sábado, 2 de agosto de 2014

POSSIBILIDADE DE CONSIDERAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS COMO DIREITOS FUNDAMENTAIS NA EXPECTATIVA SUBJETIVA



Artigo Publicado na Revista  Unoesc & Ciência - ACSA
Disponível em: http://1drv.ms/1Mc3b2q

 POSSIBILIDADE DE CONSIDERAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS COMO DIREITOS FUNDAMENTAIS NA EXPECTATIVA SUBJETIVA

 

Possibility of consideration of social rights as fundamental rights in subjective expectations

 

Aline Oliveira Mendes de Medeiros[1]

Resumo: O respectivo manuscrito trata acerca da possibilidade de se considerar os direitos sociais como direitos fundamentais, assim como analisar a aplicabilidade deles na ótica subjetiva. Ocorre, porém, que para a concretização dessa medida, o Judiciário, órgão incumbido pela resolução da questão, obriga-se a analisar teorias edificadoras dessa atuação ativista, bem como a teoria da reserva do possível, a qual atua como limitadora desse feito. Dessa forma, com base no fato de que a Constituição garante a dignidade da pessoa humana, induzindo ao magistrado e ao Estado a verificação de um mínimo existencial, sem o qual nenhum ser humano é capaz de subsistir de maneira digna, verifica-se que essa possibilidade não apenas é possível, como também é legítima, sendo edificada por meio do posicionamento jurisprudencial.

Palavras-chave: Direitos fundamentais. Direitos sociais. Dignidade da pessoa humana.

Abstract: This manuscript is about the possibility of considering the social rights as fundamental rights, as well as analyzing their applicability in subjective viewpoint. Occurs, however, that to achieve this measure, the Judiciary body, responsible for resolving the matter, undertakes to analyze builder theories of this activist action, as well as the theory of reserve for contingencies, which acts as limiting this feat. Based on the fact that the Constitution guarantees human dignity, leading to the magistrate and the rule checking an existential minimum, without which no human is able to can survive in a dignified way. Thus, it turns out that this is not only possible but also legitimate, being built through the jurisprudential position.

Keywords: Fundamental rights. Social rights. Human dignity.

 

1.      CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho tencionou abordar de forma específica a possibilidade de considerar-se os direitos sociais elencados principalmente no art. 6º da Carta Máxima como direitos fundamentais, bem como analisar a aplicabilidade deles na esfera subjetiva, isto é, a situação jurídica estabelecida por uma norma, em que ela institui ao seu titular o direito a um determinado ato frente ao seu destinatário, cujo qual, por sua vez, vê-se no dever de executar este ato.

Dessa forma, foram feitas pesquisas bibliográficas sobre a temática, e ainda observações em casos práticos, por meio de pesquisas jurisprudenciais; acerca da temática, salienta-se que o método utilizado neste manuscrito consiste no indutivo, em que o leitor, com base nos dados estabelecidos, concluirá seu posicionamento.

Como forma de direcionar o autor, este documento foi composto através da análise subjetiva dos direitos sociais, considerando-os no enfoque dos direitos fundamentais; por conseguinte, foram estabelecidas teorias que reforçam a edificação destes e ainda, balizam-nos para que não extrapolem os limites legais, as quais concernem à teoria do mínimo existencial, na qual o Estado se encontra obrigado a garantir um mínimo legal a todo o ser humano. Posteriormente, atêm-se ao princípio da subsidiaridade, em que o juiz é legalizado para atuar por meio do ativismo judicial, estando essas ações pautadas na reserva do possível, a qual se refere ao justo motivo para que o Estado se abstenha de praticar o ato que lhe cabe.

Como meio de reforçar esse posicionamento, foram introduzidas jurisprudências acerca da temática, findando o respectivo manuscrito mediante as considerações finais.

 

2.      DIREITOS SOCIAIS NA PERSPECTIVA FUNDAMENTAL: SUBJETIVIDADE

Como se sabe, os direitos fundamentais sociais estão englobados na segunda dimensão de direitos; não obstante, cabe ressalvar, conforme preleciona Sarlet (2009), que apesar do marco diferencial destes direitos ser de cunho positivo, eles também podem se apresentar como direitos de liberdades negativas, isto é, direitos de defesa.

Assim, Sarlet e Figueiredo (2010) esclarecem:

 

[...] os direitos sociais abrangem tanto os direitos (posições ou poderes) à prestações (positivos), quanto direitos de defesa (direitos negativos ou a ações negativas), partindo-se, aqui, do critério da natureza da posição jurídico-subjetiva, reconhecida ao titular do direito, bem como, da circunstância de que, os direitos negativos (notadamente os direitos à não intervenção na liberdade pessoal e nos bens fundamentais tutelados pela Constituição), apresentam uma dimensão “positiva” (já que sua efetivação reclama uma atuação positiva do Estado e da sociedade), ao passo que, os direitos a prestações (positivos), fundamentam, também, posições subjetivas “negativas”, notadamente, quando se cuida de sua proteção contra ingerências indevidas por parte dos órgãos estatais, de entidades sociais e também, de particulares.

Da separação do direito por dimensões, constata-se que eles foram se afirmando conforme o momento histórico e a necessidade da sociedade, caracterizadas por conquistas sociais em defesa da liberdade, de forma gradual. No entanto, há divergências doutrinárias quanto a essa classificação de direitos por dimensões, mesmo que didática, pois a própria é utilizada como escape para os governos que, descomprometidos com a efetivação dos direitos sociais, argumentem para o sentido de que os direitos civis e políticos estariam em primazia, ou vice-versa.

Posicionamento equivocado, pois Coelho (2009) desponta acerca da necessidade do reconhecimento da indivisibilidade dos direitos fundamentais, para que essas denominadas dimensões de direitos não sejam negligenciadas ou violadas, ainda que, sob a falsa afirmação de promoção de outras garantias, em razão do fato de que essa visão fragmentada interessa, sobremaneira, somente “[...] aos regimes autoritários, ao autoritarismo sem bandeiras, seja no plano político, seja no plano econômico-social.”

Assim, os direitos sociais, conforme Barreto (apud KELBERT, 2011), atuam como “[...] núcleos integradores e legitimadores do bem comum, pois será, através deles, que se poderá garantir a segurança, a liberdade, a sustentação e a continuidade da sociedade humana.” Nesse sentido, Olsen (2011) salienta que os direitos fundamentais possuem duas acepções a se destacar, sendo elas a objetiva, que corresponde aos objetivos basilares da comunidade e a subjetiva, qual seja a de um direito individual plenamente exigível.

No que diz respeito à concepção objetiva dos direitos fundamentais, Sarlet (2009), aborda que, por se tratarem de valores e fins que o Estado deve concretizar, esses direitos devem ser verificados sob a perspectiva social, “[...] na qual se encontra inserido e não pode ser dissociado”, podendo-se articular no sentido de uma “[...] responsabilidade comunitária dos indivíduos”, estando, portanto, valoramente ligada à percepção objetiva dos direitos fundamentais, e, consequentemente, também, vinculada a esta perspectiva, encontra-se a obrigação indissociável do Estado, de promover e garantir os direitos fundamentais.

