quinta-feira, 18 de março de 2021

A Constitucionalidade Ecológica da Dignidade da Pessoa Humana: Um Olhar Sob a Responsabilidade Municipal Acerca da Promoção do Respeito Ambiental

 

THE CONSTITUTIONALITY ECOLOGICAL HUMAN DIGNITY: A LOOK UNDER THE MUNICIPAL LIABILITY ABOUT ENVIRONMENTAL COMPLIANCE PROMOTION

 

ALINE OLIVEIRA MENDES DE MEDEIROS[1]

 

Resumo: A presente pesquisa pretende analisar o instituto da educação como uma aposta para a promoção do respeito em matéria ambiental, visando à transformação dos conflitos e efetivando um resgate de valores por meio do Programa Protetor Ambiental desenvolvido pelo 5° Batalhão de Polícia Militar Ambiental de Chapecó/SC. No intuito de verificar a efetividade deste programa no que tange a promoção da educação ambiental, formulou-se o seguinte problema da pesquisa: é possível o instituto da educação, materializado através do programa Protetor Ambiental promover o resgate de valores na área ambiental? Visando responder ao problema proposto, o trabalho tem por objetivo discutir a possibilidade que o programa Protetor Ambiental possui em promover a conscientização acerca da necessidade por proteção e restauração que o meio ambiente clama. E, por objetivos específicos: a) estudar o instituto educacional em matéria ambiental como solução para o desrespeito relacionado á matéria; b) analisar a contribuição da Polícia Militar Ambiental, através do programa Protetor Ambiental no que tange á temática; c) pesquisar a forma de efetivação do programa e os resultados obtidos. Existem diversos programas educacionais, porém, o programa Protetor Ambiental se destaca por ser efetivado pela Polícia Militar Ambiental, por meio de agentes fardados, desencadeando uma aproximação entre a sociedade e a instituição de maneira a implanta um agir integrado, reconhecendo as diferenças e necessidades regionais e promovendo a alteridade.

Palavras- chave: direito ambiental; dignidade humana ambiental; polícia militar ambiental.

Abstract: This research aims to analyze the educational institute as a commitment to promoting respect for the environment, aiming at the transformation of conflicts and effecting a rescue values ​​through the Environmental Shield Program developed by the 5th Battalion of Environmental Police Chapecó / SC. In order to verify the effectiveness of this program regarding the promotion of environmental education, formulated the following research problem: the education institute is possible, materialized through the Environmental Shield program promoting the surrender values ​​in the environmental area? Aiming to respond to the proposed problem, the work aims to discuss the possibility that the Environmental Shield program has to promote awareness of the need for protecting and restoring the environment calls. And for specific objectives: a) to study the educational institute on the environment as a solution to abuse related will matter; b) examine the Environmental Police contribution through the program Environmental Shield in relation to the theme; c) investigate the form of realization of the program and the results obtained. There are several educational programs, however, the Environmental Shield program stands out for being effected by the Environmental Police, through uniformed agents, triggering a rapprochement between the society and the institution in order to deploy an integrated action, recognizing regional differences and needs and promoting otherness.

 

Key words: environmental law; environmental human dignity; environmental military police.

Sumário: Introdução; O esverdear do direito constitucional; A polícia militar ambiental como promotora da dignidade humana ecológica; A educação como pedra basilar para a materialização da conscientização ambiental; Programa protetor ambiental: a busca pela efetivação da educação ambiental; conclusões articuladas.

 

INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por enfoque analisar a materialização da Constituição Federal de 1988 no que tange ao meio ambiente. Neste intuito será efetuada uma análise ao caput do art. 225 da Carta Magna, pretendendo extrair a amplitude de sua aplicabilidade no solo nacional.

Efetuada tal apreciação, cujo enfoque primordial paira na busca pela promoção ao respeito do meio ambiente, será explorada a educação como política pública concretizadora deste respeito, visto que a mesma atua na cultura da sociedade, ou seja, age desde a raiz, moldando o núcleo social, abrindo espaço para uma nova ordem, onde o respeito e a promoção do direito humano fundamental ao meio ambiente imperem.

Neste sentido, será averiguado sobre a atividade da Polícia Militar Ambiental, cuja função consiste em proteger e promover as leis ambientais, pois emprega suas capacidades e ferramentas na materialização deste encargo constitucional, preocupada com o bem-estar do meio ambiente, cuja proteção incumbe a todos os entes públicos e privados, porquanto, sua existência é crucial para o desenvolvimento e para a própria possibilidade de vida humana no globo terrestre.

Neste intuito, a Polícia Militar Ambiental do estado de Santa Catarina criou o programa Protetor Ambiental, de enfoque educativo, que objetiva possibilitar uma aproximação entre a PM e a coletividade, tencionando transmitir seus conhecimentos aos jovens como meio de enraizar uma cultura protetiva e restaurativa em matéria ambiental.

 

1.      O ESVERDEAR DO DIREITO CONSTITUCIONAL

Salienta-se que a Constituição Federal de 1988 é pioneira em mencionar a proteção ao meio ambiente, inovando em suas folhas ao expressar a matéria em diversos de seus artigos, a exemplo do título VIII, que retrata a ordem social, através do Capítulo VI, onde trás expressa a proteção ao meio ambiente materializada no art. 225, composto por seis parágrafos.

O caput deste dispositivo inicia suas expressões ao definir que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Ao examinar estas expressões é possível extrair do pronome indefinito todos, que o direito ao meio ambiente é de cada um, constituindo um direito nato, ou seja, intrínseco da pessoa humana, pelo simples fato desta compreender um ser humano, o que caracteriza um alargamento na abrangência desta norma jurídica, visto que a anuência de uma especificação sobre quem possua direito ao meio ambiente, “evita que se exclua quem quer que seja”, conforme destaca Machado (2014, p. 148), por corolário:

 

O direito ao meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo. ’O direito ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só dela sendo ao mesmo tempo ‘transindividual’. Por isso, o direito ao meio ambiente entra na categoria de interesse difuso, não se esgotando numa só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada. Enquadra-se o direito ao meio ambiente na ‘problemática dos novos direitos, sobretudo a sua característica de direito de maior dimensão, que contem seja uma dimensão subjetiva como coletiva, que tem relação com um conjunto de utilidades’ como assevera o Prof. Domenico Amirante. (apud MACHADO, 2014, p. 148).

 

No viés da locução todos tem direito constitui-se um direito subjetivo, ou seja, oponível erga omnes, que se complementa, por exemplo, por meio do exercício da ação popular ambiental, expressa no art. 5° da Carta Magna, inciso LXXIII.

Ocorre que, ao se pensar em meio ambiente não há como se referir a um único bem, pelo fato de compreender um complexo de bens, deste modo, apenas sob o ângulo de sua totalidade é que será possível constatá-lo em seu contexto.

Desta forma, este direito compreende um misto de direito individual e coletivo, materializado em uma mesma face, caracterizando-se como um direito fundamental da pessoa humana, pois, sua expressão encontra-se esculpida desde o preâmbulo do Caderno Constitucional, abrindo suas páginas e encerrando-as, marcando cada uma de suas laudas em função de sua essencialidade para a vida humana.

Sob o ângulo de um Estado Democrático de Direito, entende-se que a grandiosidade de sua valoração e expressão legal, deve-se ao fato de que o mesmo destina-se a materializar os direitos coletivos e individuais das pessoas, como por exemplo, a dignidade da pessoa humana, fundamento desta forma estatal (art. 1°, III da CF), o que demonstra que este bem não deve ser visto apenas pelo olhar de sua fruição, mas, principalmente, pelo viés de sua conservação.

Ademais, “o caput do art. 225 é antropocêntrico. É um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a ‘vida e a dignidade das pessoas’ - núcleo essencial dos direitos fundamentais,” conforme denota Machado (2014, p. 150).

Sendo, por isto, incontestável o fato de que sua destruição compromete a dignidade humana de todo o globo terrestre, pondo em risco todas as espécies de vida humanas, como elucida a Declaração da Conferência do Rio de Janeiro de 1992, estabelecendo como pedra basilar o princípio (I) de que “os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável.” (apud MACHADO, 2014, p. 150).

Como conceito de direito ao meio ambiente, tem-se a consideração executada através do STF, por meio do Min. Celso de Mello:

 

[...] direito de terceira geração que assiste de modo subjetivamente indeterminado, a todo o gênero humano, circunstancia essa que justifica a especial obrigação – que incumbe ao Estado e à própria coletividade – de defendê-lo e de preservá-lo em benefícios das presentes e futuras gerações. (apud MACHADO, 2014, p. 150/151).

 

Em decurso, por meio ambiente ecologicamente equilibrado, verifica-se a busca por um equilíbrio entre os fatores que formam um habitat ou ecossistema, não se quer, com isto, o alcance da inalterabilidade das condições naturais, mas uma harmonia entre os elementos que o compõe.

Da locução bem de uso comum do povo, constata-se uma nova roupagem, que sem eliminar o conceito anterior, amplia-o, inserindo, conforme esclarece Machado (2014, p. 152), “a função social e a função ambiental da propriedade (arts. 5°, XXIII, e 170, III e IV) como bases da gestão do meio ambiente, ultrapassando o conceito de propriedade privada e publica”.

Machado destaca que (2014, p. 152), “o poder público passa a figurar não como proprietário de bens ambientais - das águas e da fauna-, mas como um gestor ou gerente, que administra bens que não são dele e, por isso, deve explicar convincentemente sua gestão.”

A anuência deste entendimento jurídico reproduz, para o Ministério Público, o dever de informar e incentivar a participação da sociedade na gestão do meio ambiente, estimulando os cidadãos a cobrarem a prestação de contas sobre a utilização e cuidados dispensados, pelo Poder Público, ao meio ambiente.

Com relação à expressão sadia qualidade de vida, é sabido que esta situação apenas se materializará através de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois compreende uma relação de causa e efeito, onde o estado de um reflete diretamente no estado do outro, afinal, o constituinte originário não se satisfez em garantir simplesmente o direito à vida, foi além, pois declarou que a mesma precisa ser digna.

Porém, este direito está longe de ser materializado, carecendo de políticas públicas efetivadoras.

No entanto, seus alicerces encontram-se enterrados no solo da Constituição, norma de maior expressão para o Estado, germinando em sua superfície leis passíveis de desabrocharem uma sociedade jurídica e ecologicamente democrática, florescendo uma constituição verde sobre o âmago da população, reproduzindo sementes sustentáveis no solo nacional.

