segunda-feira, 6 de março de 2017

A VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA E A CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE LESÃO CORPORAL À SAÚDE DE NATUREZA GRAVE OU ATÉ GRAVÍSSIMA: UM ATENTADO CONTRA O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO


Resumo: A presente pesquisa pretende analisar a configuração do delito de lesão corporal à saúde, de maneira a abrir caminhos para a sua busca e sancionamento jurisdicional, evidenciando o fato de que, por falta de atenção na análise do núcleo delitivo esta tipificação penal, esta sendo confundida com outras expressas no código e sendo afastadas de aplicabilidade e sancionamento. No intuito de buscar uma resposta para esta questão, formulou-se o seguinte problema de pesquisa: é possível que o delito de lesão corporal à saúde se consubstancie através de violência psicológica em sua modalidade grave ou gravíssima? Visando responder ao problema proposto, o trabalho tem por objetivo geral discutir a necessidade de atenção e conhecimento por parte do aplicador da lei, sob pena de omissão, que ocasiona seu encaminhamento ao cemitério de leis, devido ao fato de a mesma existir e ter validade, mas não deter aplicabilidade. O objetivo específico deste estudo visa analisar as decisões magistrais relacionadas à matéria e buscar a aplicabilidade desta lei. O aprofundamento teórico pauta-se em pesquisas bibliográficas e em decisões magistrais, consubstanciadas na leitura de diversas obras, apoiando-se em um método dedutivo.
Palavras-chave: Violência psicológica; Lesão corporal à saúde; Dignidade da pessoa humana.

 ALINE OLIVEIRA MENDES DE MEDEIROS[1]

1.      INTRODUÇÃO
Este estudo visa atentar-se para a configuração do delito de lesão corporal à saúde de natureza grave ou gravíssima, em razão da insuficiência de decisões magistrais referentes ao assunto e de respaldo jurisprudencial, pretendendo elucidar os estudiosos atinentes ao assunto, de maneira a construir uma ponte intermediária entre a tipificação delitiva formal, encontrada na lei, e sua materialidade e eficácia no solo nacional, a qual conforme será possível evidenciar é ínfima se comparada com as ocorrências práticas verificadas no próprio cotidiano do leitor.
Consciente que entre o que a lei expressa e o que é efetivado, existe um caminho que precisa ser percorrido é que este estudo evidenciou, com base nas decisões jurisdicionais encontradas, que a prática delitiva de lesão corporal à saúde é rotineiramente confundida com delitos como de calúnia, difamação e injúria, encerrando por ser absolvido na própria petição inicial, nem chegando aos olhos dos juízes, e sendo afastado de aplicabilidade prática.
Cabe considerar que se trata de crimes distintos, conforme será traçado no decorrer do texto, a maior evidencia desta distinção encerra-se no fato de que, estes três tipos delituosos se materializam sem que seja necessária a ocorrência de abalo psíquico no sujeito passivo, pois, se houver abalo, restará configurada, a lesão corporal à saúde, muitas vezes de natureza grave ou gravíssima, tratando-se, a partir de então, de concurso de crimes.
O maior entrave compreende o fato de que estes tipos delitivos, normalmente, são solucionados pelos juizados especiais, devido à rapidez deste sistema, encerrando, por não ser observado atentamente, principalmente pelo advogado peticionante. A falta de atenção na tipificação delitiva resulta em seu distanciamento de aplicabilidade prática, pois, nos exemplos que retratam a existência de dois tipos delitivos, são peticionados o sancionamento de apenas um e normalmente, visando respaldo pecuniário, portanto, buscando outras tipificações que enquadrem o delito diretamente na esfera cível. Acerca deste assunto, serão direcionadas as próximas páginas.