O que insere dizer que mesmo o bem-comum do Estado-Social, (Estado e Sociedade), estando em primazia, não deve-se com isso abandonar os direitos individuais de um cidadão. Assim, também, pondera Olsen (2011), para a qual:

[...] esta dimensão protetora revela, em verdade o caráter positivo que todos os direitos fundamentais podem assumir, mesmo os clássicos direitos de defesa, na medida em que todos exigiriam – como função autônoma e independente de sua subjetividade – a proteção do Estado, para a qual, por certo, necessário se faz a adoção de medidas prestacionais. A partir dessa perspectiva, torna-se mais evidente a conclusão a que chegaram Cass Sustein e Stephen Holmes, no sentido de que, todos os direitos fundamentais, são positivos e têm um custo.

Dessa forma, enseja-se dizer, que alguns casos de direitos fundamentais individuais, - aqui, considera-se, como direito fundamental, também os direitos sociais-, devem ser assegurados, mesmo que tenha algum custo, em razão de sua necessidade, valoridade e viabilidade, como por exemplo cito como exemplo o caso de um policial que, para o desempenho do seu serviço, na perseguição de um sujeito, encerra por deteriorar a viatura, muito embora, este exemplo, não defina o judiciário, no entanto, se presta como baliza para o caso em que este mesmo policial seja acometido de uma doença grave em razão do acidente e com isto, não tenha condições financeiras de custear o dano causado ao Estado.

Desta forma, conforme Canotilho (2002), “[...] diz-se, que uma norma garante um direito subjetivo quando o titular de um direito tem, face ao seu destinatário, o direito a um determinado ato, e este último tem o dever de, perante o primeiro, praticar esse ato.” Conforme Clève (2003), a sua dimensão subjetiva desempenha três funções, sendo elas defesa, prestação e não discriminação, ou seja:

[...] os direitos fundamentais (i) situam o particular em condição de opor-se à atuação do poder público em desconformidade com o mandamento constitucional, (ii) exigem do poder público a atuação necessária para a realização desses direitos, e, por fim, (iii) reclamam que o Estado coloque à disposição do particular, de modo igual, sem discriminação [...], os bens e serviços indispensáveis ao seu cumprimento. Então, salvo nas hipóteses de ação afirmativa, onde poderá haver uma discriminação (temporariamente justificável) que busque atender determinadas finalidades constitucionais [...], a exigência é de que, os serviços sejam colocados à disposição de todos os brasileiros [...], implicando para o particular, o poder de reivindicar junto ao Judiciário, idêntico tratamento.

 

Não obstante, ocorre que existem divergências doutrinárias no que se refere à atuação dos direitos subjetivos, em decorrência do próprio objeto do direito fundamental subjetivo, que, no entender de Sarlet (2009), vincula-se ao fato de que a liberdade da pessoa individual não possui um leque de garantias uniformizadas, consistindo na existência de diferentes classificações, quanto ao grau de exigibilidade desses direitos, bem como ao fato de que “[...] a complexidade das posições jurídicas dos direitos fundamentais, que podem se constituir em direitos, liberdades, pretensões e poderes de natureza diversa e ainda dirigir-se a diferentes destinatários.”

Em continuação, o mencionado autor afirma que a eficácia imediata se encontra definida nos termos do art. 5º, § 1º da Constituição. Assim, partindo desse pressuposto, Marmelstein (2013) salienta que a cláusula de aplicação imediata é a aplicabilidade expressa do princípio da máxima efetividade, inerente a todas as normas constitucionais. Acerca disso, o próprio fez menção a Krugrer, ao denotar que são as leis que devem girar em torno dos direitos fundamentais, e não o contrário, em consequência do caráter primordial, da efetivação dos direitos fundamentais, não havendo, portanto, nenhuma possibilidade de abstenção jurídica, desse dever legal.

Destarte, também, preceitua Mello (2011), para quem a Constituição não é apenas uma ideologia, mas o resultado de um ideário, isto é, consiste na conversão de necessidades e ideologias em positivações. Ainda nesse sentido, explana Olsen (2011), para quem “[...] a exigibilidade não é condição de existência do direito, ele não existe porque é exigível. Ele (simplesmente) existe, razão pela qual deve ser exigível.” Em continuação à sua explanação, a autora faz citação a Eros Grau, in verbis:

Afirmar que determinadas normas constitucionais têm sua eficácia dependente da edição de normas pelo legislador ordinário, equivaleria a uma “revogação de fato”, sempre que o legislador se omitisse no seu dever de concretizar a norma constitucional. Seria inverter a hierarquia das normas jurídicas, na medida em que, uma lei ordinária acabaria por se sobrepor a uma norma constitucional. Nestas condições, o autor defende que, as normas de direitos sociais, ainda que, prevejam a possibilidade de integração do seu conteúdo, por legislação ordinária, não dependem desta, para sua interpretação e aplicação, gerando verdadeiros direitos subjetivos, aos seus titulares.

Assim, evidencia-se que, em alguns casos, aguardar que o legislador venha a propor ou até, promulgar uma lei, pode ser prejudicial ao indivíduo que encontra-se, diante de uma necessidade iminente de que o direito lhe resguarde, e, unicamente, por ausência de lei este direito vê-se suspenso, deixando o sujeito de direitos as margens da sociedade, esta situação ganha proporções maiores quando este direito vai de encontro a teorias que dão primazia a direitos sociais, um exemplo viável seria o caso em que, o chefe do estado maior deixe de prestar algum benefício social, ou o diminua, para acudir algum trabalhador individual que em razão de alguma doença grave deixe de conseguir trabalhar e necessite deste trabalho para o seu sustento, o direito social seria, neste caso: o benefício destinado as minorias sociais, já o direito individual seria o perigo iminente de morte do trabalhador, neste sentido, pondera Kelbert (2011), em citação a Sarmento:

[...] conceber os direitos sociais como normas programáticas implica deixá-los praticamente desprotegidos diante das omissões estatais, o que não se compatibiliza nem com o texto constitucional, que consagrou a aplicabilidade imediata de todos os direitos fundamentais, nem com a importância destes para a vida das pessoas.

Dessa forma, em conformidade com Olsen (2011), mister se faz a diferenciação das normas programáticas e das definidoras de direitos; para tanto, a diferença nuclear reside em seu objeto, isto é, em decorrência do fato de que as primeiras apenas determinam um fim a ser efetivado por meio do Estado, porém, as segundas atribuem um direito subjetivo aos seus titulares, umas demandam uma necessidade de agir estatal enquanto outras definem a que necessidade se refere, seu modo de prestar.

Essa discussão se encerra, porém, sem pacificação doutrinária, sob a observação da necessidade de utilizar-se do método de ponderação, em cada caso concreto, como elemento direcionador para a concretização e efetividade dos direitos sociais de forma individual, visando um meio de constatar a necessidade de interferência ou não, do Poder Judiciário, para agir além de sua competência institucional.