Em defluência, por Poder Público (poderes da União, art. 2° da CF/88) e coletividade advêm o dever constitucional de defender e preservar o meio ambiente. Neste ínterim, Machado (2014, p. 154) acresce que o termo coletividade abrange o conjunto populacional, esculpindo uma responsabilidade conjunta entre Estado e sociedade pela esfera ambiental (2014, p. 154/155), embasando “uma das marcas inconfundíveis do novo Direito Ambiental.”

Desta forma, sempre que o meio ambiente é ferido em alguma de suas ramificações, o Estado Democrático de Direito perde parte de sua efetividade, pois, não apenas o corpo social é responsável por sua proteção, mas o Estado, também.

A expressão presentes e futuras gerações designa uma solidariedade intergeracional, devido ao fato de que a presença humana no meio ambiente reproduz uma “uma cadeia de elos sucessivos”, onde os atos de uma geração refletem seus efeitos nas gerações futuras, o que dificulta, aos estudiosos, a compreensão da extensão dos danos sofridos por este bem e o aferimento das necessidades que estes danos emanam.

Porquanto, o meio ambiente produz recursos suficientes para o consumo de uma geração, não havendo motivos para que esta venha a usufruir de recursos de uma geração futura, sendo mister um agir sustentável.

Ademais, conforme Sarlet (2014, p. 45):

 

[...] a dignidade da pessoa humana como principio fundamental edificante do Estado de Direito brasileiro, e, portanto, como ponto de partida e fonte de legitimação de toda a ordem estatal, com destaque aqui para o sistema jurídico pátrio. A dignidade da pessoa humana, como, aliás, já tem sido largamente difundido, assume a condição de matriz axiológica do ordenamento jurídico, visto que é a partir deste valor e princípio que os demais princípios (assim como as regras) se projetam e recebem impulsos que dialogam com os seus respectivos conteúdos normativo-axiológicos, o que não implica aceitação da tese de que a dignidade é um valor a cumprir tal função nem a adesão ao pensamento de que todos os direitos fundamentais (especificamente se assim considerados os que foram como tais consagrados pela Constituição) encontram seu fundamento direto e exclusivo na dignidade da pessoa humana.

 

Em consequência, afirma o referido autor (2014, p. 45) que:

 

A dignidade humana, para além de ser também um valor constitucional, configura-se como – juntamente com o respeito e a proteção da vida – o princípio de maior hierarquia da CF/88 e de todas as demais ordens jurídicas que a reconheceram. A dignidade da pessoa humana apresenta-se, além disso, como a pedra basilar da edificação constitucional do Estado (Social, Democrático e Ambiental) de Direito brasileiro, na medida em que, aderindo a uma trajetória consolidada especialmente a partir do II Pós-Guerra e inspirada fortemente na visão humanista de Kant e tantos outros, o constituinte reconheceu que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio de atividade estatal, o que, diga-se de passagem, demarca a equiparação de forças na relação Estado-cidadão, em vista da proteção e afirmação existencial deste último, especialmente no que tange à tutela e promoção dos seus direitos fundamentais.

 

Por corolário em seu aspecto socioambiental, a dignidade humana não pode ser limitada a uma dimensão biológica ou física, sendo imperativo avistá-la em sua totalidade, inclusive no que se refere ao meio ambiente em que se desenvolve.

Sob este assunto Sarlet (2014, p. 48) determina uma dimensão ecológica para a dignidade, visando ampliar o alcance desta norma, objetivando proporcionar qualidade, equilíbrio e segurança ambiental, buscando mais que garantir a sobrevivência humana, partindo do ponto em que a dignidade abrigue em seu manto todos os seres, ultrapassando a visão antropológica de Kant, para um olhar socioambiental.

Acerca deste aspecto K. Stern (apud SARLET, 2006, p. 42) salienta:

 

Esta, portanto, compreendida como qualidade integrante e irrenunciável da própria condição humana, pode (e deve) ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida, não podendo, contudo (no sentido ora empregado) ser criada, concedida ou retirada (embora possa ser violada), já que existe em cada ser humano como algo que lhe é inerente. Ainda nesta linha de entendimento, houve até mesmo quem afirmasse que a dignidade representa ‘valor absoluto de cada ser humano, que, não sendo indispensável, é insubstituível’.

 

Porém, no dia-a-dia, o homem pratica uma inversão de valores, agindo com desrespeito ao meio ambiente, pois, da posição de hospedeiro da Terra, o mesmo passa a agir como dono (um parasita), extraindo da natureza o máximo que pode, sem procurar devolver nada, sugando ilimitadamente os recursos finitos, promovendo a extinção de inúmeras espécies de animas e plantas. Sobre isto, Serres (1990, p. 93) destaca que:

 

Na sua própria vida e através das suas práticas, o parasita confunde correntemente o uso e o abuso; exerce os direitos que a si mesmo se atribui, lesando o seu hospedeiro, algumas vezes sem interesse para si e poderia destruí-lo sem disso se aperceber. Nem o uso nem a troca têm valor para ele, porque desde logo se apropria das coisas, podendo até dizer-se que as rouba, assedia-as e devora-as. Sempre abusivo, o parasita.

 

Ainda no entendimento de Serres (1990, p. 65), verifica-se a necessidade de estar racionalizando um meio para criar um equilíbrio entre o que se extrai e o que se devolve à natureza, utilizando “o verbo pensar, próximo de compensar. Eis o direito mais geral para os sistemas mais globais”.

Sendo que, a qualidade, o equilíbrio e a segurança ambiental passam a compor mais uma pedra edificante do Estado Democrático que, envolvida pelo véu da dignidade da pessoa humana, propõe a materialidade de um mínimo existencial ecológico, que seja suficiente para conferir uma vida digna a todos os seres vivos, inclusive as plantas e os animais.

Sarlet (2014, p. 48/49) elucida que o ambiente encontra-se presente “nas questões mais vitais e elementares da condição humana, além de ser essencial à sobrevivência do ser humano como espécie animal natural”, diante desta afirmação, torna-se inegável a abertura da dignidade humana para todas as espécies vivas.

Desperta para a valoração que este bem possui é que a Constituição através do art. 144, V, §6°, designou a Polícia Militar como responsável pela polícia ostensiva e pela preservação da ordem pública, a qual se ramificou através da Polícia Militar Ambiental, responsabilizando-se pela efetivação da proteção da esfera ambiental, conforme será visto no item a seguir.

 

2.      A POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL COMO PROMOTORA DA DIGNIDADE HUMANA ECOLÓGICA

Por poder de polícia ambiental, tem-se na concepção de Machado (2014, p. 384):

 

[...] a atividade da Administração Pública que limita ou disciplina o direito, interesse ou liberdade, regula a prática do ato ou a abstenção de fato em razão do interesse público concernente a saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou outras atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou licença do Poder Público de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza.

 

Define Meirelles (apud MACHADO, 2014, p. 385) que o poder de polícia atua por meio de ordens e proibições, ou seja, via “normas limitadoras e sancionadoras”, ou, por meio da “ordem de polícia, pelo consentimento de polícia, pela fiscalização de polícia e pela sanção de polícia”.

Ocorre que, em sua origem o poder de polícia restringia-se à segurança, moralidade e salubridade, no entanto, sua ação se expandiu, passando a abranger “a defesa da economia e organização social e jurídica” em todas as suas esferas, como recorda Machado (2014, p. 385).

Por conseguinte, conforme Debbasch (apud MACHADO, 2014, p. 386), “as autoridades de polícia são aquelas que, em virtude da Constituição ou de disposições legislativas, tenham recebido o poder de editar medidas de polícia administrativa.”

O poder de polícia, em matéria ambiental, atua sobre o agente infrator da lei, inclusive sobre os agentes públicos, agindo como limitador dos direitos individuais em prol da coletividade, assim para que esta proteção seja posta em prática é necessário instituir mecanismos efetivadores destas leis, como por exemplo, a Polícia Militar Ambiental.

O CTN, através do art. 78, conceitua o poder de polícia como sendo a:

 

[...] atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

 

Por defluência, a polícia divide-se em polícia judiciária e polícia administrativa, sendo que esta última compreende uma diversidade de intervenções do poder público no intuito de disciplinar a ação dos particulares, tencionando, nas palavras de Antunes (2004, p. 134), “prevenir atentados à ordem pública”, de ação auto-executória.

Outrossim, para Antunes (2004, p.136), com relação ao direito ambiental o termo ordem pública, retrata a manutenção e obediência ao respeito pelo estágio mínimo referente à salubridade ambiental estabelecido na ordem vigente, podendo esta agir preventivamente ou repressivamente em prol deste interesse.

Conforme Dezordi (2006, p. 27) o termo ordem pública expressa a tríade composta pela segurança pública, a tranquilidade pública e a salubridade pública, assim a preservação ambiental concretiza-se como interesse e fundamento desta tríade, “uma vez que é constituída por um mínimo de condições essenciais a uma vida social conveniente”.

Dentre as ações da Polícia Militar Ambiental destacam-se, o licenciamento, as licenças, autorizações e penalidades, sendo a primeira a de maior valoração por constituir para a Administração Pública um meio de direcionar o exercício de determinadas atividades em proteção do meio ambiente.

As principais sanções aplicadas por este órgão compreendem a pena de multa, de fechamento do estabelecimento, de interdição de atividade, embargo da obra, de demolição, de inutilização de gêneros, de destruição de objetos, dentre outras.

As responsabilidades pelos danos ambientais reportam-se tanto as pessoas físicas, quanto as jurídicas, podendo ser de natureza civil, penal ou administrativa, ou cumulativamente.

 

[...] a força policial protege o meio ambiente, tendo em mira garantir a segurança, a tranquilidade e a salubridade públicas, em defesa do bem-estar da população. E o faz coibindo a prática de crimes que reflitam sobre o patrimônio ambiental, antes e depois de sua ocorrência, fiscalizando e investigando. (Milaré, 2011, p. 1337/1338).

 

De outra forma conforme preceitua Anderle (apud MILARÉ, 2011, p. 1338):

[...] há de se distinguir polícia administrativa e polícia de segurança pública (...). Aquela incide sobre bens, direitos e atividades, esta sobre as pessoas. A primeira é inerente e se difunde por toda a Administração Pública; a segunda é privativa de determinados órgãos (policias civis) ou corporações (polícias militares). Portanto, a Polícia Administrativa se vale de regras administrativas e as sanções que aplica são do direito administrativo. Já a Polícia de Segurança Pública se vale dos tipos penais para agir sobre as pessoas.