2.      PRECEITOS FUNDAMENTAIS DA ORDEM DEMOCRÁTICA
Em função de que a ignorância, o esquecimento e o desprezo pelos direitos humanos compreenderam as razões para o cometimento de desgraças públicas e de corrupção dos Governos, foi que o povo francês edificou no ano de 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, expondo em 17 artigos de um único manuscrito os direitos inalienáveis e mais sagrados dos indivíduos, com o intuito de que esta declaração prestasse como um elemento clarificador das idéias do sujeito, recordando-lhe de seu passado cruel e iluminando sua vida futura, ao direcioná-lo através dos direitos e deveres individuais.
Diante disto, o art 1° deste manuscrito esculpe o direito a igualdade entre os seres humanos, o art. 4° assevera o direito à liberdade, salientando o respeito pela vida dos demais, o art. 6° delimita que a lei que rege o povo, deve ser proveniente do mesmo, e robustece a emersão do direito a igualdade entre as pessoas. Salienta-se o caráter individualista que possui este documento histórico.
Esta carta define um marco importante para a afirmação dos direitos humanos a nível internacional, visto que foi pioneira em expressar direitos construídos a partir do ser humano, no entanto, da formalidade da lei escrita, para a sua assimilação pela sociedade e materialização no solo pátrio, levou um longo percurso de tempo, o qual foi percorrido através de progressos e retrocessos.
Adiante disto, proclamada sobre o calor da 2ª Guerra Mundial, e o cheiro do sangue das vítimas desta arbitrariedade foi que emergiu a Declaração Universal de Direitos Humanos pretendente a estabelecer a paz no mundo e visando edificar no solo mundial a bandeira da liberdade, igualdade e fraternidade, afinal a ideia destes direitos sempre esteve presente nas mentes humanas em maior ou menor intensidade, no entanto, no caminho para a sua afirmação foram cometidas atrocidades imensuráveis, que de modo algum, podem ser esquecidas pelo operador jurídico.
Cita-se como exemplo, o caso do Holocausto promovido pelo regime Nazista, o qual exterminou, em campos de concentração, aproximadamente 2,5 milhões de pessoas. Diante de situações como estas, os estudiosos evidenciaram que as atividades jurídicas deveriam possuir conteúdo humanitário, sob pena de o “direito servir para justificar a barbárie praticada em nome da lei”, visto que, conforme Marmelstein (2013, p. 10) “a mesma tinta utilizada para escrever uma Declaração de Direitos, pode ser utilizada para escrever as leis do Nazismo. O papel aceita tudo... Logo, o legislador, mesmo apresentando uma suposta vontade da maioria, pode ser tão opressor quanto o maior dos tiranos”.
Com este novo pensamento, a lei cedeu espaço para o assentamento do arcabouço jurídico nos valores e princípios de caráter humanitário, como no evento da proclamação da DUDH de 1948 que trouxe em seu preâmbulo o reconhecimento da dignidade da pessoa humana como valor inerente “a todos os membros da família humana”, enraizando no solo internacional a igualdade entre os seres humanos, fundamentando sua existência na justiça e na paz no mundo, pretendente a estabelecer o direito à liberdade do homem.
Enfatizando a essencialidade de que os direitos humanos, inerentes e irrenunciáveis a todos os homens, sejam protegidos através do império da lei, buscando fortalecer os laços amistosos entre as nações, e dando credibilidade a estes direitos como forma de plantar a dignidade e a valorização do ser humano no coração do mundo, de forma que ele pulse jorrando suas diretrizes humanitárias para todas as Nações, promovendo “o respeito universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a observância desses direitos e liberdades”, de forma conjunta entre os países, tendo como valor supremo a pessoa humana.
Tanto que o artigo 1° deste manuscrito de direitos (composto por 30 artigos) assenta o direito à liberdade e a igualdade em dignidade e direitos para todas as pessoas, guiando-as a agirem umas com as outras pelo sentimento de fraternidade, já o art. 6° deste dispositivo, marca a ferro quente o direito que todo o ser humano possui de ser reconhecido como pessoa, revigorando no art. 7° o direito a igualdade, embasa no art. 12 o direito à privacidade, à honra e a reputação, o art. 16 presta abrigo à família, e no art. 23 traz a proteção do direito laboral do ser humano de forma digna, fortificado pelo art. 25 que novamente enfatiza o direito da pessoa humana de viver uma vida digna, enquanto o art. 26 trás o direito à educação.
Esculpido em letras douradas no art. 28 se expressa o direito do ser humano de usufruir de uma ordem social em que seus direitos sejam “plenamente realizados”, bem como, no art. 29, verifica-se a necessidade desta pessoa contribuir pela fruição de seus direitos, através da efetivação de seus deveres como pessoa humana pertencente a uma ordem jurídica.
Ademais, devido ao caráter humanitário que estas duas expressões trouxeram ao plano internacional, todas as Cartas Constitucionais que foram publicadas posteriormente seguiram suas diretrizes, plantando em seus solos as sementes da árvore dos direitos humanos, erguendo em suas terras uma sociedade “livre, justa e solidária” como no feito da Constituição brasileira, pretendentes à unificação da família humana.
Do direito internacional para o direito nacional, salienta-se que a Carta brasileira soberana da primavera de outubro de 1988 inicia seu caderno de diretrizes lapidando em seu preâmbulo, ou seja, no coração do sistema jurídico brasileiro, como valores supremos do Estado Democrático de Direito a garantia do exercício dos direitos individuais e coletivos, da liberdade, da segurança, do bem-estar, do desenvolvimento, da igualdade e da justiça, visando à edificação de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, alicerçada através da harmonia social e comprometida com a solução pacífica dos conflitos em todos os âmbitos, clamando para si, inclusive a proteção de Deus, denotando sua emersão sobre preceitos de ordem jurídica, moral e ética.
Conforme Moraes (2013, p. 45), mesmo sem força de lei o preâmbulo de uma Constituição atua como um “documento de intenções do diploma, e consiste em uma certidão de origem e legitimidade do novo texto e uma proclamação de princípios, demonstrando uma ruptura com o ordenamento constitucional anterior e o surgimento jurídico de um novo Estado”.
Nele expressam-se o enquadramento histórico, os antecedentes, as justificativas e os objetivos e a finalidade da Constituição. A serventia da abertura deste caderno de leis se verifica na sua aplicabilidade para a interpretação e integração de seus artigos.
Enfatiza Miranda (apud MORAES, 2013, p 45) que mesmo não compreendendo um conjunto de preceitos, ou seja, não estabelecendo direitos e nem deveres, o preâmbulo guarda em seu núcleo um contíguo de princípios iluminadores do caminho para o entendimento dos artigos constitucionais, prestando-se como o sol que estende seus raios sobre a ordem de artigos que se projetam a sua frente, desabrochando-os para a vida em terrae brasilis, através da elucidação do entendimento de estudiosos e de aplicadores da lei quanto a sua aplicabilidade e eficácia, atua como fonte interpretativa visando “dissipar as obscuridades das questões práticas e de rumo para a atividade política do governo”, como leciona Alberdi (apud MORAES, 2013, p. 45).
Conforme o posicionamento do Ministro Carlos Veloso[2]o preâmbulo, ressai das lições transcritas, não se situa no âmbito do Direito, mas no domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte”. Adiante no caminho deste estudo depara-se com o primeiro artigo da Constituição, o qual define como fundamentos desta ordem estatal o exercício da cidadania, o direito à dignidade da pessoa humana e o alicerce dos valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa (Art. 1°, inc. II, III e IV).
Por sua vez, a cidadania “expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo”, como destaca Dallari (2004, p. 22), um indivíduo sem cidadania encontra-se marginalizado ou excluído da vida comunitária.
A cidadania engloba um complexo de direitos e deveres jurídicos, posto que “cidadão é o indivíduo vinculado à ordem jurídica de um Estado”. De acordo com Freitas (2002, p. 52), a cidadania compreende mais que a simples equivalência a nacionalidade, visto que um indivíduo pode não ter conhecimento sobre seus direitos, “e o conhecimento de que é sujeito de direitos é condição para o exercício da cidadania”.
Desta feita, a cidadania entrelaçada com a nacionalidade, “vincula o indivíduo a algum tipo de comunidade jurídica e politicamente organizada”, o que permite que ele participe em suas decisões. Já para Arendt (apud FREITAS, 2002, p. 61) a cidadania é vista “como o acesso ao espaço público, como o ‘direito a ter direitos’”.
Portanto, a mesma embasa em seu núcleo o direito de participação no espaço público, o direito de buscar a materialização dos direitos humanos fundamentais, isto é, concerne basicamente no “direito de conquistar (e gerir) direitos” (2002, p. 63), e a conquista destes direitos ocorre a partir do instante em que a pessoa é reconhecida como sujeito de direitos. Assim:

A cidadania, livre de seu significado ideológico, seria, assim, além do vínculo jurídico, a luta subjacente à positivação dos direitos, nascida na crença na liberdade individual de todos os indivíduos. Ou seja, a cidadania implicaria não só a organização política, mas a própria busca de direitos na luta pela emancipação dos indivíduos, o que a diferencia do discurso dos direitos humanos, os quais, embora formais, são resultados de lutas históricas.

Do exposto verifica-se que o termo cidadania emprega o acesso à participação no espaço público. Por sua vez, o conceito de dignidade da pessoa humana aborda uma qualidade intrínseca e indissociável da pessoa humana, na qual, conforme Kant (apud SARLET, 2015, p. 40):

[...] no reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa esta acima de todo o preço, e portanto, não permite equivalente, então tem ela dignidade... Nunca ela poderia ser posta em cálculo ou confronto com qualquer coisa que tivesse um preço, sem de qualquer modo ferir sua santidade.

Verifica-se, então, que o Estado Democrático de Direito se fundamenta na valorização do ser humano, garantindo ao mesmo, mais que o direito à subsistência, mas a garantia de uma vida digna, com qualidade e eficiência. O último fundamento da república citado neste estudo refere-se ao direito ao trabalho, através do qual o homem desenvolve suas potencialidades, enquanto recebe e propaga solidariedade.
Além de que, o trabalho dignifica a pessoa humana, dando-lhe condições de desenvolver-se com igualdade ao seu semelhante, através de seu condicionamento físico e intelectual, em razão disto, “o trabalho deve ser um meio de realização da pessoa humana e nunca deveria ser utilizado como instrumento de exploração e de agressão a seres humanos social e economicamente mais frágeis”, como leciona Dallari (2004, p. 58).
Como seres igualmente considerados, todos os trabalhadores merecem respeito, pois todos contribuem conforme sua capacidade para proporcionar o atendimento das necessidades de seus semelhantes, visando a melhoria da qualidade de vida, em consonância com o princípio da dignidade humana, o trabalho deve ser concedido e desempenhado de forma digna, de maneira que atenda a todos os princípios protetores do ser humano.
Afinal é objetivo da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária como descreve o art. 3° da CF, promovendo o bem de todos sem qualquer forma de discriminação, relacionando-se tanto em terras nacionais, quanto internacionais com base no respeito pelos direitos humanos (art. 4°), pretendente a cooperação entre os povos, com vistas a promover o progresso da humanidade.
Seu rol de direitos e garantias fundamentais é o mais extenso entre as cartas constitucionais existentes, o mesmo abre suas expressões garantindo a igualdade entre as pessoas, bem como afiança a inviolabilidade “do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (art. 5°), consonante com as declarações dos direitos humanos transcritas anteriormente, a Constituição brasileira expressa em si todos os direitos e deveres lá existentes, porém, separou os direitos sociais em capítulo próprio (Capítulo II), onde faz referência aos direitos “a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados” (art. 6°).
A Constituição nacional abraçou em seu núcleo 250 artigos e foi considerada como uma constituição cidadã em função da grande participação social em sua formação, sendo que “foram apresentadas 122 emendas populares, que reuniram um total de 12.265.584 assinaturas computadas oficialmente, em um universo de 69.166.810 eleitores cadastrados”, segundo dados de 1986 conforme expõe Pedra (2005, p. 53/54).
Diante desta expressão popular em sua concepção, é compreensível a existência de tantas garantias em seu âmago, porém, o imperativo popular clama por sua efetivação no solo pátrio.