Não obstante, é importante afirmar que os direitos sociais estão diretamente vinculados à vida e à dignidade da pessoa humana, o que substancialmente lhes imprime um caráter de efetividade ou subjetividade, ou seja, um caso concreto em que um indivíduo necessitar de remédio para ereção, popular viagra, não encontra-se desguarnecida de efetividade, vez que, no caso concreto sua falta cause ao sujeito de direitos problemas pessoais, familiares e psicológico, considerando o fato de que o mesmo não disponha de recursos financeiros para adquiri-lo, mesmo que este dinheiro pudesse ser disponibilizado para outro fim de cunho social objetivo.

Direciona-se esta análise para a linha tênue em que um direito individual passa a ser considerado pelo mesmo viés de um direito social, posto que ambos, andam de mãos dadas nesta estrada que o direito tem esculpido seus degraus. Isso colocado, passar-se-á a abordar a teoria do mínimo existencial por meio da seção a seguir.

 

3.      A TEORIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL

Marmelstein (2013), acerca dos países desenvolvidos, considera:

A possibilidade de o Judiciário vir a efetivar direitos a prestações materiais é vista com bastante desconfiança, pois se entende que, a escassez dos recursos necessários à concretização de direitos prestacionais demandaria escolhas políticas, que deveriam ser tomadas, preferencialmente, por órgãos politicamente responsáveis (legislador de administrador) e não pelos juízes. Além disso, são poucas as Constituições, como a brasileira, que incluíram em seu rol de direitos fundamentais, diversos direitos sociais.

Ocorre, porém, que mesmo nesses países, reconhece-se a obrigação, por parte do Estado, de garantir aos cidadãos ao menos condições mínimas de uma existência digna, a qual se denomina “teoria do mínimo existencial”. No que diz respeito a essa teoria, apenas o conteúdo basilar dos direitos sociais teria um grau indispensável, com capacidade suficiente para gerar direitos subjetivos aos seus titulares. Caso a pretensão se encontre fora deste mínimo existencial, “[...] o reconhecimento dos direitos subjetivos ficaria na dependência de legislação infraconstitucional regulamentando a matéria, não podendo o Judiciário agir além da previsão legal.”

Há, porém, uma constatação a ser feita no que se refere ao mínimo existencial, em conformidade com Sarlet e Figueiredo (2010), sendo de relevo frisar que a teoria em pauta em nada se compara com o denominado mínimo vital ou mínimo de sobrevivência, posto que estes últimos, apenas dizem respeito à garantia da vida humana, sem deterem-se na qualidade de vida, ou seja, na vida com dignidade; assim, proteger alguém de sucumbir, certamente, seria o primeiro passo ao mínimo existencial, no entanto, não bastaria, posto que este seria “[...] um conjunto de garantias materiais para uma vida digna.”

O que reporta utilizar um caso prático em que, determinada pessoa, diplomada, que recebe mensalmente uma renda de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), venha a ficar doente e seu remédio tenha como custo R$25.000 (vinte e cinco mil reais), sem condições de manter seu nível de vida com o salário que ganha e sem ter como se esquivar de adquirir o remédio, esta pessoa procure o judiciário para ganhar este remédio de forma gratuita através do Estado, este por sua vez, tem conhecimento de que este valor poderia ser de especial interesse a um munícipio pequeno que disponha de poucos recursos e o necessite para o cumprimento de suas despesas.

Estando de um lado um direito individual e de outro um social, nem mesmo assim, seria viável permitir que o indivíduo padeça e venha a sucumbir pela falta do remédio. Nestes casos, se encontram tratamentos considerados, até mesmo, milionários, que algumas pessoas ganham do Estado.

Faz-se menção acerca disso da decisão do Tribunal Constitucional Federal, da qual é possível extrair:

Certamente a assistência aos necessitados integra as obrigações essenciais de um Estado Social [...] Isto inclui, necessariamente, a assistência social aos cidadãos, que, em virtude de sua precária condição física e mental, encontram-se limitados nas suas atividades sociais, não apresentando condições de prover a sua própria subsistência. A comunidade estatal, deve, assegurar-lhes, pelo menos, as condições mínimas para uma existência digna e envidar os esforços necessários para integrar estas pessoas na comunidade, fomentando seu acompanhamento e apoio na família ou por terceiros, bem como, criando as indispensáveis instituições assistenciais.

Destarte, torna-se evidente que a garantia efetiva de uma existência com dignidade vai além da mera sobrevivência física, do mínimo vital (mínimo fisiológico), encontrando-se, então, além do estado de pobreza absoluta, posto que a vida não pode ser reduzida à mera existência, em virtude do fato de que, além da proteção básica, é necessário assegurar ao ser humano um mínimo de inserção na vida social (mínimo sociocultural), ou seja, um direito à garantia fundamental.

Por conseguinte, Sarlet e Figueiredo (2010) também predispõem acerca da impossibilidade de incluir um rol taxativo de direitos garantidos, por meio do mínimo existencial, pois que se faz necessário efetuar uma análise (ou pelo menos a possibilidade de uma averiguação), à luz da necessidade de cada pessoa e de seu núcleo familiar. Com efeito, no que reporta à garantia ao mínimo existencial, um dos principais argumentos em desfavor da prática encontra-se na dimensão econômica designada “reserva do possível”, a qual será averiguada na seção 6 deste artigo, nesse sentido:

[...] argumenta-se que as prestações necessárias à efetivação dos direitos fundamentais, dependem sempre da disponibilidade financeira e da capacidade jurídica de quem tenha o dever de assegurá-las. Por conta de tal objeção, sustenta-se, que os direitos a prestações e o mínimo existencial encontram-se condicionados pela, assim designada, “reserva do possível” e pela relação que esta guarda, entre outros aspectos, com as competências constitucionais, o princípio da separação dos Poderes, a reserva de lei orçamentária, e o princípio federativo.

Isso posto, conclui-se que, a ótica dos direitos objetivos e subjetivos andam de mãos dadas, conforme o viés em que o judiciário se posicionar, pois a questão do mínimo existencial que balizaria o deferimento deste direito é bastante pessoal, pois, até que valor é possível pagar um tratamento de saúde para um único indivíduo? Verifica-se, na prática, cirurgias estéticas sendo feitas em sujeitos de direitos gratuitamente, enquanto, no mesmo município pessoas passam necessidades de oferta de emprego, de alimentação, vestuário, considerando este fato, indagar-se-ia, qual é o ponto em que o mínimo existencial se encontra? Qual é o ponto em que o juiz pode decidir pela morte de uma pessoa pelo fato de que o valor do tratamento de saúde custe muito alto. Até que ponto vale a vida de um ser humano, enquanto milhões de outras morrem de frio jogadas nas ruas?

Buscando analisar diversos posicionamentos é que será feita uma explanação do princípio da subsidiariedade, na próxima seção, que, em conjunto com o princípio anteriormente expresso -mínimo existencial-, contribui de forma fundamental para a efetividade dos direitos sociais.