Na mesma direção, Di Pietro (MILARÉ, 2011, p. 1338 apud Lazzarini, 2010, p. 100) destaca que:

 

[...] ‘quando atua na área do ilícito puramente administrativo (preventiva ou repressivamente), a polícia é administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age.’ (...) ‘a polícia judiciária é privativa de corporações especializadas (polícia civil e militar), enquanto a polícia administrativa se reparte entre diversos órgãos da Administração, incluindo, além da própria polícia militar, os vários órgãos de fiscalização aos quais a lei atribua este mister, como os que atuam nos ares da saúde, educação, trabalho, previdência e assistência social’.

 

Por sua vez, a Polícia Judiciária possui dois instrumentos de ação que compreendem os termos circunstanciados e os inquéritos policiais (sem ação do contraditório e da ampla defesa), este último refere-se ao “procedimento preparatório da ação penal, através do qual são colhidas as provas em que se assentará a denúncia”, como retrata Milaré (2011, p. 1339), já quanto ao primeiro instrumento, o mesmo destina-se à apuração de infrações de menor potencial ofensivo.

Já, a polícia administrativa, atua por meio da “lavratura dos autos de infração ambiental, os quais ensejam a instauração de um processo administrativo, em que se garante ao autuado o direito ao contraditório e a ampla defesa,” (2011, p. 1339), e ainda, através do Termo Circunstanciado.

Assim, à Polícia Federal incumbe atuar sobre os ilícitos ambientais interestaduais ou internacionais, já no que tange as polícias civis estaduais sua ação é residual, competindo-lhes as funções judiciais que não pertençam a Polícia Federal, sendo que, em alguns Estados já foram criadas delegacias especializadas em tais ilícitos, denominadas Delegacias Verdes.

No que reporta a Polícia Militar, o art. 144, inc. V da Carta Maior, lhe garante a ação de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, cabendo-lhe as atividades preventivas por meio da ação ostensiva, que conforme Lazzarini (apud MILARÉ, 2011, P. 1341):

 

[...] o policial, inclusive o policial florestal, deve decidir normas jurídicas amplas e vagas, na dinâmica do cumprimento da missão policial, em condições quase sempre adversas, não podendo fugir do estrito cumprimento do dever legal de, em defesa da cidadania, em defesa do meio ambiente, etc., fazer aquelas escolhas críticas em questão de fração de segundo, (...), crítica escolha que será sempre tomada com aquela incomoda certeza de que outros aqueles que tinham tempo de pensar estariam prontos pra julgar e condenar aquilo que fizera ou aquilo que não tinha feito, ou seja, condenando-o, ou seja, condenando-o como abusivo (de autoridade) ou prevaricador.

 

A Polícia Militar Ambiental atua de forma ostensiva, supervisionando as atividades com potencial poluidor e a conduta relacionada ao meio ambiente, sendo investidas pelo poder de desenvolver atividades preventivas e repressivas conjuntas ao Ministério Público e ao Poder Judiciário.

Em função da essencialidade da matéria, alguns Municípios têm incumbido as Guardas Municipais Ambientais para reforçar este trabalho protetivo como destaca Milaré (2011 p. 1344/1345). Sobrevém que a competência em matéria ambiental é ampla apresentando-se desde a esfera federal até municipal.

No viés preventivo a PMA desenvolve programas educacionais, acerca do qual será transcrito o item a seguir.

 

3.       A EDUCAÇÃO COMO PEDRA BASILAR PARA A MATERIALIZAÇÃO DA CONSCIENTIZAÇÃO AMBIENTAL

Ciente da abrangência e importância do meio ambiente, que constitui extensão da vida humana, visto que é deste que a mesma emerge, é que o constituinte originário consolidou no artigo 225, §1º, VI da CF/88, que incumbe ao Poder Público, como forma de assegurar este direito fundamental, a responsabilidade pela promoção da “educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”.

Sendo esta diretriz reforçada por outras ramificações da árvore jurídica, que constantemente recordam acerca do dever público e privado, coletivo e individual de promover a conscientização ambiental, através da educação, devido a sua capacidade de atuar na formação do cidadão desde a mais tenra idade, plantando valores e regando seu senso crítico para direcionar suas ações relacionadas à matéria ambiental.

O agir por meio da educação se enraizou no solo nacional através da Lei n° 9.795/99 (Política Educacional da Educação Ambiental), germinando a responsabilidade coletiva pela construção dos valores ambientais, como meio de buscar conhecimentos e ações voltadas para a conservação, preservação e restauração do meio ambiente.

Despertando a lógica ambientalista da sociedade direcionando-os a atuar em um processo de ponderação entre suas ações e as necessidades ambientais, conscientes da essencialidade e finitude deste bem, procedendo regrados pela sustentabilidade.

Esta Lei esculpe em seus 21 artigos, as diretrizes do ensino formal (das escolas) e informal (dos demais meios), de forma a complementarem-se desencadeando em uma educação eficiente para o cidadão.

Neste enfoque Milaré (2011, p. 632) destaca que a mesma:

 

[...] deve ser considerada como uma atividade-fim, visto que ela se destina a despertar e formar a consciência ecológica para o exercício da cidadania. Não é panacéia para resolver todos os males. Sem dúvida, porém, é um instrumental valioso na geração de atitudes, hábitos e comportamentos que concorrem para garantis o respeito ao equilíbrio ecológico e a qualidade do ambiente como patrimônio da coletividade. A matéria comporta exame sob três aspectos: o educacional, o formal e o não formal.

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No que tange ao aspecto educacional, o respectivo autor (2011, p. 632), enfatiza que esta responsabilidade circunda a todos os agentes, sejam públicos ou privados, embasando uma ação conjunta entre o Poder Público e a população, tencionando a difusão de valores e princípios atinentes a área, utilizando-se de todos os meios possíveis e legais para este fim, direcionando-se através do conhecimento para materializar o respeito e a conscientização ambiental.

Sob o aspecto formal, tem-se o ensino ambiental lecionado nas escolas, em todos os níveis de instrução, através de um currículo interdisciplinar, disciplinado em uma matéria isolada, conforme o art. 10, § 1° da lei em comento, sendo esta ação regrada através da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases), que por sua vez, disciplina, conforme Goldschmidt (2003, p. 48), os princípios, fins, organizações, níveis e modalidades acerca da educação nacional, regulamentando de forma minuciosa os princípios educacionais.

Já no sentido informal, engloba-se a educação no âmbito social, isto é, fora do ambiente escolar, denominada educação permanente, porquanto atua continuamente sobre o cidadão, contribuindo para o aperfeiçoamento e a conscientização da sociedade, atuando na busca de soluções para as problemáticas, promovendo reflexões e debates atinentes a área, materializando uma renovação constante, atualizando e expandindo o campo de ação dos agentes ambientais formais e informais, conforme denota Milaré (2011, p. 634).

No entanto, para Antunes (2004, p. 252/256) a redação da lei educacional ambiental peca, por conter conceitos abstratos e insuficientes, visto que em seu texto falta a fixação de objetivos, planejamento e instrumentos para a definição precisa de políticas públicas atinentes a área.

Um exemplo disto é o art. 14, onde a Lei em epígrafe incumbe ao órgão gestor a sua regulamentação, expressão esta, desconhecida pelo direito administrativo, deixando em dúvida sobre a quem compete seu implemento, como elucida o autor (2004, p. 258/259).

Mesmo assim, a lei atribuiu funções a este órgão, através do art. 15, como por exemplo, definir suas diretrizes para a implementação nacional, refletir, coordenar e supervisionar os planos de ações acerca desta temática, fato este que torna a Lei confusa e pouco compreensível, prevaricando frente às expectativas sociais.

No entanto, expressa que a competência para a aplicação das leis ambientais é comum, possibilitando a formação de uma aliança entre os entes públicos, por isto, qualquer dos entes públicos possui legitimidade para dar vida a estas leis, como elucida Machado (2013, p. 444/445).

Conforme Platão (apud SANTOS, 1949, p. 17) a basilar função estatal é a educadora, e na concepção de Vitor Hugo (apud SANTOS, 1949, p. 17) “abrir escolas é fechar cadeias”.

Portanto, é por meio da educação que se constrói a consciência do indivíduo, ajustando-o as necessidades sociais, despertando seu senso crítico e sua capacidade de autodeterminação, pois nos ditames deste autor “a palavra é o orvalho que fertiliza a alma” (1949, p. 24) e ganha vida por meio de ações.

Ademais, as crianças não nascem prontas, elas se moldam através do conhecimento, daí emerge a fundamentalidade que a educação possui para a construção de um Estado Democrático de Direito, neste sentido destaca Goldschmidt (2003, p. 47) que:

 

Inegavelmente, a educação possui estreita relação com o fenômeno jurídico, uma vez que constitui uma condição de ascensão do homem na sua projeção pessoal e social. E o direito, como mecanismo de realização humana e social, não fica alheio a esta realidade, fazendo integrar em seu sistema uma série de normas e princípios que garantem ao homem o acesso à educação.

 

Enfatiza Boaventura (apud GOLDSCHMIDT, 2003, p. 47) que a educação compreende três âmbitos, sendo “faculdade atribuída ao educando”, em virtude de que o art. 205 da Carta Magna a designa como direito de todos e dever estatal e social, que coadunado aos arts. 54 e 55 do ECA, expressam a obrigatoriedade do ensino.

E ainda embasa a “norma que rege o comportamento de ensino” que conforme Goldschmidt (2003, p. 47), trata acerca de um sistema de regras que delimitam a relação de ensino e aprendizagem em sua estrutura e desenvolvimento.

Neste instante é importante distinguir a diferença entre a legislação de ensino e o direito educacional, que na concepção de Motta (apud GOLDSCHMIDT, 2003 p. 48) se refere:

 

No primeiro sentido, temos uma pletora de normas que vão desde leis federais, estaduais e municipais até pareceres do Conselho Nacional de Educação, decretos do Poder Executivo, portarias ministeriais, estatutos e regimentos de escolas, que constituem a conhecida tradicional disciplina Legislação de Ensino, a qual é parte integrante, mas restrita, do Direito Educacional, pois não inclui nem a unidade doutrinária, nem a sistematização de princípios, nem tampouco a metodologia que estrutura um corpo jurídico pleno.

 

Neste ínterim, como ramo jurídico a educação possui um conjunto principiológico, com normas e institutos próprios, assim é do direito educacional que se extraem as bases jurídicas de todo o complexo educacional, sendo disciplinado em diversos regramentos. Assim, é efetuada uma aliança entre o direito educacional e o ambiental em prol da sociedade.

O entendimento que emana do art. 5° da CF, de que a vida compreende um direito irrenunciável e inviolável, e de que como cláusula pétrea, seus efeitos são inegáveis, demonstra que não há possibilidade de vida digna sem que os recursos naturais encontram-se disponíveis aos seres humanos, fortificando este pacto entre estas ramificações jurídicas, estendendo no solo pátrio sua materialização através do programa Protetor Ambiental, evidenciado no próximo item.