3.      CONFIGURAÇÃO DO DELITO DE LESÃO CORPORAL
Neste delito o bem jurídico tutelado compreende a integridade corporal e a saúde da pessoa humana, ou seja, a incolumidade do indivíduo, ademais, a proteção abrange mais que a integridade anatômica, mas a fisiológica e a psicológica também. Tipificado através do art. 129 do Código Penal este dispositivo visa proteger a pessoa em seu caráter individual, tutelando o interesse particular frente ao Estado.
Conforme Bitencourt (2012, p. 849) o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois o tipo penal não requer qualidade particular para a execução do delito, visto tratar-se de crime comum, assim como, o sujeito passivo, também, pode ser qualquer ser humano vivo, exceto no que se reporta as figuras qualificadas (§1°, IV, 2° V), nas quais somente encaixam-se as mulheres grávidas. Caso o sujeito passivo seja menor de 14 anos ou maior de 60 anos, incidira um aumento na pena. Contudo o ato de lesionar um cadáver enquadrar-se-ia somente no art. 211 do CP.
A conduta típica delitiva compreende a ofensa a integridade física ou psicológica de outrem. A ofensa corporal compreende “a alteração, anatômica ou funcional, interna ou externa, do corpo humano, como por exemplo, equimoses, luxações, mutilações, fraturas etc.”, conforme definição de Bitencourt (2012, p. 850).
Enquanto a perturbação do ânimo ou a produção de aflição embasa “a alteração de funções fisiológicas do organismo ou perturbação psíquica”. No entanto, “a simples perturbação de ânimo ou aflição não é suficiente para caracterizar o crime de lesão corporal por ofensa a saúde. Mas configurará o crime qualquer alteração ao normal funcionamento do psiquismo, mesmo que seja de duração passageira”.
A lesão corporal altera a normalidade do funcionamento do corpo da pessoa. Conforme Capez (2012, p. 437), a saúde fisiológica do indivíduo refere-se “ao equilíbrio funcional do organismo, cuja lesão normalmente não produz alteração anatômica, ou seja, dano, apenas perturbação de sua normalidade funcional que produz ofensa à saúde, por exemplo, ingerir substância que altere o funcionamento normal do organismo”.
Já a saúde mental refere-se à perturbação psicológica sofrida pela pessoa, por exemplo, choque nervoso em razão de um susto, insanidade mental, estado de inconsciência. Cabe ressalvar o fato de que a dor não é integrante do conceito de lesão corporal, pois sua análise é de caráter subjetivo.
O Estado colocou este crime no rol definido como “crimes contra a pessoa” em razão da importância que o ser humano possui diante do ente estatal, afinal, a razão de existir de uma Nação compreende o ser humano, visto que o direito nasce do mesmo e vive para abrigá-lo, é tanto o apresso do Estado para com o ser humano que o mesmo delegou o Ministério Público como titular exclusivo da ação penal em apreço. Todavia, nos casos de lesão corporal leve ou culposa a vítima torna-se titular da ação, ficando a seu critério o processamento do autor dos fatos ou não, com fulcro na Lei n° 9.099/95.
Leciona Capez (2012, p. 446) que o verbo nuclear compreende ofender, que se refere às investidas contra a integridade corporal ou a saúde física ou psíquica de alguém.
Este crime é de ação livre, por isto, pode ser cometido por diversas formas, como por exemplo, meios físicos, como agente químico corrosivo, faca e etc., ou morais, como no caso de lesionar o sistema nervoso através de sustos; pode-se cometer o crime através de ações, como, por exemplo, através do desferimento de pauladas na vítima e ainda por meio de omissão, como no caso de uma enfermeira que deixa de alimentar o paciente causando nele disfunções orgânicas. É verificável que a violência física é dispensável para a execução deste tipo delitivo.
Por tratar-se de um crime de dano a configuração se efetiva no exato instante em que se tornar efetiva a ofensa à “integridade corporal ou a saúde física ou mental da vítima. Estamos diante de um crime instantâneo, de modo que pouco importa para a sua consumação o tempo de duração da lesão”, este aspecto importa apenas no que tange a incidência das qualificadoras, como no caso de a lesão resultar incapacidade para os afazeres habituais por mais de 30 dias (§1°, I do art. 129 do CP), não necessita de finalidade lucrativa, pois caso contrário, não se enquadrariam neste artigo as crianças, os idosos e os enfermos, a incapacidade pode referir-se tanto ao aspecto físico quanto psíquico.
Por ser crime material, o resultado deverá ser demonstrado através de laudo de exame de corpo de delito. Salienta-se que o §1° descreve as lesões corporais de natureza grave.
Este tipo penal exige o animus nocendi[3], ou seja, o dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de ofender a integridade física ou a saúde de outrem. Além da qualificadora referente à incapacidade para o exercício das atividades habituais, existe a decorrente do perigo de vida (§1°, II) a qual se configura através da expectativa concreta e efetiva do resultado letal em razão da lesão provocada ou do processo patológico por ela desenvolvido, é imperativo que a vida do sujeito encontre-se efetivamente em perigo, o qual deve ser demonstrado por laudo de perito por meio de exame de corpo de delito.
A terceira agravante refere-se ao resultado de debilidade permanente de membro, sentido ou função (§1°. III), a qual se refere a enfraquecimento, diminuição da capacidade funcional, que não precisa ser ad eternum[4], basta que seja duradoura ou permanente. A agravante ocorre mesmo que a debilidade seja suscetível de correção através de intervenção cirúrgica ou tratamentos, ou que seja apta a disfarces, como no caso de próteses.
Existe também a possibilidade de aceleração do parto (§1°, IV), a qual se configura no instante em que ocorra a aceleração do parto em razão da lesão sofrida, momento em que a gravidez se antecipa, isto é, o feto é expulso do ventre materno. É imperativo que o feto nasça com vida, caso contrario configurará lesão corporal gravíssima.
O dolo do sujeito ativo é de acelerar a gravidez, por isto, o sujeito necessita ter conhecimento do estado de gravidez, de outra forma responderá por lesão corporal leve. Ao cominar pena mais grave para os resultados estudados, o legislador considerou as consequências como mais danosas, demonstráveis através de sua irreparabilidade ou maior durabilidade.
Adiante, existe a agravante para lesão corporal gravíssima as quais enquadram as decorrentes de atividades que resultem em (§2°, I) incapacidade permanente para o trabalho, emprega-se aqui a palavra trabalho e não atividades habituais como anteriormente e da mesma forma, basta para a configuração delitiva que a incapacidade seja duradoura, neste caso, também se enquadram as lesões psíquicas.
O inc II, do §2° traz a enfermidade incurável, compreendida em uma doença do corpo ou psicológica que a medicina ainda não contenha a cura, não exige juízo absoluto da ausência de cura, basta o juízo de probabilidade deste fato como ensina Capez (2012, p. 473), a demonstração da enfermidade deve ser demonstrada através de perícia médica.
No inc III, do § 2° vigora a perda ou inutilização de membro, sentido ou função, trata-se de resultado maior que a debilidade tratada anteriormente no §1°, visto cuidar de situação mais grave (perda ou inutilização). E no inciso IV (§2°) existe a deformidade permanente, a qual se configura através de um dano estético de certa monta.
Permanente, para Capez (2012 p. 476) embasa uma deformidade indelével e irreparável, isto é, que não se corrige com o transcurso temporal. Exige que seja visível e tenha capacidade de causar humilhação e desconforto aos olhos dos demais, a mesma é comprovada através de laudo pericial. Por fim, há o aborto (V, §2°), se consuma quando a criança nasce morta.