4  PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE

Por via deste princípio, emerge a possibilidade de o Judiciário implementar direitos fundamentais, sem prerrogativas legislativas ou executivas, como meio de concretização dessas garantias, o que automaticamente gera direitos subjetivos aos titulares de tais direitos.

Assim, convém salientar que a intervenção judiciária somente é possível frente à omissão, ou má administração dos demais poderes, por meio de ações insuficientes ou equivocadas, posto que não reporta ao Judiciário a implementação de políticas públicas, sob pena de desrespeito à separação de poderes, bem como afronta ao ideal democrático, o qual regulamenta que tal matéria cabe, como dito, ao Legislativo e ao Executivo. Destarte, a interferência judiciária tende a ser subsidiária e temporária, apenas até que o órgão competente tome as medidas cabíveis.

Nesse sentido, prolatou-se, a decisão do Ministro Celso de Mello, do STF, na ADPF n. 45/2004, ao afirmar:

É certo que não se inclui, ordinariamente, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário – e nas desta Suprema Corte, em especial – a atribuição de formular e de implementar políticas públicas [...], pois, nesse domínio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo.

Tal incumbência, no entanto, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando, os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos, que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos, impregnados de estatura constitucional, ainda que, derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático.

Desse modo, no Brasil, essa intervenção tem se mostrado extremamente necessária, em razão do fato de que os direitos sociais de previsão constitucional têm sido encarados como um “[...] favor que o político concede aos seus eleitores famintos, em troca de apoio eleitoral”, como assevera Marmelstein (2013), em menção a Schwarzer. Concomitante a essa realidade, verifica-se que os mecanismos clássicos da democracia representativa têm falhado em suas prerrogativas de fornecimento à sociedade, dos mais básicos direitos à vida com dignidade, ocasionando lacunas e desrespeito aos direitos do ser humano de viver com dignidade, resultando no fato de o juiz necessitar agir de forma subsidiária, em proteção ao cidadão, como meio de concretizar os direitos fundamentais expressos na Carta Magna.

Isso expresso passar-se-á a colocar no item a seguir, acerca do princípio da reserva do possível, o qual integra o rol principiológico, por meio do qual os juízes se atêm, em verificação da necessidade de intervenção jurídica na casuística em concreto, bem como se institui como meio de efetivar o direito a uma vida digna ao ser humano.

4.1  RESERVA DO POSSÍVEL

Implementar um direito prestacional exige a alocação de recursos, ocorre, porém, que não há recursos suficientes para atender a todas as demandas. Nesse sentido, as decisões que visem concretizar um direito podem ocasionar outras ameaças; portanto, ao julgar as demandas, o Judiciário deverá considerar que sua decisão “[...] poderá interferir na realização de outros direitos, de modo que, somente deve agir se estiver seguro de que não causará mal maior.” Nas palavras de Marmelstein (2013), em citação a Amaral:

 O ideal seria que houvesse disponibilidade financeira para cumprir todos os objetivos da Constituição. Mas não há. E é aí que entra a cláusula da reserva do possível, tão alardeada e mal interpretada pelos que são contra o ativismo judicial em matéria de direitos sociais.

No entanto, os direitos de defesa, por serem direitos subjetivos, exigem apenas uma omissão estatal, sendo, então, desconsiderados dessa condição econômica, de modo que o bem jurídico de que tutelam pode ser alcançado independente das circunstâncias econômicas. Ressalta-se, porém, que autores como Amaral e Gaudino (apud SARLET; FIGUEIREDO, 2010), sustentam que, também, os direitos de defesa, são de certa forma direitos positivos, na direção de que

[...] os direitos de liberdade, bem como, os de defesa em geral, exigem, para que seja efetivado, um conjunto de medidas positivas por parte do poder público e que sempre abrangem a alocação significativa de recursos materiais e humanos para sua proteção e efetivação de uma maneira geral.

Assim, é inegável que todos os direitos fundamentais podem implicar, de certa forma, algum custo, que, no entanto, não constitui fator impeditivo para a sua efetivação jurisdicional. Acerca disso emerge a teoria da reserva do possível, a qual teve origem na Alemanha nos primórdios de 1970, preceituando que “[...] a efetividade dos direitos sociais a prestações materiais estaria sob a reserva das capacidades financeiras do Estado, uma vez que, seriam direitos fundamentais dependentes de prestações financiadas pelos cofres públicos.” (SARLET; FIGUEIREDO, 2010).

A partir desse momento, passou-se a um entendimento teórico de que a efetivação do direito a prestações estaria subjugada à “[...] disponibilidade de recursos financeiros por parte do Estado, disponibilidade esta, que estaria localizada no campo discricionário das decisões governamentais e parlamentares, sintetizadas no orçamento público.” Esta, denominada reserva do possível em alusão aos autores, apresenta uma tríplice dimensão vinculada entre si e com outros princípios constitucionais, com força sistemática e constitucional, em razão de ferramenta auxiliar da máxima eficácia e efetividade dos direitos fundamentais, sendo eles:

[...] a) a efetiva disponibilidade fática dos recursos para a efetivação dos direitos fundamentais; b) a disponibilidade jurídica dos recursos materiais e humanos, que guarda íntima conexão com a distribuição das receitas e competências tributárias, orçamentárias, legislativas e administrativas, entre outras, e que, além disso, reclama equacionamento, notadamente no caso do Brasil, no contexto do nosso sistema constitucional federativo; c) já na perspectiva (também) do eventual titular de um direito a prestações sociais, a reserva do possível envolve o problema da proporcionalidade da prestação, em especial no tocante à sua exigibilidade e, nesta quadra, também da sua razoabilidade [...]

Em consequência, é possível afirmar que a reserva do possível se assemelha à razoabilidade econômica ou à proporcionalidade financeira. Dessa maneira, assinala-se o voto do Ministro Celso de Mello do STF:

Não se ignora que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais – além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização – depende, em grande medida, de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a alegação de incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta, não se poderá razoavelmente exigir, então, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto da Carta Política. (STF, RE 436966/SP, Rel. Ministro Celso de Mello, j. 26 out. 2005).

Em virtude da escassez de recursos, surge a exigência ao magistrado de se preocupar com os resultados de sua decisão, que, porventura, venham a causar impactos negativos, visto que a ausência de orçamento para o cumprimento de uma ordem judicial poderá ensejar tanto o desprestígio do julgado quanto o prejuízo na concretização de outro direito fundamental necessário; no entanto, de acordo com Marmelstein (2013), “[...] o direito fundamental não pode deixar de ser concretizado sob a alegatória de que a realização de despesa ficaria dentro da estrita conveniência do administrador.”