 

4.      PROGRAMA PROTETOR AMBIENTAL: A BUSCA PELA EFETIVAÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Ciente da relevância do tema foi que a Polícia Militar Ambiental de Santa Catarina implantou no ano de 1999, o programa Protetor Ambiental (Proa), desenvolvido em todo o Estado com o enfoque de aproximar a PM da sociedade, levando um atuar preventivo, na esfera ambiental, por meio da educação, tendo como público alvo os adolescentes, cujos quais são disciplinados para agirem em prol da sociedade consolidando ações ambientalistas.

O Proa segue os princípios consagrados no Programa Nacional de Educação Ambiental (Pronea), visando inserir seu público alvo nas questões ambientais, por meio de atividades teóricas e práticas, despertando-os para o saber ambiental. Em todo o Estado a PMA formou 6.300 Protetores Ambientais.

Na circunscrição do Município de Chapecó/SC, a população conta com o auxílio do 2° Batalhão de Polícia Militar Ambiental, onde, desde o ano de 2006, o programa esta sendo arraigado e até o ano de 2016 formou 300 jovens em 12 turmas.

Este ensino ambiental possui a durabilidade de um ano, no decorrer do qual os alunos desenvolvem atividades teóricas e práticas de preservação e defesa do meio ambiente, relacionadas a temáticas cotidianas e pertinentes a realidade local e regional. O objetivo basilar do programa é formar alunos descortinados acerca da essencialidade do meio ambiente e capacitados para colocar seus aprendizados em prática no núcleo social.

Assim, os alunos Protetores Ambientais passam a atuar em defesa do meio ambiente, com o intuito de enraizar na sociedade um pensamento crítico e proativo materializado em ações de proteção ambiental cultivando o desenvolvimento sustentável. As aulas permitem o aprimoramento intelectual, social e a cognição ambiental aos alunos.

Durante o desenvolvimento do curso, os alunos Protetores recebem instrução acerca dos temas relacionados à Ecologia, Gestão de Resíduos, Gestão de Fauna, Gestão de Flora, Gestão de Recursos Hídricos e Unidades de Conservação, além de disciplinas extracurriculares, tais como Combate às Drogas, conscientização acerca das DST´s, além de realizarem viagens de estudo, entre outras atividades, afetas ao cotidiano ambiental.

A inclusão no curso ocorre de forma voluntária, por meio de um exame de seleção, ou seja, por prova objetiva, com questões voltadas a realidade local e regional, atinentes a matéria ambiental, realizada em escolas participantes do programa, sendo que o corpo discente é formado por 20 a 30 alunos protetores por turma, e os instrutores são escolhidos na comunidade e instituições parceiras, voluntários, sendo profissionais das mais variadas áreas que contribuem com a formação destes adolescentes durante o desenvolvimento do curso.

Os policiais militares ambientais lecionam fardados, visando transmitir os valores da instituição para estes alunos, em uma ação de aproximação e cooperação.

De 2006 a 2016 foram formados aproximadamente 300 Protetores Ambientais, divididos em 12 turmas, com alunos de todas as origens e classes sociais, permitindo a troca de informações entre os estudantes das regiões urbanas e rurais, possibilitando a inclusão social e a igualdade entre os discípulos.

Os alunos formados têm a possibilidade de continuar junto à instituição, atuando voluntaria e gratuitamente na formação de novas turmas, o que viabiliza a aproximação entre a sociedade e a instituição policial militar ambiental, auxiliando no desenvolvimento das atividades educativas como, por exemplo, a elaboração de palestras em universidades, comunidades rurais, cooperativas, sindicatos, educandários, prefeituras, etc., em conjunto dos demais alunos.

Exemplo de ação educativa efetuada com a participação dos protetores ambientais coordenados pelo 2° Batalhão de Polícia Militar Ambiental é a participação em expo feiras, seminários, viagens de estudo, visando à transmissão de informações e orientações sobre o uso e proteção do meio ambiente para outras pessoas, em prol do desenvolvimento sustentável da comunidade, ressaltando a referência da preservação, segurança e interdisciplinaridade das ações da PMA com foco no desenvolvimento social, econômico e ambiental.

O programa Protetor Ambiental constitui-se por um universo de atividades pedagogicamente definidas e delineadas com o propósito de contribuir na prevenção primária às agressões humanas ao meio ambiente, permitindo, através dos alunos, a materialização de comportamentos adequados à preservação da vida em todas as suas nuances.

O mesmo visa resgatar valores e edificar uma sociedade sustentável e consciente da essencialidade do meio ambiente. Pretende despertar a racionalidade dos educandos, ensinando-os a agir frente às adversidades com habilidade suficiente para evitar o cometimento de ilicitudes.

Para tanto, o Programa, sob a premissa de que ninguém preserva o que não conhece, visa disseminar conhecimentos sobre fatores biótico e abióticos, direcionando-os aos adolescentes na faixa etária entre 12 e 16 anos, das redes pública e privada de ensino, do Estado de Santa Catarina, através de atividades teóricas e práticas desenvolvidas e/ou coordenadas por Policiais Militares Ambientais.

Procedendo de tal forma, almeja-se desenvolver uma consciência ecológica, que possibilite aos alunos ponderar suas atitudes e influenciar as ações dos demais cidadãos rumo à sustentabilidade e ao respeito pelo meio ambiente.

O programa visa transformar a realidade da sociedade, agindo conforme as necessidades de cada região, procurando transmitir conhecimentos necessários conforme as carências verificadas, formando uma cultura de seres pensantes e atuantes em proteção, preservação e restauração do meio ambiente, de modo que a sociedade passe a ver a Polícia Militar Ambiental como um órgão auxiliador nas problemáticas encontradas, desenvolvendo laços de respeito e interação entre ambos, visando efetivar a lei ambiental. Os Policiais Militares atuantes no programa possuem qualificação específica.

A Polícia Militar Ambiental, como as demais instituições, age pautada no respeito e consideração pelos direitos humanos e conforme afirma Jesus (2011, p. 133) “não se trata de saber quais e quantos são estes direitos, (...) mas sim, qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir, que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente, violados” e é neste ponto que a PMA atua, direcionando os alunos sobre seus direitos e deveres como cidadão e munindo-os com instrumentos para efetivá-los. Afinal, destaca Jesus que (2011, p. 134):

 

Há uma distancia enorme entre a positivação dos direitos humanos e a sua efetividade propriamente dita. Essa distância existe porque ocorre uma crise na cidadania, na qual o indivíduo desconhece os seus direitos, sendo, portanto, difícil de chegar à efetivação dos direitos humanos.

 

Por corolário, a educação consiste em uma ferramenta eficaz para a consolidação do direito humano fundamental ao meio ambiente, e é centrado neste prisma que o 2° Batalhão de Polícia Militar Ambiental de Chapecó/SC age, considerando e efetivando os preceitos da ordem maior, na busca pela consumação de um Estado Democrático de Direito.

 

CONCLUSÕES ARTICULADAS

Este estudo retratou a fundamentalidade que possui o meio ambiente para a vida humana, e se desenvolveu através de uma análise ao caput do art. 225 da CF/88, extraindo seus preceitos e irradiações.

Efetuando um exame em cada uma de suas locuções, retirando os entendimentos que o constituinte originário possuía ao elaborar suas linhas, visando sua perfeita materialização na ordem vigente, como forma de elevar sua potencialidade de atuação na coletividade.

Diante da responsabilidade de promover a expressão da Epístola Maior e de conscientizar a sociedade sobre a essencialidade do meio ambiente, é que se verificou que atuar através da educação seria a melhor forma de auferir este resultado.

Visto que a educação atua desde a mais tenra idade da pessoa, sendo possível a construção de sua personalidade e preparo para a vida social, sendo este, o instante primordial para a construção de valores na pessoa humana.

Ao plantar valores em uma pessoa, através da educação, abrem-se margens para que outras pessoas se conscientizem destes valores e passem a respeitá-los e promovê-los.

Porquanto, este estudo pretende disseminar uma educação atuante desde a semente da árvore, cuidando-a para que germine forte e resistente aos impulsos negativos provenientes da sociedade, impulsionando-as a viver digna e legalmente, estimulando para que as demais pessoas conscientizem-se sobre seus atos, abrindo espaço para que uma nova ordem social, pautada em valores, tais como o da sustentabilidade, possa se edificar no solo pátrio.

É com este pensamento que a Polícia Militar Ambiental desenvolveu o programa Protetor Ambiental, preocupada com os anseios sociais e com o desvalor que este bem esta tendo, buscando efetividade além de suas atribuições fiscalizadoras, passando a aproximar-se do núcleo social e a levar valores para este âmbito, por meio da educação.

A mesma busca atuar educando para preservar e promover, tornando a atividade policial militar ambiental ainda mais valiosa, centrada nos valores do humanismo, da liberdade, da igualdade e da fraternidade, fortalecendo suas raízes no solo nacional por meio de uma ação próxima, humanitária e eficiente, dando vida aos preceitos do ordenamento jurídico vigente.

                       

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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_____. Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em 18.12.2014.

_____. Lei n° 9.795, de 27 de abril de 1999. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9795.htm. Acesso em 18.12.2014.

_____. Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em 18.12.2014.

DEZORDI, Sadiomar Antonio. Competência da Polícia Militar de Santa Catarina como autoridade policial para efetuar a lavratura do Termo Circunstanciado na esfera ambiental. Monografia de conclusão do curso de bacharel em segurança pública na Universidade do Vale do Itajaí, 2006.

GOLDSCHMIDT, Rodrigo. O Princípio da Proporcionalidade no Direito Educacional. Passo Fundo: UPF, 2003.

JESUS, José Lauri Bueno de. Polícia Militar & Direitos Humanos. Curitiba: Juruá Editora, 2011.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 22 ed. rev. amp. e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2014.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 7 ed. rev. atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

SANTOS, Miguel. Educação como Prevenção da Criminalidade. Rio de Janeiro, 1949.

SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014.

SARLET, Ingo Wolfgang.  Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4ª Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

SERRES, Michel. O contrato natural. Trad. Serafim Ferreira. Portugal: Editions François Bourin, 1990.



[1] Advogada; Graduada em Direito pela UNOESC; Autora do Blog Direito em Estudo; Autora do livro A promoção dos Direitos Humanos Fundamentais através da Polícia Militar.


Disponibilizo mais um dos meus artigos que estão dispostos no site da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, bem como em minha biblioteca digital para que confiram. Forte abraço.


