiores no transcorrer do tempo, conforme denota o gráfico:
Fonte: 2° BPM/Chapecó/Fron.

Não restando dúvidas quanto à essencialidade da ação militar e da necessidade de apoio e incentivo, principalmente, por parte dos cidadãos, devido ao núcleo da função militar, que atua no pior que a sociedade tem à oferecer: a criminalidade e presta o maior bem que há em um ser humano: o risco da própria vida. É elucidante o fato de que ao atuar repressivamente sobre os ilícitos, esta atividade demanda força psicológica e exige ao menos reconhecimento por suas ações. Além destes resultados é possível imaginar quantos outros crimes foram evitados através da prevenção e da forma de organização que este e outros programas implantaram na instituição da PM, tanto na abrangência do 2° BPM/Chapecó, quanto da 4ª Cia de PM de Xanxerê, ou seja, ações não faltam para que a Polícia Militar cumpra com o papel que a Constituição lhe promulgou: efetivar a segurança pública.

3.5  Ação Policial Militar como Agente de Recuperação do Adolescente Infrator através do programa de Prevenção à Violência Escolar desenvolvido pelo 2° BPM/Chapecó/Fron
Consciente da necessidade de atuar preventivamente foi que o 2° BPM/Chapecó/Fron, criou o programa de Prevenção à Violência Escolar, que objetiva orientar professores, funcionários, pais e alunos das escolas públicas e privadas, no que tange ao combate à violência no âmbito das escolas, contribuindo para uma sociedade mais justa, humana e igualitária, atuando com proximidade ao cidadão, efetivando os preceitos que a Carta Magna impõe ao seu povo.
Em conformidade com o expresso anteriormente, a violência é comum em todas as classes e ambientes sociais, inclusive nas escolas, conforme descrito no projeto, “dentre as variáveis que levam ao aumento da violência na sociedade brasileira estão à desigualdade social, o enfraquecimento de conteúdos culturais, éticos e morais, a família desestruturada, as diferenças culturais, maus tratos e uma ausência de cultura de paz nos sistemas de relações sociais”, por consequência, o programa pretende reatar estes laços, fortalecendo os valores sociais e propiciando a união entre a família, a escola, a sociedade e a PM na prevenção criminal.
Igualmente, diante das ocorrências envolvendo violência escolar, o programa foi criado pretendendo debater o tema da violência escolar na busca por estratégias de prevenção e repressão, pretendendo transmitir orientações procedimentais para os alunos que forem vítimas ou depararem-se com atitudes violentas, visa resgatar o sentimento de valores culturais, morais e éticos voltado ao convívio social, tenciona reavivar junto aos pais o sentimento de responsabilidade familiar no que reporta à formação e educação do adolescente.
Cabe destacar o fato de que o programa inicia fora da escola, por meio da ronda ostensiva, instante em que uma viatura é designada para o cuidado especial de cada escola, não exclusivamente, mas como objetivo primordial, partindo do exterior o programa passa a materializar-se no interior escolar, por meio de palestras ministradas pelo Cabo Marcelo Wundervald, que as efetua fardado, efetivando uma relação de aproximação. O programa tem colhido resultados positivos, pois ao final de cada palestra os jovens efetuam um debate, saciam suas dúvidas e alguns fazem denúncias em sigilo ao policial, que reage conforme a necessidade do caso apresentado.

policiamento ostensivo chapeco.jpg
Fonte: 2° BPM/Fron/Chapecó/SC. PM do 2° BPM/Fron/Chapecó/SC. Rondas ostensivas escolares.

As denúncias mais corriqueiras referem-se ao tráfico de drogas, que ocorre no próprio ambiente escolar, momento em que o adolescente leva a droga na aula e a repassa (vendendo) aos demais. Na palestra o agente da lei efetua reflexões para os jovens, destacando que a vida é feita de escolhas e é a pessoa quem guia seu caminho, guiando-se para a prisão, ou para o bom convívio social através do respeito pela lei e pela ordem. Conforme o projeto, o programa se justifica:

Na busca de alternativas que venham a contribuir para minimizar o quadro de violências nas escolas, é de fundamental importância orientar profissionais da área da educação sobre ações que possam ser adotadas a fim de aumentar a segurança nas escolas. Da mesma forma, levar aos alunos e pais a discussão sobre a importância de reavaliar condutas, orientando sobre questões relacionadas à cidadania e ao convívio harmônico, as conseqüências das práticas de delitos e suas respectivas punições, além da necessidade de se refletir sobre o assunto.
Oportunizar informações aos alunos, que são os protagonistas desses quadros, esclarecendo a importância de sua participação efetiva na construção e fortalecimento de uma sociedade mais humana, bem como, instigá-los a participar de discussões, elaborando sugestões para a efetiva implantação da segurança na escola.

Conforme os dados conseguidos com o Cabo Marcelo Wundervald, desde setembro de 2011, foram atendidas 61 escolas, proferidas 229 palestras, alcançando o total de 24.993 alunos.

Fonte: 2° BPM/Chapecó/Fron/SC. Gráfico que retrata a efetividade do Programa Prevenção à Violência Escolar no ano de 2015.