4.      DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA PARA A CONFIGURAÇÃO DO DELITO DE LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE OU GRAVÍSSIMA
Assevera Freitas (2002, p. 50) no que concerne ao direito que “há uma grande dicotomia entre sua positivação e sua efetividade: embora sejam assegurados como direitos e garantias fundamentais, os direitos humanos não são respeitados na sociedade, temos presentes imensas desigualdades sociais”, tanto que “a democracia brasileira pode ser considerada como uma democracia sem cidadania”.
Ademais, conforme estudado o arcabouço jurídico brasileiro é vasto, no entanto, não se deve confundir o direito com a totalidade de leis existentes, como salienta Alexy (2009, p. 11), visto que o direito tem recusado o positivismo legal estrito, pois no uso de suas atribuições os juízes tem se utilizado de decisões jurisprudenciais, da analogia, dos costumes e dos princípios gerais do direito (art. 4° da LINDB) como meio de solucionar as casuísticas apresentadas. Além de que, para Alexy (2009, p. 10):

[...] embora, em geral, lei e direito coincidam facticamente, isto não acontece de maneira constante nem necessária. O direito não é idêntico a totalidade de leis escritas. Quanto as disposições positivas do poder estatal, pode existir, sobre certas circunstâncias, uma excedência de direito, que tem sua fonte no ordenamento jurídico constitucional como um conjunto de sentido e é capaz de operar como corretivo em relação à lei escrita; encontrar essa excedência de direito e concretizá-la em decisões é a tarefa da jurisprudência.

O direito compreende o elemento que detém em si três elementos, legalidade conforme o ordenamento, eficácia social e correção material. Na sua parte externa uma norma apresenta uma sanção como meio de coagir o indivíduo a respeitá-la, ou seja, para Max Weber (apud ALEXY, 2009, p. 18):

Um ordenamento se chamará:... direito, quando for garantido externamente pela possibilidade de coação (física ou psíquica) por meio de uma ação, dirigida a obtenção forçada da observância ou para a punição da violação, de um grupo de pessoas especialmente preparado para tanto. (Grifos do original).