Nessa acepção também desponta Moro, em citação de Marmelstein (2013): “[...] o juiz constitucional não deve desconhecer seus limites. Quanto mais intensa a atividade da jurisdição constitucional, maiores serão os questionamentos acerca da legitimidade da interferência judicial em regime democrático.” Isso posto, assevera-se que, apesar da alegação da reserva do possível como limitação à efetivação judicial dos direitos socioeconômicos, essas alegações devem ser consideradas com desconfiança, pois “[...] não basta simplesmente alegar que não há possibilidades financeiras de se cumprir a ordem judicial; é preciso demonstrá-la.” Assim, faz-se conveniente a citação do voto do Ministro Celso de Mello, na já mencionada ADPF n. 45/2004, na qual delibera:

A cláusula da ‘reserva do possível’ – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, em particular quando, dessa conduta governamental negativa, puder ressaltar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

Portanto, a justificativa da reserva do possível apenas deve ser aceita caso o Poder Público demonstre que a decisão causará mais prejuízo do que vantagens à concretização dos direitos socioeconômicos. Cabe aqui ressaltar que os obstáculos apontados pelo Poder Público, em negativa a estes direitos como a reserva do possível, a liberdade de conformação do legislador, a discricionariedade política e a ausência de previsão orçamentária ou legal, entre outros, consistem apenas em contra-argumentos, e não em barreiras intransponíveis (MARMELSTEIN, 2013).

Isso expresso, robusta-se o fato de que um direito subjetivo não deve ser afastado de maneira robótica, apenas baseando-se na reserva do possível, no entanto, também, não pode extrapolar certos limites sob pena de colocar em risco um bem maior do que o conferido. Como meio de edificar tal ideia, utilizar-se-á no respectivo documento decisões jurisprudenciais, expressas na seção a seguir.

 

6. JURISPRUDÊNCIAS

Destarte, serão apresentadas algumas jurisprudências, respectivas à temática:

O direito à saúde é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. (AI 734.487-AgR, Rel. Ministra Ellen Gracie, julgamento em 03 ago. 2010, Segunda Turma, DJE de 20 ago. 2010). Vide: RE 436.996-AgR, Rel. Ministro Celso de Mello, julgamento em 22 nov. 2005, Segunda Turma, DJ de 03 fev. 2006; RE 271.286-AgR, Rel. Ministro Celso de Mello, julgamento em 12 set. 2000, Segunda Turma, DJ de 24 nov. 2000.

No mesmo sentido, retorno a indagação anterior, até que valor é possível disponibilizar através do Estado por um tratamento de saúde vital? Em continuidade ao estudo:

Doente portadora do vírus HIV, carente de recursos indispensáveis à aquisição dos medicamentos de que necessita para seu tratamento. Obrigação imposta pelo acórdão ao Estado. Alegada ofensa aos arts. 5º, I, e 196 da CF. Decisão que teve por fundamento central dispositivo de lei (art. 1º da Lei 9.908/1993) por meio da qual, o próprio Estado do Rio Grande do Sul, regulamentando a norma do art. 196 da CF, vinculou-se a um programa de distribuição de medicamentos a pessoas carentes, não havendo, por isso, que se falar em ofensa aos dispositivos constitucionais apontados. (RE 242.859, Rel. Ministro Ilmar Galvão, julgamento em 29 jun. 1999, Primeira Turma, DJ de

17 set. 1999.)

E, a questão que não quer calar: que valor fora disponibilizado neste tratamento? Neste instante, indiferente do valor deferido, um direito individual (a vida) fora sobreposto a um direito social, utilizando-se como argumento um direito social que é a saúde, ainda:

Consolidou-se a jurisprudência desta Corte no sentido de que, embora o art. 196 da Constituição de 1988 traga norma de caráter programático, o Município não pode furtar-se do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde por todos os cidadãos. Se uma pessoa necessita, para garantir o seu direito à saúde, de tratamento médico adequado, é dever solidário da União, do Estado e do Município providenciá-lo. (AI 550.530-AgR, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, julgamento em 26 jun. 2012, Segunda Turma, DJE de 16 ago. 2012.).

Por conseguinte, extrai-se desta decisão que o município detinha condições financeiras de custear o tratamento sem que com isso prejudicasse os demais cidadãos através da fome, frio, educação e demais necessidades sociais e também subjetivas. Para tanto, proceder-se-á por meio das definições conclusivas expressas na próxima seção.

 

6. CONCLUSÃO

O presente trabalho discorreu sobre a possibilidade de se considerar os direitos sociais como direitos fundamentais, bem como sua atuação na expectativa subjetiva. Ou seja, não há como dissociar, por exemplo, um direito social a saúde de um direito individual à vida, por exemplo. Ou ainda, o direito social ao trabalho com o citado direito à vida, um direito encontra-se interligado ao outro. Ambos, direitos sociais caminham na mesma direção que os direitos fundamentais, posto que, sendo um direito fundamental a vida com dignidade, constata-se que todos os demais, pertencem a este núcleo basilar de forma indissociável. O mesmo que dizer: adianta trabalhar e não receber o salário? Ou que este seja insatisfatório para uma vida digna?

Assim, como meio de edificar os direitos fundamentais, isto é, evidenciar sua necessidade coadunada aos direitos sociais, é que fora buscado diversas posições doutrinárias e jurisprudenciais, para concluir que um direito social apenas é realmente efetivo, no instante em que ele cumpre com a questão fundamental da dignidade humana, sendo este direito social, por exemplo, receber sesta-básica da prefeitura-  direito social a alimentação satisfeito-, no entanto, incapaz de promover o sustento necessário e ideal da família ou pessoa que o recebe, direito à vida, e a dignidade humana insatisfeito, a ação anterior perde totalmente o sentido.

Outro exemplo, seria o trabalhador que tem seu direito ao trabalho efetivo, no entanto aufere salário incompatível com suas necessidades humanas, passando então, a fazer uso de outros meios para subsistir, neste ponto, o indivíduo pode adentrar para a criminalidade, pondo em risco o bem estar de todo o restante da sociedade. Verifica-se, um tracejar contínuo em que um direito social esbarra em outro direito, o fundamental.

Em consequência, versara-se sobre as teorias que englobam o tema de forma a reforçá-lo e a balizá-lo, consistindo na teoria do mínimo existencial, a qual obriga o Estado a fornecer no mínimo o direito a uma vida digna para todo e qualquer ser humano, passando para a teoria do princípio da subsidiariedade, a qual legaliza que o juiz atue sem prescrição legal ou executiva na direção de concretização de direitos indispensáveis ao ser humano, culminando na teoria da reserva do possível que delimita o ativismo judicial – forma em que o juiz atua sem prescrição de lei, saindo da sua rota normal de atuação, “juízes não sois máquinas, homens é o que sois”.

Conclui-se, para fortalecer o estudo o uso de decisões jurisprudenciais proferidas mediante os órgãos judiciários, as quais atestam e concretizam a possibilidade em comento.

 

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[1] Advogada militante; Pós-graduada em Direito do Trabalho e Previdenciário; Autora do Blog Direito em Estudo; Autora do livro a Promoção dos Direitos Humanos Fundamentais Através da Polícia Militar. E-mail: linny.mendes@hotmail.com.