Foi feito uma entrevista aos alunos participantes da palestra, os quais elogiaram a ação do policial e afirmaram sentirem-se mais seguros pelo fato da PM estar presente nos corredores escolares. A entrevista em epígrafe foi efetuada na Escola de Educação Básica Bom Pastor (E.E.B Bom Pastor) Município de Chapecó/SC, onde as professoras e a coordenadora da escola declararam suas opiniões acerca do programa, afirmando que, o mesmo abre a visão das pessoas, mostrando que o problema relacionado à violência e as drogas encontra-se próximo, como muitas vezes elas mesmas se deparam através de ocorrências nos corredores escolares, neste enfoque, o programa demonstra formas de ação e transmite segurança a todos, por confirmar que a PM oferece abrigo, proximidade e celeridade de ações, revigorando a vontade das mesmas em proteger os alunos e inibir a prática delitiva.

Caixa de texto: Prevenção à Violência Escolar
2° BPM/
Chapecó/Fron/SC
Fonte 2° BPM/Chapecó/Fron/SC. Gráfico demonstrativo da ação do programa Prevenção à Violência Escolar.

Somente no colégio E.E.B Bom Pastor, o programa atendeu 33 turmas, efetuando 16 palestras, e nestas foram executadas 12 orientações aos alunos em particular a respeito de alguma ilicitude, deste número um resultou em ocorrência que se referia à posse de drogas. No total foram atendidos 1.292 alunos, conforme expressa o gráfico. Neste trabalho, o programa esclarece aos alunos quanto aos trágicos fins que o caminho ilícito esconde, descortinando-os sobre a importância de uma vida regrada. No entendimento dos professores eles encontram-se alicerçados, por saberem que não se encontram sozinhos no combate à criminalidade, segundo relatam os alunos, o fato de o policial vir fardado toma maior atenção por parte dos mesmos que conscientes de que os relatos provêm de um agente da lei, percebem a veracidade dos casos, e evidenciam que o policial possui maior conhecimento da causa e por isto, consegue abordar o tema com mais habilidade e prática, que os professores, aferindo maiores resultados que a ação efetuada somente pelos agentes escolares.
Ao ser questionado o Cabo Marcelo, recorda momentos impactantes em sua carreira como nos casos de apreensão de armas e drogas no âmbito do colégio, porém, os resultados e o reconhecimento por seu trabalho, são por ele, imensuráveis. Ademais esta forma de ação ostensiva e preventiva facilita o diálogo entre todos os envolvidos (professores, alunos, pais), posto que os mesmos ganham discernimento sobre os males causados pela delinquência juvenil, trazendo equilíbrio entre as relações, dando oportunidade de ação aos pais e professores para que possam aproximar-se dos alunos e auxiliá-los em seus problemas.
A entrevista foi efetuada também aos alunos de forma individual, e as respostas dadas aos questionamentos coincidiram com as obtidas com os professores e coordenação, fato que torna inquestionável o auxílio e alcance que as palestras estão tendo no público infanto-juvenil, bem como, na facilitação da ação do Cabo Marcelo, que aufere mais acessibilidade e proximidade para a confissão dos delitos que o professor ou coordenador, devido a segurança que o mesmo transmite ao ambiente escolar.

marcelo.jpg
Fonte 2° BPM/Chapecó/Fron/SC. Aplicação do Programa Prevenção à Violência Escolar. Cabo Marcelo.

É notável o reconhecimento do trabalho do Cabo Marcelo Wundervald, isto que o mesmo desempenha este programa desde setembro de 2011, tendo um breve recesso no ano de 2014, instante em que as próprias escolas procuraram auxílio do mesmo, devido a excelência tanto do programa, quanto da prestação do trabalho, que apresentou resultados nítidos ao verificar o número de ocorrências provenientes, bem como, o comportamento dos alunos, que passam a respeitar mais o próximo e o regramento escolar, sendo mais consciente de suas atitudes.
Neste enfoque, preocupado com a efetividade do programa, no ano de 2014, o Cabo Marcelo Wundervald efetuou uma análise quanto aos assassinatos ocorridos na cidade de Chapecó/SC, das 57 ocorrências analisadas, ele verificou que 49 delas foram cometidas por indivíduos masculinos e 09 pelo sexo feminino, dos meliantes, 27 possuíam passagem pela polícia, isto é mais de a metade, conforme expressa o quadro abaixo:
Fonte 2° Batalhão de Polícia Militar de Chapecó/Fron/SC. Análise das Características dos Homicídios cometidos no município de Chapecó/SC.
De todas, 25 pessoas tinham idade entre 15 a 30 anos, ou seja, idade mais comum em que os sujeitos adentram no tráfico seja para porte e uso, ou para venda, 21 deles foram cometidos através de armas brancas e 32 por meio de armas de fogo, fato este que justifica as diversas Blitz como meio de extração destas armas ilícitas que se encontram nas ruas da cidade, sem registro e com pessoas que não possuem habilidade e discernimento para portá-las (sem porte de armas). Deste simples número, constata-se a necessidade de aproximação entre a polícia e o cidadão, levando segurança a comunidade e evitando o porte ilegal de armas, buscando agir mais pela prevenção que através da repressão, tencionando primeiramente evitar, para depois conter as ilicitudes, porém, com um enfoque maior no tráfico ilícito de drogas, pois conforme foi exposto anteriormente, deste agir ilícito decorrem a maioria das outras ocorrências, posto que este compreende o injusto mais comum nos colégios devido à facilidade do transporte, da camuflagem e da venda.




[1] Disponível em https://www.facebook.com/cidadaonocomando?fref=ts. Acesso em 28/08/2015.
[2] soberania popular – art. 14 da CF/88.