No aspecto interno a norma necessita de motivação de observância e aplicação, indiferente de seu aspecto formal, “o que importa são as disposições psíquicas”, isto é, o respeito do indivíduo pelo que a mesma define indiferente de compreender uma lei ordinária, lei complementar ou afim, o que interessa é o que ela impõe ao cidadão, ou seja, é o que a sociedade reconhece como norma e regra.
A norma compreende uma expectativa de comportamento, no exemplo da lesão corporal encontra-se a seguinte expressão do art. 129 (do CP) “ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”, diante disto é esperado da comunidade em que esta lei impere que a conduta delitiva prevista no tipo penal não seja efetuada no plano prático, sob pena de incorrer na sanção nela cominada.
Neste enfoque, como meio de robustar o entendimento sobre a incidência de lesão corporal grave ou gravíssima no que tange a saúde psicológica do indivíduo, foi efetuado pesquisas bibliográficas em diversas obras, e inclusive na esfera jurisprudencial, instante em que se constatou a presença de poucas decisões relacionadas à matéria, o que demonstra a inaplicabilidade na prática das leis expressas no ordenamento jurídico pátrio. Porém, na esfera cível foi possível encontrar algum respaldo referente à temática.
O primeiro caso refere-se a uma professora de escola pública que apelidou uma aluna em virtude de um problema congênito que a mesma possuía (inclinação lateral irreversível no pescoço)[5]. Fato este que embasado no art. 37, §6° da Carta de Outubro ocasionou a responsabilidade objetiva da administração pública, devido ao dever que o Estado possui de resguardar o respeito pelos direitos das pessoas. O respaldo jurídico baseou-se no princípio da dignidade da pessoa humana, o qual garante à todo os sujeitos o direito da inviolabilidade física, psíquica e moral da pessoa humana. Este fato é comumente definido bullying[6], o qual compreende um ilícito que atua diretamente sobre a integridade psíquica e moral, gerando lesão corporal à saúde da vítima e é praticado de maneira rotineira nos corredores escolares, tanto que ganhou nomeação.
Depois de ser apelidada de tortinha pela professora todos os demais alunos passaram a referir-se a ela através daquele apelido vexatório, fato este que lhe abalou psicologicamente causando a sua desistência escolar, este dano refere-se à prática in re ipsa, a qual dispensa prova referente a sua ocorrência. No caso em apreço o Município de São Leopoldo, do estado do Rio Grande do Sul foi condenado ao pagamento de R$ 5.450,00 (cinco mil quatrocentos e cinquenta reais).
Nada obstante, este delito, também pode configurar injúria qualificada pela utilização de deficiência (art. 140, §2°), no entanto, no delito de injuriar o tipo se configura com o simples fato de ofender a honra ou o decoro da vítima, não é preciso que a vítima se sinta denegrida, já no caso da lesão à saúde psíquica grave em epígrafe (art. 129, 1°) o tipo delitivo se configura com a ofensa a saúde, ou seja, mais que injuriar, a professora e os demais alunos, ofenderam a integridade psicológica da aluna, fazendo com que a mesma desistisse de freqüentar a escola. Trata-se da caracterização de dois tipos penais delitivos, porém, para configurar o segundo delito é necessário laudo pericial.
Outro caso refere-se ao estado de Santa Catarina, Município de Jaraguá do Sul[7], hipótese em que o aluno sofreu falsa acusação de crime de furto, o que caracterizou bullying em vista da vergonha e da humilhação que o aluno sofreu frente aos colegas de classe, em virtude de um suposto sumiço de uma nota no valor de R$ 10,00 (dez reais), sendo que no boletim de ocorrência o autor dos fatos registrou como sendo de R$ 50,00 (cinquenta reais), disparidade de valores, a qual, não foi esclarecida pelo denunciante.
Devido ao tratamento discriminatório a que foi submetido a vítima, o juiz constatou a configuração do abalo anímico, condenando o réu ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a título de valor indenizatório.
Em uma observação mais atenta verifica-se a hipótese de crime de calúnia (art. 138 do CP, pena de 6 meses a 2 anos e multa), o qual se refere à imputação falsa de crime, porém, em consideração à vergonha e humilhação à que foi exposto o sujeito passivo, seria possível o enquadramento do sujeito ativo, também, no delito de lesão corporal à saúde (art. 129 do CP, pena de 3 meses a 1 ano), configurando um concurso de crimes, conforme o entender de Greco (2012, p. 56).
Fato este que, caso ocasionasse a desistência do aluno do âmbito escolar em virtude de depressão, ou outra doença psicológica, devido a vergonha pelo fato imputado e pelas atitudes dos colegas, ocasionaria a possibilidade de lesão corporal grave, hipótese do §1° do art. 129 que se refere à incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias, neste caminho, caso este abalo psíquico resultasse em incapacidade permanente para o trabalho, seria possível enquadrar na hipótese de lesão corporal à saúde gravíssima, tamanho são as conseqüências provenientes deste ato ilícito. Ademais:

A vida, por larga que seja, tem os dias contados; a fama, por mais que conte anos e séculos, nunca lhe há de achar conto, nem fim, porque são eternos: a vida conserva-se em um só corpo, que é o próprio, o qual, por mais forte e robusto que seja, por fim se há de resolver em poucas cinzas: a fama vive nas almas, nos olhos e na boca de todos, lembrada nas memórias, falada nas línguas, escrita nos anais, esculpida nos mármores e repetida sonoramente sempre nos ecos e trombetas da mesma fama. Em suma, a morte mata, ou apressa o fim do que necessariamente há de morrer; a infâmia afronta, afeia, escurece e faz abominável a um ser imortal, menos cruel e piedosa se o puder matar. (CHAVES, prefácio da obra, 2001).