ASPECTOS ATUAIS DA SEGURANÇA PÚBLICA NO ESTADO DE SANTA CATARINA: A ATUAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR COMO INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SEGURANÇA

Artigo Publicado na Revista Unoesc & Ciência - ACSA




1 INTRODUÇÃO

O direito à segurança é um dos elementos balizadores conferidos aos cidadãos brasileiros, por força das disposições introduzidas pelo constituinte originário de 1988. A normatividade vigente assegura a segurança como um dever a ser prestado aos indivíduos pelo Estado, prevendo-a, todavia, como direito e responsabilidade também da população.

Assim, segundo os ditames constitucionais, uma verdadeira ordem pública deve ser estabelecida por meio da colaboração entre os órgãos estatais e a integração comunitária.
Essa visão não pode ser dissociada dos aspectos históricos acerca da segurança pública, os quais merecem análise no presente estudo, de forma a inserir, em um contexto mais amplo, o atual regramento da matéria.

A Constituição do Estado de Santa Catarina, por sua vez, traduziu, para o âmbito da circunscrição estadual, as mesmas regulamentações federais, no sentido de estabelecer tratar-se, a segurança, de um dever dos entes estatais, a ser exercido por seus órgãos, mas também de um direito e encargo de toda a população brasileira.

Dentre os órgãos incumbidos de exercer a segurança pública, situa-se a Polícia Militar, a quem cabe o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública.

A Polícia Militar, almejando a proteção dos cidadãos, bem como a concretização da ordem e da paz social, desenvolve, diuturnamente, inúmeros planejamentos destinados a gerir as atividades da corporação. Nesse contexto, originou-se o Plano de Comando da Polícia Militar, criado como forma de praticar, nas condutas institucionais, a proteção do cidadão e a aproximação social.
Referido Plano prescreve valores, princípios e metas de alcance abrangente, com vistas a garantir a segurança e a legalidade das ações policiais, além do cumprimento de um planejamento bem estruturado.

Resta esclarecer, assim, se o atual Plano de Comando da Polícia Militar de Santa Catarina, contando com a efetividade das ações previstas, presta-se a assegurar, além da teoria, o cumprimento dos direitos e deveres no que concerne à segurança pública, já que não é só pela previsão normativa que se logra êxito na efetivação dos direitos e deveres previstos constitucionalmente.

2 AS NORMATIVAS CONSTITUCIONAIS DA SEGURANÇA PÚBLICA

O instituto da segurança pública fez-se presente desde os primórdios das sociedades organizadas, ainda que de maneira tácita. Tanto na comunidade composta por tribos quanto nas cidades do início das civilizações, dos antigos Impérios até a atualidade, a necessidade de segurança advinda do poder estatal sempre figurou como um elemento social.

No Egito, em torno de 1.000 a.C, existiam guardas com a função policial, os quais portavam bastões com o nome do Faraó. Já em Roma, tais funções eram desempenhadas pelos edis, censores e cônsules.

O direito à segurança passou a ser mais valorado, porém, historicamente, com a chamada primeira geração de direitos, expressos na Declaração de Direitos da Virgínia de 1776. Esse texto norte-americano, em seu artigo 3°, previu a proteção e segurança do povo.

Em 1789, na França, com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, surgiu a legalização da força pública como meio de assegurar os direitos do homem. Dessa forma, no que se refere à segunda e à terceira geração, a segurança pública encontrou pilares por via dos direitos sociais e da proteção à vida, garantidos pelo Estado.

No Brasil, percebe-se, em um contexto histórico amplo, que as questões referentes à segurança pública permaneceram conectadas aos interesses privados por dilatado período de tempo. Nesse sentido, Holanda (1995) esclarece que, no período colonial, as autoridades locais, instituídas através da metrópole, acumulavam de maneira excessiva os poderes administrativos, judiciários e policiais.

Durante o Império, a função de chefe de polícia foi desenvolvida pelos juízes togados ou pelas milícias particulares, estabelecidas pela aristocracia rural. No período republicano, porém, a segurança pública prestou-se a servir as classes dominantes e os oligopólios políticos dos coronéis.

No Brasil, especificamente, o tema sempre teve menção nas Constituições. Nada se compara, porém, à disciplina outorgada ao tema pela Constituição de 1988, que elencou a segurança, inclusive, no preâmbulo do texto constitucional, como sendo um dos principais nortes a serem assegurados pelo regramento da Constituição.

Por conseguinte, a segurança foi arrolada entre os direitos fundamentais invioláveis do cidadão brasileiro, conforme disposição constante do caput do artigo 5º da Constituição; ainda, foi trazida como um dos direitos sociais previstos no caput do artigo 6º.
A atual Constituição dispôs, ainda, que são considerados crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a segurança interna do País (artigo 85, inciso IV) e estipulou que compete ao Conselho de Defesa Nacional propor os critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo (artigo 91, inciso III), além de trazer disposições esparsas sobre a segurança no trânsito e no trabalho, entre outras.

Porém, o ápice da regulamentação encontra-se no Capítulo III do Título V, que trata da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas, especialmente para fixar as regras sobre a segurança pública.

Nesse sentido, constata-se a grande importância conferida ao tema, especialmente por ser pautado no contexto de um Estado Democrático de Direito, voltados para a concretização dos direitos humanos e da cidadania, em conformidade com o artigo 1° da Constituição.

Ademais, os dispositivos acerca da segurança pública influenciam, direta e indiretamente, todo o sistema de atuação dos órgãos integrantes da segurança pública. De forma indireta, percebe-se, por exemplo, a relação das disposições sobre a segurança pública com o que define o artigo 3° da Constituição, ao estabelecer, entre os objetivos fundamentais da República, o de erradicar a pobreza e a marginalização, garantir o desenvolvimento nacional e reduzir as desigualdades.

Em outros dispositivos, a Constituição assegura a proibição de tortura ou tratamento degradante; define a casa como sigilo inviolável, como também é inviolável o sigilo de correspondência; passa a defender o consumidor; define a impossibilidade de constatação de crime sem lei anterior que o defina; promulga como inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia os crimes de prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins, o terrorismo e outros crimes definidos como hediondos; todos vinculados à segurança, denotando o avanço constitucional do tema, que passou a ser considerado como dever do Estado, direito e responsabilidade de todos.

O artigo 144 trouxe, explicitamente, a definição da segurança pública, instituindo-a como dever do Estado, mas, também, como direito e responsabilidade da população, estabelecendo a ordem pública por meio da colaboração e integração comunitária.
Esse dispositivo definiu, igualmente, que a segurança pública deve ser exercida pela polícia federal, pela polícia rodoviária federal, pela polícia ferroviária federal, pelas polícias civis, pelas polícias militares e pelos corpos de bombeiros militares, além de estipular as atribuições de tais órgãos instituídos pelo Estado para promover a segurança.

Outrossim, previu que os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme disposto em lei.