Acessem através do link em azul: A Constitucionalidade Ecológica da Dignidade da Pessoa Humana: Um Olhar Sob a Responsabilidade Municipal Acerca da Promoção do Respeito Ambiental

O Dirigismo Judicial como Ferramenta de Efetividade do Direito Fundamental ao Meio Ambiente em uma Perspectiva ao Direito à Vida

 

O DIRIGISMO JUDICIAL COMO FERRAMENTA DE EFETIVIDADE DO DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE EM UMA PERSPECTIVA DE EXTENSÃO AO DIREITO À VIDA

 

THE DIRIGISME JUDICIAL AS FUNDAMENTAL RIGHT TO EFFECTIVE TOOL TO THE ENVIRONMENT IN AN EXTENSION OF PERSPECTIVE THE RIGHT TO LIFE

 

Resumo: A presente pesquisa pretende analisar o mecanismo do dirigismo judicial como meio de efetivar o direito fundamental ao meio ambiente, sob a perspectiva de extensão ao direito à vida, como uma aposta na promoção deste direito essencial à vida humana, visando edificar uma transformação no núcleo social de forma a promover a vida sustentável. No intuito de verificar uma resposta a essa temática, formulou-se o seguinte problema de pesquisa: É possível que através do dirigismo judicial possa-se promover o respeito ao meio ambiente, em razão de sua essencialidade para a vida humana? Visando responder ao problema proposto, o trabalho tem por objetivo geral discutir a possibilidade de o sistema judiciário promover a transformação dos conflitos a partir do princípio da dignidade da pessoa humana e da consubstanciação, por meio de suas decisões, de uma vida sustentável. E, por objetivos específicos: a) estudar o princípio da dignidade da pessoa humana como elemento basilar para a consideração do meio ambiente como um direito fundamental, em razão de sua essencialidade para a vida humana; b) analisar a fundamentalidade do meio ambiente para a existência da vida humana; c) analisar o dirigismo judicial como elemento efetivador das leis ambientais. O aprofundamento teórico do estudo pauta-se em pesquisa bibliográfica, consubstanciada na leitura de diversas obras, apoiando-se em um método dedutivo. Afinal, o Estado Democrático de Direito alicerça-se sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, considerando-a expressamente como seu fundamento, definindo como cláusula pétrea o direito à vida, e irradiando das expressões constitucionais que não basta o mero viver, pois a Magna Carta assegura o direito a uma vida digna e isto somente se possibilita com a fruição de um meio ambiente sadio e equilibrado, o que coloca este bem em nível de direito e importância fundamental. 

Palavras-chave: Vida sustentável. Meio ambiente como extensão ao direito à vida. Dirigismo judicial em efetivação das leis ambientais. O meio ambiente como ferramenta para uma vida digna.

 

Abstract: This research aims to examine the mechanism of judicial interventionism as a means to accomplish the fundamental right to the environment, under the extension perspective of the right to life as a bet in promoting this essential right to human life, aiming to build a transformation in social nucleus in order to promote sustainable living. In order to verify a response to this issue, it formulated the following research problem: It is possible that through the judicial interventionism can to promote respect for the environment, because of their essentiality to human life? Aiming to respond to the proposed problem, the work has the objective to discuss the possibility of the judicial system promote conflict transformation from the principle of human dignity and substantiation, through its decisions, a sustainable life. And for specific objectives: a) to study the principle of human dignity as the core element for the consideration of the environment as a fundamental right, because of their essentiality to human life; b) analyze the fundamentality of the environment for the existence of human life; c) analyze the judicial interventionism as actualized element of environmental laws. The theoretical study of the agenda to study literature, based on the reading of several works, relying on a deductive method. After all, the democratic state founded up on the principle of human dignity, considering it explicitly as its foundation, defining how entrenchment clause the right to life, and irradiating the constitutional expressions that do not just mere living because Constitution guarantees the right to a dignified life and this is only possible with the enjoyment of a healthy and balanced environment, which puts this well at the level of law and fundamental importance.

Keywords: Sustainable Life. judicial interventionism in effective environmental laws. The environment as a tool for a dignified life.

 

 

1.      INTRODUÇÃO

              O respectivo artigo retrata a utilização do dirigismo judicial como meio de promover as diretrizes normativas sobre o meio ambiente.

O próprio parte da definição da dignidade da pessoa humana, que conforme a posição conferida através do constituinte originário (Art. 1º, III da CF/88) compreende pedra basilar na construção do Estado Democrático de Direito, vinculando todos os demais direitos em sua direção, de forma soberana, no sentido de que, a Carta Política de 1988, baseou-se em garantir mais que a simples possibilidade de vida, mas uma vida com dignidade.

              Neste viés, a autora coloca o meio ambiente sob a proteção da dignidade da pessoa humana, baseada no fato de que este bem compreende extensão ao direito à vida, visto ser impossível viver sem os recursos naturais que apenas o meio ambiente é capaz de promover, como o ar puto, a água potável, o solo fértil e etc.

Por fim é utilizado o dirigismo judicial como meio de materializar este bem no âmago social, ou seja, garantir a todos indistintamente o acesso a este bem, sendo possível até mesmo, a quem seja hipossuficiente, obter acesso à água potável através do judiciário, baseado no art. 5° da CF (igualdade de direitos) bem como, a vedação de pena de morte compreendida na Norma Maior, a qual veda a possibilidade de morte por qualquer meio, inclusive por falta de comida ou água, por exemplo, bem como baseado no art. 1° que expressa o dever de mais que viver, mas viver com dignidade.

 

2.      O CONTEÚDO NORMATIVO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Em vista de compreender uma categoria axiológica aberta, é difícil encontrar um conceito fixo para o princípio da dignidade da pessoa humana. O grau de dignidade de um povo é medido por seu estrato social, no sentido de que quanto maior a dignidade de uma sociedade, maior será sua proeminência social.

Neste sentido Cícero (apud GOLDSCHMIDT, 2009, p. 23) destaca que este princípio possui uma dupla peculiaridade que consiste na racionalidade do indivíduo, que o distingue dos demais seres humanos, aproximando-o de seus semelhantes, e a outra compreende a que o insere no campo da ética, fazendo-o preocupar-se com os demais no âmago da vida social.

Nada obstante, sua visão expressava um conceito adequado acerca da dignidade visto que colocava a necessidade do homem agir com fraternidade, atuando de modo a evitar injustiças, cuja qual pode ocorrer seja através de ações injuriantes, ou por meio de omissões, quando havia possibilidade de agir em prol do próximo e o indivíduo deixa de agir, no entendimento de que não impedir uma injustiça quando havia possibilidade de fazê-lo é pior que cometer a injustiça a próprio punho.

Por decorrência, em vista do caráter abrangente do termo dignidade, consiste em uma tarefa difícil encontrar um significado para a mesma em vista de que seu conceito refere-se a contornos vagos e imprecisos, diferenciado por sua imprecisão e porosidade, bem como por sua característica polissêmica. Assim, conforme expressa Sarlet (2006, p. 40):

 

Uma das principais dificuldades reside no fato de que no caso da dignidade da pessoa, não se cuida de aspectos mais ou menos específicos da pessoa humana, mas, sim, de uma qualidade tida como inerente a todo o ser humano, de tal sorte que a dignidade – como já restou evidenciado – passou a ser habitualmente definida como constituindo o valor próprio que identifica o ser humano como tal, definição esta que, todavia, acaba por não contribuir muito para uma compreensão satisfatória do que efetivamente é o âmbito de proteção da dignidade, na sua condição jurídico normativa.

 

No entanto, mesmo que não seja possível estabelecer um rol taxativo de violações desta garantia, é possível assegurar que a dignidade humana é algo real, visto que em diversas situações se constata sua agressão e desrespeito, por tal motivo é que doutrinadores afirmam ser mais fácil especificar o que a mesma não compreende, do que o que ela engloba, é por este fato que tanto a doutrina, quanto a jurisprudência cuidaram de estabelecer o núcleo protetivo de sua dimensão jurídico normativa, mesmo que não seja possível proclamar uma definição genérica e abstrata de seu conteúdo.

Neste sentido, argumenta-se acerca da imprecisão de um conceito em virtude de que tal ação não se harmonizaria com o pluralismo e a diversidade de valores que se manifestam em um Estado Democrático de Direito, razão pela qual, o respectivo autor manifesta que a limitação deste conceito encontra-se em transformação e desenvolvimento, portanto, agregar a mesma um conteúdo jurídico-normativo, reclama dos órgãos estatais uma invariável concretização e fixação pelo fulcro constitucional.

Cabe ressaltar, que a dignidade constitui qualidade intrínseca do ser humano, sendo irrenunciável e inalienável, compreendendo elemento que qualifica a pessoa humana e desta não pode ser desvinculada, de tal forma que não se pode conjeturar uma possibilidade em que determinado indivíduo venha a ser coisificado.

 

Está, portanto, compreendida como qualidade integrante e irrenunciável da própria condição humana, pode (e deve) ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida, não podendo, contudo (no sentido ora empregado) ser criada, concedida ou retirada (embora possa ser violada), já que existe em cada ser humano como algo que lhe é inerente. Ainda nesta linha de entendimento, houve até mesmo quem afirmasse que a dignidade representa ‘valor absoluto de cada ser humano, que, não sendo indispensável, é insubstituível’. (SARLET, 2006, p. 41):

 

              Por consequência, constata-se que a dignidade não existe apenas onde é protegida pelo Direito e na medida em que este a reconhece, já que a mesma é compreendida como preexistente e anterior a qualquer especulação, no entanto, o Direito compreende meio crucial de sua proteção e promoção, abrindo possibilidade de constatação de que se negou uma definição para a mesma, em virtude de seu caráter de valor próprio e natural de todo e qualquer ser humano.

Assim é irrefutável o fato de que a dignidade não depende de circunstâncias concretas, pois a mesma é inerente a pessoa humana, visto que todos, “são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoa”, nunca esta podendo ser objeto de desconsideração.

 

Nesta mesma linha, situa-se a doutrina de Günter Durig, (...), - onde que – a dignidade da pessoa humana consiste no fato de que ‘cada ser humano é humano por força de seu espírito, que o distingue da natureza impessoal e que o capacita para, com base em sua própria decisão, tornar-se consciente de si mesmo, de autodeterminar sua conduta, bem como o de formar sua existência e o meio que o circunda. (SARLET, 2006, p. 41).

 

Neste sentido, à luz da Declaração Universal da ONU declara-se através do art. 1° que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, (fato este que os obriga a) agir uns para com os outros em espírito e fraternidade”.