Outra decisão refere-se ao estado do Rio de Janeiro, relacionada a uma criança matriculada na 3ª série primária de um colégio local, cuja mesma desistiu de freqüentar o ambiente escolar, e em decorrência a mãe entrou em contato com a orientadora educacional e com o diretor da escola e não obteve justificativa, instante em que insistiu com a vítima e descobriu que seu filho havia abdicado de comparecer as aulas em decorrência das discriminações a que estava sendo submetido pelos seus colegas, os quais os xingavam e agrediam fisicamente, além de obrigá-lo a participar de brincadeiras constrangedoras, como por exemplo baixar as calças no intervalo de aula.
Ao informar os fatos aos responsáveis pela escola, a mãe obteve como resposta que os fatos tratavam-se de brincadeira entre alunos e não houve a tomada de medidas limitadoras de tal situação e, por fim, o réu negou a renovação da matrícula do sujeito passivo, alegando a falta de vagas.
O autor recebeu a titulo indenizatório o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), mais as custas processuais e de honorários advocatícios no valor de 10% e ainda tratamento psicológico pelo tempo que for necessário. O desembargador relator Fernando Fernardy Fernandes da 13 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do estado de Rio de Janeiro definiu bullying em sua decisão como sendo:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. VIOLENCIA ESCOLAR. "BULLYNG". ESTABELECIMENTO DE ENSINO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS. I- Palavra inglesa que significa usar o poder ou força para intimidar, excluir, implicar, humilhar, "Bullying" é um termo utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos; II - Os fatos relatados e provados fogem da normalidade e não podem ser tratados como simples desentendimentos entre alunos. III - Trata-se de relação de consumo e a responsabilidade da ré, como prestadora de serviços educacionais é objetiva, bastando a simples comprovação do nexo causal e do dano; IV - Recursos - agravo retido e apelação aos quais se nega provimento. 003372-37.2005.8.19.0208 - APELACAO - DES. ADEMIR PIMENTEL - Julgamento: 02/02/2011 - DECIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL. (Grifos da autora).

Em atenção a esta decisão verifica-se que o aluno deixou de comparecer as aulas em função da violência psicológica sofrida, fato este comprovado através de laudo pericial, como ficou demonstrado, e não devido às lesões físicas sofridas, fato este que se enquadra perfeitamente na descrição do delito de lesão à saúde gravíssima (art. 129, §2° do Código Penal), devido à renúncia de frequentar as aulas do aluno.
Cabe destaque para o fato de que as decisões analisadas são recentes, visto referirem-se ao ano de 2012, o que evidencia que a procura pelo respaldo jurisdicional é hodierna, em razão da morosidade do judiciário e dos altos custos dos honorários advocatícios, ensejo da desistência do sujeito passivo antes mesmo da entrada em vias judiciárias.
Ademais, o conhecimento jurídico é algo restrito, visto que, ao considerar-se a prática cotidiana, verificar-se-á que a ocorrência delitiva destes tipos criminais é comum no âmbito escolar (afinal, quem é que não possui aquele amigo CDF[8]? Que normalmente usa óculos e é conhecido como 4 olhos. Ou aquele que esta sempre pronto para as festas da escola? Ou ainda aquele palhaço que faz toda sala rir), enfim, ao lado da restrição do conhecimento legal paira o alto custo processual, ocasionando a omissão e a continuidade desta prática delitiva.
Um exemplo desta prática criminal é o caso dos trotes estudantis[9] os quais possuem a anuência inclusive da faculdade, sendo praticados por coordenadores de curso (até mesmo de graduação de Direito), professores e demais alunos, pretendentes a fazerem um conjunto de atividades com alunos que estão adentrando no âmbito das universidades, cujos quais, possuem o teor de humilhar com fins de promover o riso dos demais, e muitas vezes encerram com brigas e constrangimentos.
Outra decisão encontrada refere-se ao delito de estupro, instante em que a Relatora Ellen Gracie, proferiu frente ao Supremo Tribunal Federal, no habeas corpus n° 81360, com base na definição de lesão corporal efetuada por Nelson Hungria de que a lesão corporal abrange mais que conseqüências de ordem anatômica, mas também embasa “ofensas à normalidade funcional do organismo do corpo humano, seja do ponto de vista anatômico, seja do ponto de vista fisiológico ou psíquico[10]”, destacando que, em seu entendimento, todo o delito de estupro resulta em lesões corporais à saúde de natureza grave, conforme se extrai de sua definição do tipo delitivo:

Estupro: crime que, por suas caractéristicas de aberração e de desrespeito à dignidade humana, causa tamanha repulsa que as próprias vítimas, em regra, preferem ocultá-lo, bem como que a sociedade, em geral, prefere relegar a uma semiconsciência sua ocorrência, os níveis desta ocorrência e o significado e repercussões que assume para as vítimas. Estatísticas de incidência que, somadas às consequências biológicas, psicológicas e sociais que acarreta, fazem desse crime um complexo problema de saúde pública. Circunstâncias que levam à conclusão de que não existe estupro do qual não resulte lesão de natureza grave. (Grifos da autora).