José Afonso da Silva (2006) destaca que a maior parte do art. 5° (tido como cláusula pétrea) define proibições, situações, procedimentos e delimitações destinados a garantir o exercício e o gozo dos direitos individuais fundamentais, podendo-se concluir a relação direta da efetividade de tais direitos com a segurança pública, principalmente no que concerne às relações policiais ou as próprias relações de todo o sistema criminal.

Acerca do tema, Bonavides (2006) destaca que, ao instituir a segurança pública em suas cláusulas pétreas, o constituinte originário vedou a possibilidade de medidas que viessem a suprimi-las.

Vê-se, portanto, que, ao mencioná-la novamente no art. 6°, o constituinte transportou-a para além de um direito individual, passando a se configurar em um direito coletivo, o que, para Silva (2006), significa dizer que a segurança consiste em direito individual que não pode ser utilizado para ultrapassar direito de outrem, dado o seu aspecto também coletivo.

Analisando-se o contexto histórico, percebe-se que cultura autoritária foi, em grande parte, responsável pelo descrédito que o legado da segurança sofreu durante largo período até a atualidade, ante a explícita falta de credibilidade da instituição perante o núcleo social. Com vistas a combater essa visão, o governo federal tem buscado alternativas de melhorias, no intuito de aprimorar a eficiência na área da segurança pública e, por conseguinte, aumentar a confiabilidade dos cidadãos no setor. Isso tem sido feito, exemplificadamente, investindo-se no aperfeiçoamento do efetivo, com o intuito de melhorar a aplicação das atividades dos agentes.
Nesse sentido, foi publicado o Decreto n. 2.315, de 04 de setembro de 1997, instituindo a Secretaria Nacional da Segurança Pública (SENASP), incumbida de aplicar um novo padrão de organização policial em todo território nacional, baseado na qualidade da formação profissional, bem como em melhorias salariais, amparo, políticas de incentivo, valorização do profissional e respeito aos Direitos Humanos.

A Constituição do Estado de Santa Catarina, por sua vez, transparece sobre o tema o mesmo teor de preocupação evidenciado na Carta Magna.

O Diploma estadual instituiu a segurança pública em seu núcleo de garantias, prevendo-a, igualmente, como dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, devendo ser exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

A Constituição estadual destinou um título específico para disciplinar a temática, composto por quatro capítulos. Os temas abordados foram as disposições gerais, a Polícia Civil, a Polícia Militar, o Corpo de Bombeiros Militar, a defesa civil e o instituto geral de perícias.
Nesse sentido, a atuação dos entes federativos emerge da demanda social pela segurança. Requer-se, por parte da população, providências a curto tempo em combate à violência e à criminalidade, em virtude da desigualdade existente a estrutura criminal – que avança em níveis assustadores – e a estrutura de segurança, a qual decai ou não avança no quesito de efetivos.

3 AS ESPECIFICIDADES DO PLANO DE COMANDO DA POLÍCIA MILITAR CATARINENSE E A EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA

No que concerne à segurança pública especificamente no Estado de Santa Catarina, importante frisar que entrou em vigor, no dia 06 de abril de 2011, o atual Plano de Comando da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina (PMSC), destinado a servir de instrumento de planejamento e gestão estratégica com repercussões e desdobramentos em todos os níveis da corporação.

Tal documento possui o intuito de consolidar os princípios da instituição, os valores e eixos edificantes de atuação, baseados no pilar de proteção ao cidadão. Assim, o Plano compilou 109 (cento e nove) objetivos, contendo as pessoas como seu núcleo basilar.
Objetiva-se, ainda, o estabelecimento de um novo padrão de gestão, calcado na avaliação de desempenho e na gestão por projetos; previu-se uma direção de preferência, uma meta a ser alcançada.

Definiu-se, assim, pelo referido Plano, o “que” e o “quanto” desejava em relação aos objetivos. Porém, no que tange ao “como” eles seriam alcançados, determinou-se que será definido por cada unidade ou órgão responsável, por meio de projetos adequados a realidade local, suas particularidades, potencialidades e limitações, sempre com o suporte do Comando Geral, da Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP) e do Governo de Estado.

A polícia militar estadual, com a aquisição e a disseminação de uma ferramenta de Business Intelligence (BI) e um software de gestão de projetos, permitiu o acompanhamento do desempenho de cada uma das unidades da Corporação e uma gestão direcionada a resultados. Caso não se obtenha bons resultados, a atividade deverá ser mudada, revista, alterada, aprimorada ou até mesmo eliminada.

Pelo que se vislumbra, está sendo prezada a melhoria na qualidade de serviços prestados à sociedade e as condições de trabalho dos policiais militares.

Enfatiza-se que, aos poucos, o referido Plano está sendo posto em prática, até que se torne uma cultura organizacional, a fim de que os resultados passem o quanto antes a se mostrarem evidentes para que se perceba, por parte da comunidade, uma atuação satisfativa.
A atual versão do Plano de Comando congrega o Guia de Orientação para o Desenvolvimento de Projetos no Âmbito da PMSC, o qual orienta e disciplina a construção dos projetos associados aos objetivos do Plano de Comando, objetivos estes que, atualmente, são 107 (cento e sete) a serem perseguidos.
Além do objetivo fundamental de proteger, percebe-se a intenção de garantia da paz social e da ordem pública, com vistas no reconhecimento da eficácia da instituição, atuando de maneira condizente com suas perspectivas.

Dessa forma, pretende-se garantir uma instituição baseada na legitimidade de seus atos, concretizando os direitos individuais e coletivos da sociedade, dirimindo as ilegalidades e arbitrariedades dentro de seu efetivo, construindo uma relação de confiança social.
Quer-se, ainda, que a instituição seja efetiva, comprometida com a satisfação da sociedade, efetuando uma avaliação da qualidade da ação policial, de maneira a verificar o desempenho do policial no que tange aos parâmetros de qualidade aspirados, bem como apresentando os resultados almejados.

Outrossim, objetiva-se serviços de excelência, com a busca por parcerias na comunidade, de forma a envolver todos os indivíduos na edificação dos resultados pretendidos, respeitando as peculiaridades de cada área de atuação, de modo a adequar seus serviços a realidade de cada local, condizentes com as reais necessidades.

Essas premissas existem como forma de aperfeiçoar os processos internos, para fortalecer e valorizar o capital humano e organizacional, bem como a consolidação de fluxos financeiros sustentáveis e compatíveis com as necessidades atuais e futuras da Corporação, considerando sua visão de futuro.

Tais visões orientadoras são embasadas, ainda, em valores institucionais, tais como a conservação das tradições (atuação com base na construção e manutenção da unidade institucional, interagindo entre os círculos hierárquicos de maneira cooperativa, em respeito aos “valores e virtudes militares”), a criatividade das ações (baseada no profundo conhecimento da profissão, da abrangência e complexidade de nossa missão, e voltada para busca de resultados concretos e permanentes, sendo que as experiências bem sucedidas serão rapidamente institucionalizadas e disseminadas como boas práticas); o critério com os recursos (privilegiando os recursos financeiros em investimentos positivos sobre as condições de trabalho do efetivo, bem como a redução da criminalidade, violência e sensação de insegurança), o foco na missão (fundamentado na função constitucional de polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, bem como em proteger e contribuir para que sejam desenvolvidas de forma plena) e a intransigência com a ilegalidade (os desvios de conduta dos integrantes da Polícia Militar serão apurados e os responsáveis, após ampla defesa e o contraditório, serão punidos).