Verifica-se que o núcleo temático da dignidade humana vem expresso através da doutrina Kantiana, concentrando-se na garantia de autodeterminação do ser humano, sendo esta considerada em abstrato, de maneira que, até mesmo o incapaz seja possuidor da mesma dignidade que qualquer outra pessoa.

Ressalta-se que não se tenciona equiparar os seres humanos, mas sim, “a intrínseca ligação entre as noções de liberdade e dignidade,” em vistas de que “a liberdade e, por conseguinte, também o reconhecimento e a garantia de direitos de liberdade (e dos direitos fundamentais de modo geral) constituem uma das principais (senão a principal) exigências da dignidade da pessoa humana”, como destaca Sarlet (2006, p. 44).

De outra forma, a dignidade não pode ser considerada como atributo simplesmente inerente da pessoa humana, pois a mesma possui também um sentido cultural, visto que compreende fruto do trabalho da humanidade, razão pela qual, “as dimensões natural e cultural da dignidade da pessoa humana se complementam e interagem mutuamente.” Fato este que foi consagrado por diversos Tribunais, como o Alemão, por exemplo.

Por esta razão, a dignidade da pessoa humana compreende limite e liberdade de ação estatal e da comunidade em geral, pois a mesma possui uma dimensão defensiva e outra prestacional, onde na sua condição limitante, impõe limites na ação do homem quanto aos seres humanos, já no que reporta a ação estatal, impõe obrigatoriedade prestacional através de ações que possibilitem seu exercício pleno, sendo por isto, dependente também da ordem comunitária.

Desde logo, evidencia-se que com o reconhecimento de sua dupla dimensão (cultural e prestacional) não se espera compreendê-la como prestação, ao menos não naquilo em que se sustenta ser a dignidade, que não compreende somente um atributo ou valor inato e intrínseco do ser humano, mas sim, uma condição conquistada pela ação concreta de cada indivíduo, não sendo tarefa dos direitos fundamentais assegurarem a dignidade, mas sim, as condições para a realização de sua prestação.

Considerada a dignidade como limite e tarefa, destaca Dworkin (apud Sarlet, 2006, p. 48), que a mesma possui uma esfera ativa e outra passiva, ambas conectadas, de forma que constituem um valor intrínseco da qualidade humana, de maneira que mesmo aquele que perdeu a consciência da própria dignidade, merece dispô-la, em razão de que o ser humano não pode coisificado, ou seja, visto como instrumento para fins alheios.

Assim em conformidade com Kant o homem compreende um fim em si mesmo, estando, então impedido de servir arbitrariamente desta ou daquela vontade. Ademais:

 

[...] a dignidade constitui atributo da pessoa humana individualmente considerada, e não de um ser ideal ou abstrato, razão pela qual não se deverá confundir as noções de dignidade da pessoa e de dignidade humana, quando esta for referida a dignidade como um todo. Registre-se neste contexto, o significado da formulação adotada pelo nosso Constituinte de 1988, ao referir-se à dignidade da pessoa humana como fundamento da Republica e do nosso Estado Democrático de Direito. Neste sentido, bem destaca Kurt Bayertz, na sua dimensão jurídica e institucional, a concepção de dignidade humana tem por escopo o individuo (a pessoa humana), de modo a evitar a possibilidade do sacrifício da dignidade da pessoa individual em prol da dignidade humana como bem de toda a humanidade ou na sua dimensão transindividual (SARLET, 2006, p. 52).

 

Convém salientar que neste manuscrito a dignidade será abordada em sua concepção transindividual, ou seja, em seu caráter de dignidade humana, de maneira a evidenciar em que a qualidade do meio ambiente influência para o reconhecimento e promoção da mesma, ou seja, de que forma o meio ambiente contribui para dar efetividade ao artigo primeiro, inc. III da Carta Magna? Quais os benefícios que o respeito ao meio ambiente trarão para as presentes e futuras gerações no que tange a dignidade humana? É neste sentido que destaca Sarlet (2006, p. 52):

 

A dignidade humana, para além de ser também um valor constitucional, configura-se como – juntamente com o respeito e a proteção da vida – o princípio de maior hierarquia da CF/88 e de todas as demais ordens jurídicas que a reconheceram. A dignidade da pessoa humana apresenta-se, além disso, como a pedra basilar da edificação constitucional do Estado (Social, Democrático e Ambiental) de Direito brasileiro, na medida em que, aderindo a uma trajetória consolidada especialmente a partir do II Pós-Guerra e inspirada fortemente na visão humanista de Kant e tantos outros, o constituinte reconheceu que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal, o que, diga-se de passagem, demarca a equiparação de forças na relação Estado-cidadão, em vista da proteção e afirmação essencial desse último, especialmente no que tange à tutela e proteção dos seus direitos fundamentais.

 

No núcleo de um Estado Socioambiental, pretende-se que a dignidade compreenda elemento essencial das ações humanas, mas não exclusivo, de maneira que projete sua luz sobre o regramento positivo e guie-o através de suas diretrizes.

Apesar de sempre ser utilizado sob o prisma individual à dignidade humana engloba um caráter social, no sentido de que implica um olhar fraterno entre os cidadãos, já que todos os sujeitos são detentores do mesmo grau de dignidade, por este motivo é que não é possível fazer desta garantia um conceito reducionista.

Assim, sob o ângulo multidimensional, constata-se uma dimensão ecológica, não simplesmente biológica ou física, mas como direito que compreenda a qualidade de vida em geral, aqui incluída a do ambiente em que a vida humana se desenvolve.

 

É importante, aliás, conferir um destaque especial para as interações entre a dimensão natural ou biológica da dignidade humana e sua dimensão ecológica, sendo que esta última objetiva ampliar o conteúdo da dignidade humana no sentido de assegurar um padrão de qualidade, equilíbrio e segurança ambiental (e não apenas no sentido de garantia da existência ou sobrevivência biológica), mesmo que, nas questões ecológicas, muitas vezes esteja em causa a própria existência (e, portanto, sobrevivência) natural da espécie humana, para além mesmo da garantia de um nível de vida com qualidade ambiental. (SARLET, 2006, p. 48).

 

              Não há como afastar do núcleo da dignidade humana os valores ecológicos, formando uma dimensão constitucional ecológica da dignidade humana na letra do Caderno Constitucional, que aborda a idéia de um bem-estar ambiental, capital para a qualidade de vida.

De onde se depreende a necessidade de um direito de proteção mínimo do meio ambiente, com vistas a concretizar a vida humana, pois se encontrando sob a ação de um meio ambiente doente, a vida humana estaria sendo violada em seu núcleo basilar.

Garantias como da qualidade, do equilíbrio e da segurança ambiental passariam a compor a letra do texto normativo acerca da dignidade, como meio de reconhecer o “direito-garantia ao mínimo existencial ecológico”. Entendimento este que será evidenciado minuciosamente através do próximo item.

 

3.      O MEIO AMBIENTE EM EXTENSÃO AO DIREITO À VIDA

Neste ponto, entra em cena Pérez Luno, sustentando uma dimensão intersubjetiva da dignidade, partindo da conjugação do ser humano em sua esfera social, como ser desvinculado de sua condição individual em prol da comunidade, pois acima da definição ontológica de dignidade (atributo individual), convém considerá-la sob sua forma instrumental.

Isto é através de seu ângulo social, “fundada na participação ativa de todos na ‘magistratura moral’ coletiva, não restrita, portanto, a idéia de autonomia individual, mas que pelo contrário, parte-se do pressuposto da necessidade de promoção das condições de uma contribuição ativa” atuando no reconhecimento e proteção do contíguo de direitos e liberdades indispensáveis, conforme define Sarlet (2006, p. 48) comparando a uma ponte dogmática, interligando os indivíduos entre si.

 

De qualquer modo, o que importa, nesta quadra, é que se tenha presente a circunstancia, oportunamente destacada por Gonçalves Loureiro, de que a dignidade da pessoa humana - no âmbito de sua perspectiva intersubjetiva – implica uma obrigação geral de respeito pela pessoa (pelo seu valor intrínseco como pessoa), traduzida num feixe de deveres e direitos correlativos, de natureza não meramente instrumental, mas sim relativos a um conjunto de bens indispensáveis ao ‘florescimento humano’. (SARLET, 2006, p. 54).

 

Por consequência, percorridas mais de quatro décadas desde que a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 1972), que efetuou um alerta sobre o destino tanto do planeta Terra, quanto da espécie humana, em um evento que “foi histórico e fez história. E na história, que é descrita e analisada pelos prósperos, o passado se fez presente de alguma forma, mediante o conhecimento que dele temos e as lições que dele herdamos”, como expressa Milaré (2006, p. 1056) foi que o ser humano se descortinou sobre a necessidade de proteção ao meio ambiente.

Ocorre que, por milênios não se falou, nem cogitou acerca do Direito Ambiental, construindo um vazio absoluto, ocasionando o abandono deste bem único para a espécie humana. Sobre esta inércia, destaca-se que:

 

Foi um vazio tenebroso e caótico, durante o qual e no qual, a Terra se vinha ressentida da extinção gradual a que parecia condenada. O ser humano impunha-lhe ‘deveres’, mas lhe negava direitos, qual filho pródigo e desnaturado, que arranca e extrai o quanto pode sem retribuir com o necessário cuidado e carinho. Ela chegou à beira da exaustão, quase ferida de morte. A Natureza, então, faz valer os seus direitos e impõe sérios deveres ao Homem: é que a consciência da sustentabilidade deixou claro que os direitos da espécie dominante somente podem ser assegurados pelo cumprimento dos seus respectivos deveres para com o Planeta aparentemente dominado. (MILARÉ, 2011, p. 1057).

 

Neste enfoque, “o lampejo que irrompeu da consciência humana em geral produziu o clarão que se ateou na consciência jurídica através do Direito do Ambiente, posto que, o direito em seu caminho, ora rápido, ora lerdo, visa acompanhar as transformações sociais, andando no encalço dos problemas da humanidade, de maneira a transformar o ordenamento jurídico conforme as necessidades sociais”.

Ocorre que a cada instante avistam-se no horizonte, novas crises maiores de caráter internacional em uma sociedade que, descrente, “insiste por fechar os olhos e ouvidos para a realidade”. Por consequência, “nuvens pesadas encastelam-se sobre os destinos do Planeta. Há um limite para o crescimento, assim como há um limite para a inconsciência”, conforme destaca Milaré (2006, p. 1057). Foi neste instante, “que o brado e a luz de Estocolmo se fizeram presentes,” conscientizando os seres humanos de maneira ampla.