Cabe atentar-se ao fato de que a prática de lesão à saúde consiste em uma ação de cunho grave em função de que suas sequelas são externas, o que dificulta o seu diagnóstico e tratamento, além de que esta conduta é incabível dentro das normas estabelecidas em um Estado Democrático de Direito, conforme visto no primeiro item deste manuscrito, cujo qual se alicerça na inclusão social, e em elementos como da dignidade da pessoa humana e do convívio fraterno.
Por corolário, transcorreram-se séculos pela busca da formalização de leis protetivas aos cidadãos, na conformidade em que elas se encontram atualmente, resta então buscar por sua efetividade e aplicação no solo pátrio.

5.      DENIFIÇÕES CONCLUSIVAS
Este manuscrito retratou desde a base principiológica, que dá existência ao Estado Democrático de Direito, até a tipificação delitiva penal do crime de lesão corporal à saúde, analisando, inclusive, com alicerce em decisões magistrais.
A apreciação principiológica pretendeu descortinar a sociedade quanto à emersão de valores sociais e individuais que surgiu no solo nacional, enraizando-se no ordenamento jurídico brasileiro de forma a tornar-se parte deste país, pretendendo abrigar as pessoas nele existente.
E findou com a análise tipificada no Código Penal como lesão corporal à saúde (art. 129), de forma a evidenciar que, o arcabouço jurídico nacional é rico em proteções jurídicas, no entanto, carece de materialidade, pois, muitas vezes, o estudioso buscador da aplicabilidade da lei, o advogado, não tem dado atenção ao núcleo delitivo configurado, confundindo crimes e afastando algumas formas delitivas de efetividade.
É o caso do crime de lesão corporal à saúde, comumente praticado, que, no entanto, não possui busca jurisdicional por seu sancionamento, ocasionando uma omissão no que tange ao trabalho do advogado e do promotor de justiça, visto que este tipo penal em sua forma grave e gravíssima possui natureza criminógena pública.
Consciente sobre a necessidade da aplicabilidade da lei é que este artigo foi escrito, pretendendo desmistificar os aplicadores da lei e abrir portas para a busca pela aplicação e punição desta forma delitiva.

REFERÊNCIAS
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______. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Processo No: 0002215-71.2012.8.19.0050/RJ. Des. Fernando Fernardy Fernandes. Julgado em 06.02.2014. Disponível em http://www4.tjrj.jus.br/ejud/consultaprocesso.aspx?N=201300186722&CNJ=0002215-71.2012.8.19.0050. Acesso em 08 de fevereiro de 2016.

_____. Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina. TJ-SC - AC: 20080456490 SC 2008.045649-0 (Acórdão), Relator: Luiz Fernando Boller, Data de Julgamento: 29/08/2012,  Quarta Câmara de Direito Civil Julgado. Acesso em 08 de fevereiro de 2016.

_____. Poder Judiciário do Estado de Rio Grande do Sul. (TJ-RS - AC: 70049350127 RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Data de Julgamento: 29/08/2012,  Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/09/2012). Acesso em 08 de fevereiro de 2016.

_____. Supremo Tribunal Federal. STF - HC: 81360 RJ, Relator: ELLEN GRACIE, Data de Julgamento: 19/12/2001, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 19-12-2002. Acesso em 09 de fevereiro de 2016.

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[1] Advogada; Graduada em Direito; Autora do Blog Direito em Estudo; Autora do livro A promoção dos Direitos Humanos Fundamentais através da Polícia Militar; Articulista assídua em diversas revistas jurídicas; Pesquisadora na área de Direito Militar, Segurança Pública e Ambiental.
[2] ADI 2.076/AC. Relator Min. Carlos Veloso. 15/08/2002.
[3] Intenção de prejudicar.
[4] Até o infinito.
[5] (TJ-RS - AC: 70049350127 RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Data de Julgamento: 29/08/2012,  Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/09/2012).
[6] Definição do Wikipédia: Bullying: é um anglicismo utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo ou grupo de indivíduos, causando dor e angústia e sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder. bullying é um problema mundial, sendo que a agressão física ou moral repetitiva deixa sequelas psicológicas na pessoa atingida.
[7] TJ-SC - AC: 20080456490 SC 2008.045649-0 (Acórdão), Relator: Luiz Fernando Boller, Data de Julgamento: 29/08/2012,  Quarta Câmara de Direito Civil Julgado.
[8]Significa “cabeça de ferro” ou “crânio de ferro” porque a pessoa estuda tanto que se presume que, se tivesse um crânio normal como os demais, esta cabeça não resistiria e poderia estourar.

[9]O trote estudantil (ou simplesmente trote) consiste num conjunto de atividades para marcar o ingresso de estudantes no ensino superior e, em algumas exceções, no Ensino Médio, geralmente no caso dos aprovados num processo seletivo, que podem ser leves ou graves.

[10]STF - HC: 81360 RJ, Relator: ELLEN GRACIE, Data de Julgamento: 19/12/2001,  Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 19-12-2002.