O alinhamento de todos estes objetivos em cada uma de suas dimensões concretizará a excelência da extensão operacional, baseada em cinco pilares estruturantes.

Como primeiro pilar, considera-se a proximidade, no sentido de que, proteger o cidadão é buscar proximidade com as comunidades, de maneira a descentralizar seus recursos e atuar em conformidade com as peculiaridades de cada área, de forma a estabelecer uma relação de confiabilidade, permitindo à sociedade a participação ampla em seus planejamentos de atuação, como também a possibilidade de cobrança de resultados, tornando-se acessível a todos. A atividade policial, assim, pode ser vista como uma atividade que busca gerar, pela via da proteção, qualidade de vida ao ser humano.

Como segundo pilar, tem-se a proatividade, verificada por meio da delegação de autoridade aos policiais comunitários, de maneira que estes possam tomar iniciativas com vistas a prevenir, reagir e reprimir o crime, a violência e a desordem, objetivando a qualidade de vida dos cidadãos.

O terceiro pilar trata-se das “ações sobre as causas”, haja vista que, por via da ação conjugada da polícia com a comunidade, tenciona-se uma ação policial apta a desenvolver respostas e solucionar os problemas verificados, construindo um plano de ação direcionado e eficaz.

Como quarto pilar, destaca-se a pronta resposta, no sentido de que, sempre que ocorrer “a quebra da ordem pública”, a Polícia Militar deve atuar de maneira imediata, de forma ágil e eficaz, com vistas a estabelecer a normalidade, através de policiais treinados e equipados.

O último pilar trata-se das parcerias, pois, sendo a segurança pública dever do Estado, mas direito e responsabilidade de todos, faz-se mister uma ação conjunta da polícia militar com outros órgãos públicos ou privados, assim como com os cidadãos, de forma a concretizar no núcleo social os eixos estruturantes da sociedade.

O Plano de Comando em análise destaca, como prioridades da polícia militar, de um lado, as pessoas – já que os objetivos são direcionados a atender a sociedade e aos cidadãos, através de serviços prestados e o alcance de resultados – e, de outro, mas com igual nível valorativo, os policiais militares, com o intuito de garantir condições pessoais e de trabalho, bem como o suporte organizacional necessário a prestação de serviços de qualidade.

A concretização do Plano de Comando depende de uma metodologia denominada Multicritério de Apoio à Decisão-Construtivista (MCDA-C), a qual se desenvolve em três fases: fase de estruturação (destinada à compreensão do problema e do contexto em que está inserido, momento em que as alternativas serão avaliadas), fase de avaliação (em que se definem as taxas de substituição, a perda de desempenho que uma ação potencial sofrerá em um critério para compensar o ganho em outro e a transformação do valor das avaliações locais em valores de uma avaliação global) e fase das recomendações (em que são propostas ações de aperfeiçoamento aos objetivos já efetivados, para que estes contribuam concretamente no desempenho organizacional).

Obtém-se, assim, uma avaliação de impacto e uma avaliação de processo, destinando-se a avaliação de impacto a apurar a efetividade no alcance do objetivo mensurado no respectivo indicador de desempenho e a avaliação de processo, a acompanhar a integridade e o cumprimento das ações planejadas nos projetos, que deverão ser desenvolvidos com base no Guia de Orientação para o Desenvolvimento de Projetos no âmbito da polícia militar de Santa Catarina.

Pelas disposições contidas no Plano de Comando, assim, verifica-se a real possibilidade de que os bons objetivos e ações da polícia militar catarinense saiam do papel para se tornar realidade, de forma a garantir uma verdadeira segurança pública em sua circunscrição.

Não se trata, apenas, de um mero plano teórico, mas, sim, de um instrumento apto a oportunizar a valorização do contingente humano envolvido e o adequado gerenciamento dos recursos disponíveis, mediante parcerias entre a comunidade, as instituições e o Estado. Tudo em busca de priorizar a proteção aos cidadãos e uma efetiva atuação no combate ao crime.

4 CONCLUSÃO

A segurança encontra-se arrolada entre os direitos fundamentais invioláveis do cidadão brasileiro, conforme disposição constante do caput do artigo 5º da Constituição. Ainda, foi trazida como um dos direitos sociais previstos no caput do artigo 6º e recebeu tratamento diferenciado no Capítulo III do Título V, que trata da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas.

A Constituição do Estado de Santa Catarina não se dissociou dessas previsões, porquanto instituiu, igualmente, a segurança pública em seu núcleo de garantias, prevendo-a como dever do Estado e direito e responsabilidade de todos, devendo ser exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

Os dispositivos acerca da segurança pública influenciam, direta e indiretamente, todo o sistema de atuação dos órgãos integrantes da segurança pública e vinculam-se a outros institutos do Estado Democrático de Direito. Frisa-se, nesse sentido, que uma plena prestação da segurança pública, nos moldes previstos constitucionalmente, atrela-se aos conceitos do Estado de bem-estar social (Welfare State).

Da mesma forma, uma adequada prestação da segurança agrega-se à dignidade da pessoa humana, às teorias dos direitos fundamentais e à principiologia dos direitos sociais. E, de fato, a segurança pública, como um direito fundamental consagrado constitucionalmente, não pode ser dissociada desse contexto.
Percebe-se que, com o texto da Constituição de 1988, foi gerada uma grande expectativa na população em termos de efetividade das políticas públicas de segurança, dada a dimensão conferida ao tema e a importância do regramento consolidado.

Pelo que se constata da presente análise, assim, o Plano de Comando da Polícia Militar de Santa Catarina apresenta, teoricamente, plenas condições de assegurar o cumprimento dos direitos e deveres no que concerne à segurança pública. Entretanto, não é só pela previsão normativa que se logra êxito na efetivação da segurança pública, mas, sobretudo, é pela eficácia e efetividade das ações empreendidas que tal objetivo será alcançado.

Nesse contexto, o Plano de Comando da Polícia Militar de Santa Catarina tem muito a contribuir, dada a perspectiva de conferir efetividade às previsões contidas em abstrato.

O Plano pauta-se na pretensão de que a polícia militar seja vista como uma instituição confiável em momentos de crises, por meio de um desempenho célere e efetivo, de modo a proteger a sociedade e a preservar a ordem pública. A instituição, nesses moldes, passaria a ser, também, promotora dos direitos humanos, concretizando seu trabalho de maneira a tornar cada vez mais respeitados, preservados e garantidos os direitos inerentes ao ser humano, sem distinções.

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Autoras: 
 Aline O. Mendes de Medeiros Franceschina e Dárlea Carine Palma.


Disponível em: http://editora.unoesc.edu.br/index.php/acsa/article/view/4552/pdf_16