Por conseguinte, devido às situações cruciais à que o Planeta está disposto, o Direito foi sacudido pela questão Ambiental, fazendo com que a árvore da sistemática jurídica, recebesse enxertos, produzindo, um ramo novo, destinado a promover e proteger um novo tipo de relação, ou seja, a relação entre a sociedade e a natureza, pois a Terra sob o olhar de um grande organismo vivo destacaria ao ser humano a posição de sua consciência, ou seja, “o espírito humano é chamado a fazer às vezes da consciência planetária.”

Originando o conhecimento jurídico ambiental, munido pela ética e pela ciência, passando a guiar os rumos do globo terrestre. Nada obstante, acresce-se o direito ambiental por princípios próprios, com âmago constitucional e com alicerce infraconstitucional, coadunando-se às demais regras jurídicas de maneira a delimitá-las em seu respeito e consideração, compreendendo um ramo especializado na antiga árvore jurídica.

 

Sim, um Direito especializado – e não autônomo -, posto ser certo que o Direito é um só, no qual a influência recíproca e a relação contínua entre os diversos ramos é inevitável. Como qualquer outra ciência, ressalta Juraci Perez Magalhães, o Direito ‘não admite uma subdivisão mecânica das suas partes. É um corpo vivo, cujos membros são todos eles conexos entre si, não podendo assim nenhum ramo da ciência jurídica fazer abstração dos outros. Em razão disso, os critérios utilizados para reconhecer se um direito é ou não autônomo carecem de fundamento científico. ’Mais adequado, assim, falar-se em especialização do que de autonomia. (MILERÉ, 2011, p. 1059). (Grifos do original).

 

Em conformidade com Reale (apud MILARÉ. 2011, p. 1059), “as disciplinas jurídicas representam e refletem um fenômeno jurídico unitário, que precisa ser examinado”, em razão de que um ramo se interliga ao outro, formando a árvore da justiça.

Outrossim, o Direito do Ambiente, compreende “um complexo de princípios e normas coercitivas reguladoras das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade”, na expressão de Milaré (2011, p. 1059).

Para que se possa dar efetividade a esta disciplina jurídica, faz-se mister o auxílio principiológico e normativo, como norteador, de maneira a proporcionar um relacionamento harmonioso e equilibrado entre o ser humano e a natureza, normatizando a sanidade ambiental em todas as suas formas (ambiente natural e ambiente artificial), atuando com cunho sancionador, aplicáveis à lesões ou ameaças de direito, visto que sua missão encarrega-se de conservar a vitalidade, capacidade e diversidade de suporte do globo terrestre, para usufruto da sociedade intergeracional.

Ocorre que devido ao progressivo quadro de degradação evidenciado em toda a circunstância terrestre, o meio ambiente solidificou-se na colocação de valor supremo da coletividade, passando a integrar-se ao conjunto dos direitos fundamentais de terceira geração incorporados aos textos capitais dos Estados Democráticos de Direito.

Ascende-se como valor comparado ao da dignidade humana e ao da democracia, de maneira que “se universalizou como expressão da própria experiência social e com tamanha força, que já atua como se fosse nato, estável e definitivo, não sujeito à erosão do tempo”.

Ademais, o autor (2011, p. 1064/1065) destaca que “o reconhecimento do direito a um ambiente sadio configura-se,” como extensão ao direito à vida, “quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa existência - a qualidade de vida -, que faz com que valha a pena viver.

 

Esse novo direito fundamental, reconhecido pela Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano de 1972 (Princípio I), reafirmado pela Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 (grifos do original) e pela Carta da Terra de 1997 (Princípio 4), vem conquistando espaço nas Constituições mais modernas, como, por exemplo, as de Portugal, de 1976 (art. 66), da Espanha, de 1978 (art. 45) e do Brasil, de 1988 (art. 225).

 

Ainda neste curso evidencia-se que:

 

Deveras, ‘o caráter fundamental do direito à vida torna inadequados enfoques restritos do mesmo em nossos dias; sob o direito à vida, em seu sentido próprio e moderno, não só se mantém a proteção contra qualquer privação arbitrária da vida, mas, além disso, encontram-se os Estados no dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e todos os povos. Neste propósito, têm os Estados a obrigação de evitar riscos ambientais sérios à vida. ’ (MILARÉÉ, 2011, p. 1064/1065).

 

A adoção deste princípio através da Carta Magna tencionou nortear toda a legislação vigente, dando uma nova conotação à mesma, no intuito de fornecer uma interpretação coerente por meio da orientação político-institucional então vigente.

É, indubitavelmente, um princípio transcendental do sistema jurídico ambiental, brilhando com status de cláusula pétrea, irradiando sua luz para o Estado Constitucional Ambiental.

Por decorrência por meio do princípio da solidariedade intergeracional, busca-se “assegurar a solidariedade das presentes e futuras gerações, para que também estas possam usufruir de forma sustentável, dos recursos naturais”, atuando “enquanto a família humana e o planeta Terra puderem coexistir pacificamente”, no entendimento de Milaré (2011 p. 1064/1065).

 

Em círculos ambientalistas e universitários, fala-se muito em dois tipos de solidariedade: a sincrônica e a diacrônica. A primeira, sincrônica, (“ao mesmo tempo”), fomenta as relações de cooperação com as gerações presentes, nossas contemporâneas. A segunda, a diacrônica (“através do tempo”), é aquela que se refere às gerações do após, ou seja, as que virão depois de nós, na sucessão do tempo. Preferimos falar em solidariedade intergeracional, porque traduz os vínculos solidários entre as gerações presentes e com as gerações futuras. (MILARÉ, 2011, p. 1064/1065).

 

Perfaz-se a importância do bem exposto “ante a constatação de que a generosidade da Terra não é inesgotável, e do fato de que já estamos consumindo cerca de 30% além da capacidade planetária de suporte e reposição”.

Posto que, em conformidade com o Relatório Planeta Vivo 2010, da Rede WWF, foram constatados que “estamos vivendo além de nossas possibilidades, alimentando-nos de porções que pertencem às gerações ainda não nascidas”.

Ocorre que “os custos do mau uso da natureza não devem ser debitados irresponsavelmente na conta das porvindouras gerações. Seremos questionados e cobrados pelos futuros ocupantes desta casa”, no entendimento de Milaré (2011, p. 1064/1065).

Esta problemática contem tamanha importância que diversas declarações proclamaram seu conteúdo, é o exemplo da Declaração de Estocolmo acerca do Meio Ambiente Humano (1972), cuja mesma expressou no Princípio 2 que os recursos naturais devem ser preservados, por meio de cuidadoso planejamento em benefício da solidariedade intergeracional.

Por consequência, na Declaração do Rio de Janeiro a respeito do Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), averbou o Princípio 3, destacando que o direito ao desenvolvimento precisa ocorrer de forma a respeitar as presentes e futuras gerações.

No mesmo sentido, o ordenamento jurídico pátrio, salienta no caput do art. 225 da Epístola Maior, acerca da solidariedade intergeracional, impondo ao Poder Público e a coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente em conformidade com seus preceitos.

 

É sabido que, no reino da natureza, há forças de atração e repulsa, havendo também predadores e presas; tudo, no entanto, converge para o objetivo. Já entre os humanos, além daquelas antinomias, é bem conhecida a força dos instintos cegos que não obedecem nem a razão, nem a vontade esclarecida. Não obstante, existe um destino comum a ser alcançado. (MILARÉ, 2011, p. 1064/1065).

 

Sem embargo, sempre haverá tensões, posto que é necessário conscientizar-se que a solidariedade humana, em sua relação pessoal “e destas para com o Planeta, é uma fonte do saber e do agir.” Ademais a solidariedade foi prevista desde os primórdios no ordenamento tanto jurídico quanto social, compreendendo fonte ética do Direito.

Ante o exposto, verifica-se o prestígio que o meio ambiente possui para a vida de qualquer ser humano, constituindo fator indispensável para a sadia qualidade de existência, atuando em extensão ao direito à vida, compreensão esta que será abordada com maior profundidade através do item a seguir.

 

4.      O DIRIGISMO JUDICIAL EM EFETIVIDADE AO MEIO AMBIENTE

Assevera Alexy (2009, p. 04) que o direito possui dois elementos de definição, compreendendo o da legalidade de acordo com o “ordenamento ou dotada de autoridade e o da eficácia social.” Sendo que de acordo com a teoria positiva, o direito depende unicamente do que é estabelecido ou eficaz na ordem vigente, já por meio da teoria não positivista verifica-se a defesa da tese da vinculação, ou seja, o direito conectado com a moral, cultura e ética.

Ocorre que um positivismo estrito é de certa forma ultrapassado, pois conforme a consciência da parte majoritária dos doutrinadores, o fato de a lei e o direito coincidirem não constitui uma constante, posto que “o direito não é igual à totalidade das leis escritas”, como declara o autor (2009, p. 10).

Posto que, um direito para ser pleno precisa compreender em seu sistema normativo a legalidade, a eficácia social e a correção material.

Neste sentido destaca Streck (2011, p. 69), que “é preciso compreender que nos movemos numa impossibilidade de fazer coincidir texto e sentido do texto (norma), isto é, movemo-nos numa impossibilidade de fazer coincidir discursos de validade e discursos de adequação”, posto que, no entendimento do respectivo, “se o direito é um saber prático, a tarefa de qualquer teoria jurídica é buscar as condições para a concretização de direitos e, ao mesmo tempo, evitar decisionismos, arbitrariedades e discricionariedades interpretativas”.

O autor vincula-se à ideologia de uma forma material substancial da Carta Magna, pois para o próprio a promoção dos direitos fundamentais sociais, compreende condição para a própria validade constitucional, posto que, não se verificaria a necessidade de uma Epístola Maior caso a mesma não possuísse aplicabilidade e poder de coerção, estabelecendo um compromisso entre a Constituição e a sociedade.

Neste entendimento, Habermas (apud STRECK, 2011, p. 85) propõe um modelo de democracia constitucional que não tem como condição prévia fundamentar-se nem em valores compartilhados, nem em conteúdos substantivos, mas em procedimentos que asseguram a formação democrática da opinião e da vontade e que exigem uma identidade política ancorada não mais em uma nação de cultura, mas sim em uma nação de cidadãos.

Por consequência, Habermas (apud STRECK, 2011, p. 83-85) vê no Judiciário o centro do sistema jurídico, mediante a distinção entre discursos de justificação e discursos de aplicação – exigindo-se a exigência de imparcialidade não só do Executivo, mas também do juiz na aplicação e definição cotidiana do direito, propondo então, um modelo de democracia constitucional que não tenha como condição prévia fundamentar-se nem em valores compartilhados, nem em conteúdos substantivos, mas em procedimentos que asseguram a formação democrática da opinião e da vontade e que exigem uma identidade política ancorada não mais em uma nação de cultura, mas sim em uma nação de cidadãos.

Sintetiza a tese procedimentalista que o Judiciário deveria assumir o papel de um intérprete que põe em evidência, inclusive contra maiorias eventuais, o direito produzido democraticamente, especialmente o dos textos constitucionais.

No entanto, através do modelo substancialista – que em parte subscreve o autor – trabalha-se a perspectiva de que a Constituição estabelece as condições do agir político-estatal, possuindo em suas normas um caráter diretivo, “é o constitucionalismo-dirigente que ingressa nos ordenamentos dos países após a Segunda Guerra”, como declara Streck (2011, p. 88-91).

É implacável que, “com a positivação dos direitos sociais-fundamentais, o Poder Judiciário passe a ter um papel de absoluta relevância, mormente no que diz respeito à jurisdição constitucional”, posto que, “se existe algo que une substancialistas como eu e procedimentalistas como Marcelo Cattoni (apud STRECK, 2011, p. 88-91) é a defesa da democracia, dos direitos fundamentais e do núcleo político essencial da Constituição”, pois neste instante, somente “os caminhos é que são diferentes”.

Habermas parte do pressuposto que os atos ligados à razão prática são atos solipsistas, ligados à filosofia do sujeito, e, portanto, com estrutura prescritiva a priori, dependentes de fundamentação posterior. “Assim os atos do mundo prático dependerão dessa fundamentação anterior prévia, comprometendo-se os indivíduos com pressupostos pragmáticos contrafactuais.”

 

[...] a verdade deixa de ser conteudística para ser uma verdade como idealização necessária. É uma verdade argumentativa, atingida por consenso. Não há fundamentação válida de qualquer enunciado (norma) que não seja pela via argumentativa. A fundamentação é prima facie, porque somente assim é possível a universalização. (STRECK, 2011, p. 93).

 

 

Assim, “a constituição do ideal de fala tem como condição de possibilidade o agir comunicativo” e não mais a subjetividade, mas a própria linguagem funda a razão prática.

Em virtude de que, “o giro linguístico é resultado das rupturas provocadas por Wittgenstein e Heidegger (apud STRECK, 2011, p. 99-101), que mostraram a impossibilidade de fundamentar a razão". É como se houvesse um novo “fundamento de validade de cunho paradigmático” que afeta todas as categorias do conhecimento.

Neste consenso, “a razão prática sustentada nesse sujeito morreu antes da possibilidade de sua substituição, estando formada, a partir de então, na linguisticidade e no modo prático de ser-no-mundo.”

Por decorrência, afirma o autor que falta em Habermas uma dimensão fundamental que é o paradigma da compreensão, da diferença ontológica pela qual entende que todo discurso entitativo fundamenta-se, necessariamente, em outro discurso, da pré-compreensão, que chama de ontológico e não clássico.

Afasta a idéia do irracionalismo atribuído a Heidegger e a Gadamer, justamente por ser a filosofia hermenêutica responsável por abrir o espaço de que todo o argumentar é possível. Atinente a isso, enfatiza-se acerca da necessidade de racionalizar-se sobre a importância crucial que possui o meio ambiente na existência do homem, pois que, o próprio chega a ser considerado com extensão do direito a vida.

Ocorre que, em conformidade com J.J. Rousseau (2012, p. 23), a pessoa em seu estado natural, que compreende aquele que não recebe submissão estatal, seria egoísta e insegura, assim para conviver em sociedade o mesmo elabora um contrato social, efetivando a ordem social.

Formando um corpo soberano (sociedade) através da multidão reunida, onde que os particulares que o compõe não podem ter interesses contrários ao deste, assim o dever e o interessem os remetem a se auxiliarem mutuamente.

Ao pactuar este contrato, o homem constitui regras de relação social, no então, não delimita acerca da convivência exterior, pautando um agir do homem de forma desregulada e indefinida, como se os recursos naturais fossem infinitos, primando sempre somente à razão do homem, ou seja, colocando-se no centro do universo. E assim seguiu no decorrer do tempo.

Nada obstante a natureza fora destituída de importância, como acima exposto, ficando abandonada ao desrespeito e desmedida dos atos humanos, até que incapaz de suportar tamanha desmoralização reage e entra em crise, utilizando de sua linguagem para demonstrar as consequências da irracionalidade e consumismo imoderado do homem (enchentes, alterações climáticas, etc.), cobrando uma reação do ser humano, alertando-o sobre as consequências trágicas de seu esquecimento e desvalor.

Foi então que Michel Serres, propôs um novo modelo de convivência humana, na elaboração de um Contrato Natural entre o ser humano e o meio ambiente, acrescentando a este último seus direitos e proteção inerentes, preservando-o e o reconstituindo, pois que o homem age sobre a terra como um parasita de modo que:

 

Na sua própria vida e através das suas práticas, o parasita confunde correntemente o uso e o abuso; exerce os direitos que a si mesmo se atribui, lesando o seu hospedeiro, algumas vezes sem interesse para si e poderia destruí-lo sem disso se aperceber. Nem o uso nem a troca têm valor para ele, porque desde logo se apropria das coisas, podendo até dizer-se que as rouba, assedia-as e devora-as. Sempre. abusivo, o parasita. (SERRES, 1990, p. 63).

 

 

Assim, mesmo o direito age em uma mão única em que prioriza e circunda apenas as vontades da pessoa de maneira que a sociedade “apanha tudo e não deixa nada”, pois que o efeito da normatividade jurídica é mínimo frente ao impacto destrutivo causado ao meio ambiente, mas ainda assim a balança da justiça luta para contrabalancear os efeitos deste desequilíbrio abusivo, que leva consigo a própria possibilidade de uma convivência equilibrada entre homem e meio ambiente, de maneira a desestabilizar a sadia qualidade de vida, consumindo os recursos naturais irrecuperáveis do meio ambiente, danificando a qualidade de vida tanto das presentes quanto das futuras gerações.

Para o respectivo autor o mundo encaminha-se para seu fim, pois o direito atua limitando o parasitismo entre os homens, porém, esquece de delimitar este mesmo parasitismo sobre as coisas:

 

Resta-nos pensar num novo equilíbrio, delicado, entre esses dois conjuntos de equilíbrios. O verbo pensar, próximo de compensar, não conhece que eu saiba outra origem para além dessa justamente pesada. É a isso que hoje chamamos pensamento. Eis o direito mais geral para os sistemas mais globais. (SERRES, p. 1990, p. 65).

 

 

A partir de então, o ser humano reaparece no mundo, ultrapassando a racionalidade do local para o global renovando a relação com o planeta Terra, “outrora o nosso dono e ainda há pouco o nosso escravo, em todo o caso sempre o nosso hospedeiro e agora o nosso simbiota.” Enfatizando, um “retorno a natureza”.

 

O que implica acrescentar ao contrato exclusivamente social a celebração de um contrato natural de simbiose e de reciprocidade em que a nossa relação com as coisas permitiria o domínio e a possessão pela escuta admirativa, a reciprocidade, a contemplação e o respeito, em que o conhecimento não suporia já a propriedade, nem a ação o domínio, nem estes os seus resultados ou condições estertorarias. Um contrato de armistício na guerra objetiva, um contrato de simbiose: o simbiota admite o direito do hospedeiro, enquanto o parasita - o nosso atual estatuto - condena à morte aquele que pilha e o habita sem ter consciência de que, a prazo, se condena a si mesmo ao desaparecimento. (SERRES, 1990, 64/65).

 

 

Ocorre que “o direito de dominação e de propriedade reduz-se ao parasitismo.” Enquanto, o direito de simbiose delimita-se pela reciprocidade, assim, aquilo que a natureza entrega ao homem, o mesmo deve devolver a ela, tornando-se então um sujeito de direitos.

De maneira a respeitar e promover o direito a vida de todo e qualquer ser humano, pois que sem os elementos naturais, impossível seria a possibilidade da própria existência, tamanha a fundamentalidade da questão para a sociedade, pois que o meio ambiente como bem comum do povo, compreende como direito e dever de todos, garantido pela própria dignidade da pessoa humana, posto que um viver longe de um ambiente saudável coloca-se em contrariedade aos preceitos de um Estado Democrático de Direito, onde que a dignidade da pessoa humana entra como base afirmativa de todos os direitos natos do homem, e dentre estes se considera o alcance de um meio ambiente sadio e equilibrado.

 

5.      CONCLUSÃO

Por corolário defende-se a fundamentalidade do respeito ao meio ambiente para a própria promoção da sadia qualidade de vida do ser humano, pautado no fundamento da dignidade da pessoa humana como base afirmativa e efetiva de ação socioambiental.

Pois que, a núcleo basilar constitucional molda-se na dignidade da pessoa humana como um direito próprio e intransferível do homem, onde que nenhum ser humano poderá ser rebaixado ao estado de coisa, em extensão, certos direitos lhes são inalienáveis e dentre estes se encontra a prerrogativa de um meio ambiente saudável e equilibrado.

Direito este intergeracional, posto que, em vista de sua crucial importância as ações degradativas contemporâneas produzem resultados nas futuras gerações, causando um efeito atrasado, e muitas vezes irreparável, como o exemplo de uma espécie em extinção, pois que, depois de extinta não há possibilidades de retorno, e como o meio ambiente compõe um ciclo em que cada ser que habita no espaço terrestre possui sua função para o funcionamento do próprio planeta, extinta a espécie, automaticamente, causará uma quebra naquele ciclo, ocasionando efeitos, muitas vezes irreparáveis, no funcionamento natural do planeta Terra.

É neste ponto que se enfatiza a importância de valorizar o meio ambiente, e efetivar as leis em seu favor, pois que sua fundamentalidade compreende uma extensão do direito a vida, como apregoado, pois que, sem o meio ambiente natural, impossível seria a simples possibilidade de existência no globo terrestre.

 

REFERÊNCIAS

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DWORKIN, Ronald. El dominio de la vida. Una discusión acerca del aborto, la eutanasia y la liberdad individual. Barcelona: Ariel, 1999.

 

GOLDSCHMIDT, Rodrigo. Flexibilização dos Direitos Trabalhistas: ações afirmativas da dignidade da pessoa humana como forma de resistência. São Paulo: LTr, 2009.

 

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco, doutrina. Jurisprudência. Glossário. 7ª Ed. rev. atual., e reform. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social: princípios de direito público. Trad. J. Cretella Jr.e Agnes Cretella. – 3 ed. rev.- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

SARLET, Ingo Wolfgang.  Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4ª Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

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SERRES, Michel. O contrato natural. Trad. Serafim Ferreira. Portugal: Editions François Bourin, 1990.

STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.


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